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Processo n.º 92/08
2ª Secção
Relator: Conselheiro Joaquim de Sousa Ribeiro
Acordam, em conferência, na 2ª secção do Tribunal Constitucional
I - Relatório
1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos
do Supremo Tribunal de Justiça, em que é recorrente A., Lda. e recorrido Banco
B., o relator proferiu decisão sumária de não conhecimento do objecto do recurso
com fundamento no seguinte:
«[…]2. Com relevância para a presente decisão, emergem dos autos as seguintes
ocorrências processuais:
− …– Banco B., SA, intentou contra A., Lda., acção declarativa de condenação, na
qual pede que se declare a resolução do contrato de locação financeira celebrado
entre A. e R., referente ao tractor industrial identificado nos autos, o
cancelamento do registo respectivo e a condenação da R. a restituir à A. o bem
locado.
− Por sentença da 2ª Secção da 13ª Vara Cível de Lisboa (a fls. 235 e ss.) a
acção foi julgada procedente.
− A R. apelou desta decisão para o Tribunal da Relação de Lisboa.
− Por despacho de fls. 333, este Tribunal notificou a R., nos termos do artigo
690.º, n.º 4, do CPC, para apresentar, no prazo de 10 dias, de forma sintética,
as conclusões do seu recurso.
− Por despacho de fls. 337 do Relator no Tribunal da Relação de Lisboa foi
decidido não conhecer do recurso, com fundamento no facto de a recorrente não
ter respondido ao convite que lhe foi dirigido.
− Notificada deste despacho, a recorrente veio apresentar os requerimentos de
fls. 341, 343 e 351, através dos quais, nomeadamente, veio juntar novas
conclusões de recurso sintetizadas e reclamar para a conferência do referido
despacho de fls. 337.
− Por acórdão de fls. 361 e ss., o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu não
conhecer do recurso, indeferindo a reclamação, com fundamento, designadamente,
no facto de a R. não ter respondido ao convite que lhe foi dirigido no prazo
concedido para o efeito.
− Deste acórdão, a recorrente interpôs recurso de agravo para o Supremo Tribunal
de Justiça.
− Por acórdão de 18.12.2007, ora recorrido, o Supremo Tribunal de Justiça negou
provimento ao recurso.
3. É manifesto que não se mostram preenchidos os pressupostos necessários ao
conhecimento do objecto do recurso, pelo que se justifica a prolação de decisão
sumária ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC.
No recurso interposto ao abrigo da alínea f) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC o
Tribunal só pode apreciar questões de ilegalidade, com os fundamentos referidos
nas alíneas c), d) e e) do mesmo preceito legal. Ora a recorrente não pretende
ver apreciada qualquer questão de ilegalidade, mas antes duas questões que
identifica como sendo de inconstitucionalidade.
Constitui jurisprudência reiterada e uniforme do Tribunal Constitucional que é
ao recorrente que compete indicar o tipo de recurso que pretende interpor, não
conferindo a lei ao Tribunal qualquer poder oficioso de convolar para um outro
recurso (baseado em uma alínea diferente) aquele que o recorrente indicou no
requerimento (v. entre outros, os Acórdãos n.ºs 77/00, 46/04 e 316/04,
disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt).
Não pode, assim, conhecer-se do recurso interposto ao abrigo da alínea f) do n.º
1 do artigo 70.º da LTC.
Não obstante, sempre se dirá que, ainda que o recurso tivesse sido interposto ao
abrigo da alínea b) do mesmo preceito legal, ainda assim não estariam
verificados os respectivos pressupostos.
As normas do artigo 16.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 149/95, de 24 de Junho,
cuja inconstitucionalidade a recorrente pretende ver apreciada (ponto 1.1. do
requerimento de interposição do recurso) não foram aplicadas pelo acórdão
recorrido (nem poderiam ter sido, atento o seu objecto). Além disso, a
recorrente não suscitou a inconstitucionalidade destas normas no decurso do
processo, nomeadamente, perante o tribunal recorrido.
Quanto ao ponto 1.2. do requerimento de interposição do recurso, nele não vem
invocada qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, uma vez que a
recorrente imputa a violação do artigo 20.º, n.º 1, da Constituição, à própria
decisão recorrida. Ora, o controlo exercido pelo Tribunal Constitucional tem
natureza estritamente normativa, apenas podendo incidir sobre o resultado
interpretativo de determinada norma e não sobre o juízo subsuntivo de aplicação
da norma ao caso concreto.
Por todas as razões invocadas não pode o presente recurso ser admitido. […]»
2. Notificada da decisão, a recorrente veio reclamar para a conferência, ao
abrigo do artigo 78.º-A, n.º 3, da LTC, nos seguintes termos:
« 1 - DENEGAÇÃO DE JUSTIÇA
Tal decorre da ilegalidade do despacho do Senhor Desembargador Relator ao
decidir não conhecer do recurso por o apelante não ter correspondido ao convite
formulado para resumir as alegações.
O despacho convite é formulado nos termos seguintes:
“Nos termos do art.° 690.º n° 4 do Cod. Proc. Civil, convido, antes de mais, a
R. apelante a apresentar, no prazo de dez dias, de forma sintética, as
conclusões de recurso, as quais — a fls. 314 a 323 — se mostram, pelo menos, tão
extensas e desenvolvidas quanto as próprias alegações de fls. 305 a 313”
Muito embora fora de prazo, por justo impedimento, as conclusões de recurso
resumidas ou sintéticas apresentadas representam 7 folhas, quando inicialmente
foram 9 folhas.
Portanto, as alegações iniciais já eram sintéticas.
Acontece, porém, que o despacho não se enquadra no disposto no n°4 do art° 690
do C.P. Civil que diz:
“Quando as conclusões faltem, sejam deficientes, obscuras ou complexas”
Na verdade, as alegações apresentadas não são deficientes, pois apenas concluem
como já se referira nas “alegações de direito” não são obscuras nem complexas,
pois são claras, embora longas, mas são simples, como é timbre do advogado
signatário.
Desta sorte, o despacho ao determinar que se sintetize o que já é sintético,
claro e não deficiente, é exigir o que não é admissível.
ASSIM,
Ao decidir não tomar conhecimento do recurso com tal fundamento,
É DENEGAR JUSTIÇA
2 - INCONSTITUCIONALIDADE DOS n°s.1 e 2 do art° 16 do D.L. n° 149/95, de 24 de
Junho.
Diz o despacho desse Tribunal Constitucional que tal matéria não fora suscitada
e, por isso, a inconstitucionalidade destas normas, o que não corresponde ao que
se verifica nos autos.
Na verdade, tal inconstitucionalidade é suscitada nas alegações de direito a
fls. 230 e seguintes dos autos.
A fundamentação é aí expendida, até por a Autora não poder considerar resolvido
o contrato de leasing com o fundamento de não terem sido cumpridas, em devido
tempo, as prestações em atraso.
Tal só ocorre por o contrato configurar práticas negociais abusivas, como vem
referido de fls. 230 a 234 dos autos.
Nestes termos, apresentado à conferência,
COLENDOS CONSELHEIROS,
ao admitir o recurso, como se pede,
FARÃO JUSTIÇA»
3. Notificado o recorrido para responder, este nada disse.
Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.
II – Fundamentação
4. A decisão sumária reclamada fundamentou-se no não preenchimento dos
pressupostos para conhecimento do objecto do recurso, interposto ao abrigo da
alínea f) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC e na impossibilidade legal de o
Tribunal convolar oficiosamente o tipo de recurso apresentado pela recorrente.
Mais se acrescentou que, ainda que tivesse sido interposto ao abrigo da alínea
b) daquele preceito legal, sempre se manteria a falta de pressupostos, por a
recorrente não ter suscitado qualquer questão de constitucionalidade perante o
tribunal recorrido e por imputar o vício de inconstitucionalidade à própria
decisão recorrida.
A reclamação apresentada pela recorrente em nada abala estas conclusões.
Em rigor, a reclamante não aduz qualquer argumento que vise contrariar os
fundamentos da decisão reclamada. Na primeira parte da reclamação, limita-se a
discordar de um despacho proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, em
determinado momento do processo, questão que, obviamente, escapa ao objecto da
presente reclamação e à competência do Tribunal Constitucional. E na segunda
parte, alega ter invocado uma inconstitucionalidade perante o tribunal de
primeira instância, o que, para além de manter incólume o primeiro fundamento de
não conhecimento do recurso, acima referido, sempre se mostraria insuficiente
para sustentar o preenchimento do pressuposto exigido no artigo 72.º, n.º 2, da
LTC.
Termos em que, sem necessidade de outros considerandos, se conclui pela
manifesta improcedência da reclamação
III. Decisão
5. Pelo exposto, acordam em indeferir a presente reclamação.
Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de
conta.
Lisboa, 19 de Junho de 2008
Joaquim de Sousa ribeiro
Benjamim Rodrigues
Rui Manuel Moura Ramos
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