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Processo nº 335/08
1ª Secção
Relatora: Conselheira Maria João Antunes
Acordam, em conferência, na 1ª secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Évora, em que é
recorrente A., Lda. e recorrida B., Lda., foi interposto recurso para o Tribunal
Constitucional, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo da Lei da Organização,
Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), do acórdão daquele
Tribunal de 12 de Julho de 2007, rectificado por acórdão de 8 de Novembro de
2007.
2. Em 29 de Maio de 2008, foi proferida decisão sumária com a seguinte
fundamentação:
«Um dos requisitos do recurso previsto na alínea b) do nº 1 do artigo 70º da LTC
é a aplicação, pela decisão recorrida, como ratio decidendi, da norma cuja
apreciação é requerida ao Tribunal Constitucional.
A recorrente requer a apreciação do artigo 749º do Código de Processo Civil –
que, por seu lado, remete para, além de outras, para o artigo 713º que, por seu
turno, remete para o artigo 664 º – na interpretação segundo a qual pode o
Tribunal de recurso apreciar questões não suscitadas nas conclusões apresentadas
pelas partes, mesmo que de conhecimento oficioso, sem previamente dar
oportunidade às partes de sobre elas (questões de conhecimento oficioso não
levantadas nas conclusões de recurso) se pronunciarem.
Analisado o teor da decisão recorrida, em confronto com as conclusões do recurso
de agravo, não se vislumbram as questões apreciadas pelo Tribunal da Relação que
não foram suscitadas nas conclusões do recurso de agravo, o que sugere, desde
logo, que não houve recurso à norma indicada pela recorrente.
Por outro, para além de a decisão recorrida afirmar expressamente que sendo o
objecto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente, fica
o tribunal de recurso impedido de tomar conhecimento de qualquer questão que
nelas se não aflore, ainda que versada no corpo alegatório, é manifesto que a
questão que foi decidida no recurso de agravo – a única que foi decidida – foi a
da tempestividade da contestação. Tal questão foi objecto de decisão no despacho
agravado, foi levada às conclusões do recurso de agravo e foi depois conhecida
no acórdão agora recorrido, onde se lê:
“Apreciando as conclusões do agravo, apenas uma questão se coloca: A contestação
das RR. foi apresentada dentro do prazo legal (?)”
É, pois, manifesto que a decisão recorrida não aplicou, como ratio decidendi, a
norma cuja apreciação foi requerida a este Tribunal Constitucional, o que
justifica a prolação da presente decisão (artigo 78º-A, nº 1, da LTC)».
3. Desta decisão vem agora a recorrente reclamar para a conferência, nos termos
do artigo 78º-A, nº 3, da LTC, com os fundamentos seguintes:
«1.º
Contrariamente ao entendimento versado na douta decisão sumária, a Recorrente
considera que o Tribunal da Relação conheceu de questões não suscitadas nas
conclusões de recurso.
2.°
Se é certo, que a questão em apreciação no Douto Acórdão se prendia com a
tempestividade da apresentação da contestação por parte da Ré, certo é também,
que o Tribunal da Relação concluiu pela tempestividade da mesma por razões
diferentes e com base em normas não suscitadas pela Ré.
3.º
Analisando as conclusões de recurso das agravantes/apelantes, quer no recurso de
agravo, quer no de apelação, verifica-se que as agravantes pugnam pela
tempestividade da contestação apresentada com fundamento em “erro da secretaria
judicial” e consequente nulidades/irregularidades nas citações/notificações.
4.º
Tentando com base na arguição de tais nulidades dos actos de
citação/notificação, determinar prazos diferentes a partir dos quais começou a
correr o prazo para apresentação da contestação, que foi junta aos autos em
06/02/2006.
5.º
O douto acórdão ora recorrido, versando sobre estas matérias, considerou que as
RR (agravantes) se encontravam regularmente citadas em 09-11-2005, terminado o
prazo para contestar (30 dias mais uma dilação de 5 dias) em 14-12-2006.
6.°
Considerou ainda, que as partes requereram a suspensão da instância em
16-12-2005, e que por despacho proferido em 20-12-2005, foi notificado às partes
o respectivo deferimento em 04-01-2006.
7.º
Tendo em conta a conclusão de recurso das recorrentes na sua alínea f) e n) dos
recursos de agravo e apelação respectivamente, constata-se, sem sombra de
dúvida, que as mesmas sempre aceitaram e admitiram que a suspensão da instância
apenas começou a produzir os seu efeitos a partir do momento em que as partes
foram notificadas do despacho do deferimento.
8.°
Dito doutro modo, as agravantes nunca puseram em causa a interpretação e
aplicação dos artigos 276°,279° e 284 n.º lc) do C.P.C, ou seja, nunca colocaram
em questão o momento a partir do qual a suspensão da instância começou a
produzir os seus efeitos (04-011-2006).
9.º
Facto este, reforçado pelas normas jurídicas indicadas como violadas, isto é,
alínea m) e o) das conclusões de ambos os recursos (artigos 198° - A, 161° n.° 6
e 252° n.° 2 e 4 do C.P.C).
10.º
As agravantes nunca indicaram como normas violadas pelo Senhor Juiz a quo os
preceitos dos artigos 276°,279° e 284 n.° lc) do C.P.C, pelo que aceitaram e
concordaram com a aplicação que o mesmo fez de tais normas, uma vez que não
levantaram o problema da suspensão da instância em sede de recurso, sendo por
isso a contestação extemporânea.
11.º
Assim sendo, e não tendo a questão da suspensão da instância sido suscitada em
sede de recurso, massime nas conclusões que delimitam o seu objecto, e não sendo
a mesma de conhecimento oficioso, não podia o Venerando Tribunal da Relação
conhecer de tal assunto.
12.°
Pelo que foi com recurso à aplicação e interpretação das normas cuja apreciação
se pretende que o Tribunal da Relação proferiu o Acórdão ferido de
inconstitucionalidade, concluindo-se em todo resto conforme o requerimento
anteriormente apresentado nos termos do artigo 75°-A n.° 6 da LTC (...)».
4. Notificada, a recorrida respondeu sustentando o indeferimento da reclamação.
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentação
Decidiu-se não tomar conhecimento do objecto do recurso interposto, na medida em
que a decisão recorrida não aplicou, como ratio decidendi, a norma cuja
apreciação foi requerida ao Tribunal Constitucional: a norma do artigo 749º do
Código de Processo Civil – que, por seu lado, remete para, além de outras, para
o artigo 713º que, por seu turno, remete para o artigo 664 º – na interpretação
segundo a qual pode o Tribunal de recurso apreciar questões não suscitadas nas
conclusões apresentadas pelas partes, mesmo que de conhecimento oficioso, sem
previamente dar oportunidade às partes de sobre elas (questões de conhecimento
oficioso não levantadas nas conclusões de recurso) se pronunciarem.
Segundo a reclamante, o Tribunal da Relação conheceu de questões não suscitadas
nas conclusões de recurso. Esclarece, porém, de imediato, que sendo a questão em
apreciação, na verdade, a da tempestividade da contestação, o Tribunal da
Relação concluiu pela tempestividade da mesma por razões diferentes e com base
em normas não suscitadas pela Ré.
Foi isto, precisamente, que levou a decisão reclamada a concluir pela não
verificação do requisito da aplicação pelo tribunal recorrido, como ratio
decidendi, da norma questionada pela recorrente. Norma em cujo enunciado se
integrava a possibilidade de apreciação pelo tribunal de recurso de questões não
suscitadas pelas partes nas conclusões das alegações.
Com efeito, há que distinguir as questões que as partes submetem à apreciação do
tribunal das razões ou argumentos das partes, não havendo equivalência entre
decidir questões não suscitadas pelas partes e decidir por razões diferentes ou
com base em normas não suscitadas pelas partes (cfr. artigos 660º, nº 2, e 664º,
do Código de Processo Civil). Por outro lado, em matéria de direito, tanto na
determinação (indagação), como na interpretação e na aplicação do direito, o
juiz não está sujeito às alegações das partes (Antunes Varela, Manual de
Processo Civil, 2ª edição, Coimbra Editora pp. 677 e 688).
Não tendo a decisão recorrida aplicado a norma cuja apreciação foi requerida ao
Tribunal Constitucional, resta, reiterando a fundamentação constante da decisão
sumária, concluir pelo indeferimento da presente reclamação.
III. Decisão
Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência,
confirmar decisão reclamada.
Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de
conta.
Lisboa, 2 de Julho de 2008
Maria João Antunes
Carlos Pamplona de Oliveira
Gil Galvão
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