Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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I -Não obstante o disposto nos arts. 1031.º, al. b), do CC, e 12.º do RAU, no que respeita ao direito do arrendatário à realização de obras pelo senhorio, é necessário que exista uma certa proporcionalidade entre os valores das obras e das rendas, considerando o cariz sinalagmático do vínculo contratual e o respeito pelo princípio geral de direito do equilíbrio das prestações.
II - Haverá, assim, casos em que o valor ínfimo da renda se apresenta manifestamente insuficiente para que se possa exigir ao senhorio a realização de obras cujo montante ascende a valores elevados.
III - É o que acontece no caso dos autos, onde ficou demonstrado que houve desde sempre uma postura de boa fé do senhorio, quer ao acordar na feitura de obras por parte do inquilino com dedução do respectivo custo nas rendas, quer ao dispor-se a efectuar as obras inicialmente exigidas pela Câmara.
IV - Assim, há efectivamente uma descomunal desproporção entre a renda recebida (2,30 €) e o custo das obras (5.000 €), sendo injusto exigir aos réus tal dispêndio, pois que, sem capacidades de trabalho, vivem, em conjunto com um filho doente e igualmente sem capacidade laboral, exclusivamente das suas pensões de reforma que não atingem os 650 €.
         Revista n.º 2259/08 -1.ª Secção Paulo Sá (Relator) Mário Cruz Garcia Calejo
 
I -O Supremo Tribunal de Justiça só pode conhecer do juízo de prova sobre a matéria de facto formado pela Relação, quando esta deu como provado um facto sem a produção da prova considerada indispensável, por força da lei, para demonstrar a sua existência, ou quando ocor-rer desrespeito das normas reguladoras da força probatória dos meios de prova admitidos no nosso ordenamento jurídico de origem interna ou de origem externa.
II - Por isso excede o âmbito do recurso de revista o erro na apreciação das provas e a consequente fixação dos factos materiais da causa, isto é, a decisão da matéria de facto baseada nos meios de prova produzidos que sejam livremente apreciáveis pelo julgador.
III - Daí que o eventual erro na apreciação das provas e na fixação da matéria de facto pelo tribunal recorrido só poderá ser objecto do recurso de revista quando haja ofensa de uma disposição expressa da lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova (arts. 729.°, n.º 2, e 722.°, n.º 2, do CPC) -violação das regras de direito probatório material.
         Revista n.º 2228/08 -1.ª Secção Paulo Sá (Relator) Mário Cruz Garcia Calejo
 
I -Provado que à data da escritura de justificação notarial em que o réu se apoia para afirmar a aquisição do seu domínio os outorgantes, seus pais, não eram donos do imóvel, pois já antes tinham disposto dele a favor dos pais e sogros dos autores através de compra e venda verbal celebrada há mais de trinta anos; que, primeiramente seus pais e sogros, e depois eles, autores, exerceram sobre o imóvel posse pública, pacífica, titulada, e de boa fé, os autores adquiriram o prédio por usucapião.
II - Fundando-se este direito na usucapião, ele vale por si, produzindo efeitos contra terceiros independentemente do registo e inutilizando as situações registrais existentes.
III - A justificação notarial não é mais do que um expediente técnico simplificado posto pela lei à disposição dos interessados para o efeito de dar real consistência prática ao princípio do trato sucessivo (arts. 34.º e 116.º do CRgP).
IV - Conforme se decidiu no acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 1/2008 deste Supremo Tribunal -acórdão de 04-12-07, publicado no DR I Série, de 31-03-08 -a inscrição do direito de propriedade no registo com base em escritura de justificação não dá origem à presunção do art. 7.º a favor do justificante; e menos ainda poderá basear, acrescentamos nós agora, uma aquisição tabular, que só nos casos excepcionais previstos no art. 291.º do CC, e 5.º, 17.º, n.º 2, e 122.º do CRgP, poderá ter lugar.
         Revista n.º 2327/08 -6.ª Secção Nuno Cameira (Relator) Sousa Leite Salreta Pereira
 
I -Com a Lei n.º 23/96, de 26-07, o legislador pretendeu proteger os pequenos e médios consumidores de energia eléctrica, aos quais corresponde habitualmente o fornecimento em pequena e média tensão.
II - Por isso, no n.º 3 do seu art. 10.º apenas quis excluir da aplicação do curto prazo de 6 meses de prescrição (n.º 1 do artigo) e de caducidade (n.º 2 do mesmo artigo) as situações de fornecimento de energia eléctrica em alta tensão.
III - Tendo havido erro (para menos) da prestadora do serviço -EDP, autora -na contagem do consumo efectuado pela beneficiária do mesmo -ré -, caducou o direito daquela a receber a diferença entre o preço cobrado e o valor que deveria ter sido cobrado, porque à data da propositura da acção já tinham decorrido mais de 6 meses após o pagamento efectuado.
         Revista n.º 2330/08 -1.ª Secção Moreira Camilo (Relator) Urbano Dias Paulo Sá
 
I -Realizada a diligência de inspecção judicial sem que tenha sido lavrado o respectivo auto, tal situação não consubstancia qualquer nulidade da sentença ou do acórdão, mas, quando muito, uma nulidade processual, nulidade essa que há muito está sanada por não arguida tempestivamente (arts. 201.º, 202.º e 205.º do CPC).
II - A prova por inspecção tem essencialmente por fim proporcionar ao julgador a percepção directa dos factos, de modo que, nessa perspectiva, não se vê como poderia ser tida em conta pela Relação, em sede de reapreciação da prova.
III - Não existe qualquer presunção de culpa a onerar os condutores que conduzam com uma TAS superior à legal, em violação da proibição prevista no art. 81.º do CEst.
IV - Por isso, não pode o julgador, perante uma taxa de álcool ilegal, presumir a culpa na produção do acidente ou de qualquer outro evento produtor de danos, pondo a cargo do lesante o ónus de provar que o evento não resultou do seu estado de alcoolemia.
V - No domínio da responsabilidade civil extracontratual a culpa não se presume, incumbindo ao lesado provar a culpa do autor da lesão (arts. 483.º e 487.º, n.º 1, do CC).
VI - O que acaba de dizer-se não exclui o uso das chamadas presunções naturais ou presunções de facto, que o art. 351.º do CC admite expressamente nas mesmas circunstâncias em que é admissível a prova testemunhal, cujo controle, regra geral, escapa ao conhecimento do STJ, que, por isso mesmo, também não as pode utilizar.
VII - Provado que foi a conduta contraordenacional e negligente do condutor do veículo automóvel, ao circular parcialmente pela metade esquerda da via, atento o seu sentido de marcha, a causa adequada e exclusiva do acidente, não podendo imputar-se ao condutor do motociclo qualquer comportamento causal concorrente para a produção do acidente, não é possível equacionar a questão da concorrência entre culpa e risco.
         Revista n.º 2323/08 -1.ª Secção Moreira Alves (Relator) Alves Velho Moreira Camilo
 
I -Provado que, perante as dificuldades para solverem as suas obrigações, os 2.ºs RR., acordaram com os 1.ºs RR. passar os seu património para a titularidade destes para o por a salvo dos credores, e, nessa sequência, de comum acordo, em perfeito conluio, celebraram as escrituras de compra e venda, sem que os 1.ºs RR., que nelas figuram como compradores, tenham pago aos 2.ºs RR. (vendedores) o preço declarado nas escrituras, ou suportado qualquer despesa, nem os 2.ºs RR. recebido dos 1.ºs qualquer valor, mantendo-se os vendedores nos prédios que declararam alienar, tendo isto sido efectuado e planeado com o propósito de enganar e prejudicar os seus credores, é claro que, nem os 1.ºs RR. quiseram comprar os prédios em questão, nem os 2.ºs RR. os quiseram vender, tudo não passando dum artifício acordado entre os outorgantes para criar a aparência dos negócios escriturados com o fim de fazer crer aos credores dos 2.ºs RR. que aqueles prédios deixaram de pertencer-lhes e, portanto, de servir de garantia aos ditos credores, assim os enganando, podia a Relação recorrer a ilações naturais ou de facto relativamente ao requisito da divergência entre a vontade real e a declarada, concluindo pela verificação de todos os requisitos da simulação.
II - Os requisitos da simulação podem provar-se por qualquer meio de prova admissível em direito ou através de presunções naturais.
         Revista n.º 2241/08 -1.ª Secção Moreira Alves (Relator) Alves Velho Moreira Camilo
 
I -A compensação pode ser invocada quer a título de acção, de reconvenção ou de mera excepção, sendo judicialmente exigível a dívida cujo pagamento pode ser exigido em juízo, e não sendo necessária a prévia condenação no pagamento para se poder invocar o crédito nesta sede.
II - Para este efeito, não serão judicialmente exigíveis, por exemplo, as obrigações naturais ou as obrigações sob condição ainda não verificada ou a termo ainda não vencido.
III - Diferente da exigibilidade é não resultar da factualidade alegada qualquer responsabilidade para o A. que possa traduzir-se na obrigação de indemnizar a R., questão de reciprocidade. Não existindo o contra-crédito, evidentemente que não é possível a compensação.
IV - Não resultando da matéria de facto nada de concreto e relevante que permita concluir pelo incumprimento ou cumprimento defeituoso da prestação de transporte por parte do 3.º transportador e, por conseguinte, não sendo idónea para gerar a sua responsabilidade, também não permite imputar à A. a responsabilidade que a lei lhe atribui no art. 15.º do DL n.º 255/99, de 07-07, sendo manifestamente insuficiente para suportar a pretensão compensatória da R..
V - Os honorários pagos a advogados não são, em princípio, indemnizáveis.
         Revista n.º 2001/08 -1.ª Secção Moreira Alves (Relator) Alves Velho Moreira Camilo
 
I -A excepção de prescrição invocada pelo executado marido não aproveita à executada mulher dado tratar-se de um meio pessoal de defesa de que o tribunal não pode conhecer oficiosamente, tendo, portanto, de ser invocado por quem dele se pretende aproveitar -art. 303.º do CC -e porque, tratando-se de dívida solidária, tem aplicação o disposto nos arts. 514.º e 521.º do mesmo diploma.
II - Dado o efeito da prescrição, o que deve ser executado é a meação da executada esposa nos bens comuns e se tal não for suficiente os bens próprios da referida executada. Na verdade, apenas os bens próprios da executada esposa responderão pela dívida de juros, na parte em que essa dívida foi declarada prescrita em relação ao executado marido, visto que a meação da executada esposa nos bens comuns apenas a ele pertence, isto é, trata-se de bens próprios dela.
         Revista n.º 1918/08 -1.ª Secção Moreira Alves (Relator) Alves Velho Moreira Camilo
 
I -A acção de impugnação pauliana que está prevista como uma das garantias gerais das obrigações, nos arts. 610.° e segs. do CC, pode-se definir-se como a faculdade que a lei concede aos credores de atacarem judicialmente certos actos válidos ou mesmo nulos, celebrados pelos devedores em seu prejuízo.
II - Os requisitos legais de que depende a procedência daquele instituto são os seguintes: a) anterioridade do crédito -art. 610.º, al. a) do CC; b) impossibilidade ou agravamento da impossibilidade de satisfação integral do crédito -art. 610.º, al. b); c) má fé por parte do devedor e do terceiro, este apenas para os actos onerosos -art. 612.° do mesmo CC.
III - A má fé dos alienante é patente, pois estando aqueles réus com diversas dívidas e tendo os demais bens onerados de forma acentuada -hipoteca voluntária, arresto e penhora subsequente e, ainda, mais duas penhoras, procederam à venda dos demais bens que tinham desonerados, não tendo provado a existência de outros bens bastantes para a satisfação do crédito da recorrente, não se podendo por em dúvida a consciência dos réus devedores alienantes do prejuízo que essa alienação efectuada à co-ré causa à recorrente.
IV - Já em relação à co-ré -terceira adquirente -a situação é diversa, porquanto os factos provados constituem apenas um princípio de indício da referida má fé que poderia ser completado por outros factos mais concretos e reveladores da consciência do prejuízo em causa, factos estes que a recorrente alegou e uma vez impugnados, foram inseridos na base instrutória, sendo dados por não provados na sua quase totalidade.
V - A Relação não poderia deduzir dos factos efectivamente dados por provados outros que preenchessem a referida má fé, ao abrigo do disposto nos arts. 349.° e 351.° do CC, porque tal pressupõe que a 1.ª instância não tenha apreciado directamente a verificação desses factos e os não tenha julgado não provados, como foi o caso dos autos em que esses factos foram dados por não provados.
VI - Desta forma, a recorrente não satisfez o ónus que o n.º 1 do art. 342.º do CC lhe impõe de provar o referido requisito legal de má fé da ré adquirente, e, por isso, tem a acção de improceder.
         Revista n.º 2410/08 -6.ª Secção João Camilo (Relator) Fonseca Ramos Cardoso de Albuquerque
 
Resultando da matéria de facto provada apenas que na letra exequenda, no local destinado ao algarismo das unidades de milhão, se verifica a sobreposição do algarismo actualmente visível '0', sobre o algarismo inicialmente escrito '5', tendo sido acrescentado ao algarismo '5' no local destinado às dezenas de milhão e tendo a indicação por extenso do respectivo montante sido feita em conformidade, e não tendo a aqui recorrente, como lhe incumbia, provado que tal alteração tivesse sido efectuada depois do seu aceite, nos termos do art. 2.° da LULL, vale a indicação por extenso, sendo a recorrente obrigada nos termos dessa indicação, tal como hoje consta da letra mesmo em algarismos.
         Revista n.º 2084/08 -6.ª Secção João Camilo (Relator) * Fonseca Ramos Cardoso de Albuquerque
 
I -Por reconhecer não possuir garantia real sobre o bem penhorado na reclamação, o ora recorrente, nos termos do art. 869.º, n.º 1, do CPC, requereu que a graduação de créditos, referente ao imóvel em causa, aguardasse a obtenção do título exequível (o direito de retenção que invoca possuir).
II - Porém, dado que o mesmo não tinha qualquer título que permitisse ser inserido na rubrica dos «credores com garantia real» (daí não ter sido citado), o mesmo teria de se considerar como incluído na indicação de «credores desconhecidos». Consequentemente, deveria requerer que a graduação aguardasse a possibilidade de obter, em acção própria, sentença exequível, no prazo de 15 dias (art. 865.º, n.º 2) a contar da citação edital (com éditos de 20 dias).
III - Demonstrando-se que a reclamação só foi efectuado cerca de dois anos depois da citação edital, é evidente que a mesma foi intempestiva.
         Revista n.º 2317/08 -1.ª Secção Garcia Calejo (Relator) Mário Mendes Sebastião Póvoas
 
I -O art. 70.º do CC tutela a personalidade, como direito absoluto, de exclusão, na perspectiva do direito à saúde, à integridade física, ao bem-estar, à liberdade, ao bom-nome, e à honra, que são os aspectos que individualizam o ser humano, moral e fisicamente, e o tornam titular de direitos invioláveis.
II - O art. 484.º do referido diploma legal ao proteger o bom-nome de qualquer pessoa, singular ou colectiva, tutela um dos elementos essenciais da dignidade humana -a honra.
III - A afirmação e difusão de factos que sejam idóneos a prejudicar o bom-nome de qualquer pessoa acarretam responsabilidade civil (extracontratual), gerando obrigação de indemnizar se verificados os requisitos do art. 483.º, n.º 1, do CC.
IV - O art. 484.º do CC prevê caso particular de antijuridicidade que deve ser articulado com aquele princípio geral -contido no art. 483.º -não dispensando a cumulativa verificação dos requisitos da obrigação de indemnizar.
V - Os jornalistas, os media, estão vinculados a deveres éticos, deontológicos, de rigor e objectividade, que se cumprem com a recolha de informação, com base em averiguações credíveis que possam ser confrontadas, para testar a genuinidade das fontes, de modo a que o dever de informar com isenção e objectividade, não seja comprometido por afirmações levianas ou sensacionalistas, fazendo manchetes que têm, quantas vezes, como único fito o incremento das vendas e a avidez da curiosidade pública, sem que a isso corresponda qualquer interesse socialmente relevante.
VI - Se forem violados deveres deontológicos pelos jornalistas, por não actuarem com a diligência exigível com vista à recolha de informações; se negligentemente, as recolheram de fonte inidónea e se essas informações e as fontes não foram testadas de modo a assegurar a sua fidedignidade e objectividade, estamos perante actuação culposa.
VII - Assiste ao Jornal o direito, a função social, de difundir notícias de interesse público, importando que o faça com verdade e com fundamento, pois, o direito à honra em sentido lato, e o direito de liberdade de imprensa e opinião são tradicionais domínios de direitos fundamentais em conflito, tendo ambos tutela constitucional pelo que facilmente se entra no campo da colisão de direitos -art. 335.º do CC -sendo que, em relação a factos desonrosos, dificilmente se pode configurar a exceptio veritatis a cargo do lesante.
VIII - A prova da actuação diligente na recolha e tratamento da informação -a actuação segundo as leges artis -incumbe ao jornalista.
IX - No caso em apreço, provou-se que o Jornal procedeu a uma prudente investigação dos factos, junto da área de residência do Autor, baseada em fontes diversificadas, junto de vizinhos e do contacto com as autoridades policiais locais que confirmaram a veracidade dos factos relatados na notícia.
X - Se não se provou que a publicação da notícia causou ao visado dano moral -sofrimento, psicose, depressão (como foi alegado) -e não havendo negligência do jornalista na recolha das fontes, nem tendo resultados danos, não existe obrigação de indemnizar, por a dignidade do Autor não ter sido afectada, pese embora o desvalor dos factos noticiados.
         Revista n.º 2452/08 -6.ª Secção Número 124 – Setembro 2008 Fonseca Ramos (Relator) * Cardoso de Albuquerque Azevedo Ramos
 
I -A prova pericial, mesmo de carácter técnico, como a perícia médico-legal, é de livre apreciação pelo Tribunal (arts. 368.º e 369.° do CC) -sendo por isso matéria de facto, pelo que escapa à competência do Supremo Tribunal, enquanto Tribunal de revista, decidir se a incapacidade da Autora à luz da peritagem não devia ter sido fixada em 17% e, se, de harmonia com tal incapacidade, se não se deveria ter considerado provado que tal incapacidade reflecte total incapacidade para o desempenho das lides domésticas.
II - Estando provado que a Autora necessita de terceira pessoa para executar as lides domésticas por as não poder executar, na indemnização por dano futuro deverá ser contemplado o facto de a Autora, durante a sua vida, carecer do auxílio de terceira pessoa a quem, naturalmente e como se provou, terá que remunerar, estimando-se que o faça, pelo menos, de acordo com a remuneração mínima garantida.
III - A incapacidade parcial permanente afectando a actividade laboral, representa, em si mesma, um dano patrimonial, nunca podendo reduzir-se à categoria dos danos não patrimoniais.
IV - No caso em apreço, pese embora a Autora ter 43 anos de idade à data do acidente e não exercer actividade remunerada -o que, de modo algum, equivale a considerar que não perdeu capacidade de ganho -perdeu porque existe dano biológico com afectação futura e permanente, handicap da sua capacidade potencial em termos laborais que seria, se não fora a lesão, de 100%, reputando-se equitativa a indemnização de € 130.000,00, mesmo tendo em conta a necessidade de remunerar terceira pessoa por estar permanentemente incapacitada para o desempenho das lides domésticas.
V - Considerando ainda que as lesões, posto que incapacitantes, não provocaram senão um dano estético moderado, o quantum doloris foi fixado em 4 numa escala de 7 e, como revela o exame objectivo, as lesões da Autora são apenas no joelho direito embora importem a necessidade de medicamentação continuada, sendo certo que durante o período de internamento hospitalar e clínico, bem como com a intervenção cirúrgica e tratamentos a que foi sujeita sofreu dores e incómodos, bem como sentiu receios quando ao seu estado e saúde presente e futuros, reputa-se equitativa a compensação dos danos morais sofridos em € 15.000,00.
         Revista n.º 2417/08 -6.ª Secção Fonseca Ramos (Relator) Cardoso de Albuquerque Azevedo Ramos
 
I -As novas disposições da resolução em benefício da massa insolvente do CIRE, constantes dos arts. 120.º e ss. são inaplicávies aos actos e contratos do insolvente celebrados anteriormente ao início da vigência deste diploma.
II - A forma de efectuar a resolução prevista no art. 123.º vale tanto para aos negócios não formais, como formais, como é o caso por estarmos em presença de um contrato de compra e venda de imóveis, celebrado entre o impugnante e o insolvente, então necessariamente sujeito a escritura pública.
         Revista n.º 1825/08 -6.ª Secção Cardoso de Albuquerque (Relator) * Azevedo Ramos Silva Salazar
 
I -Para fazer valer o direito de anular um contrato de compra e venda dito simulado, por forma a ser-lhe reconhecida a titularidade do direito anteriormente inscrito a seu favor dos prédios e o cancelamento dos actos de registo posteriores, tem o A. que propor a acção também contra os subadquirentes cuja aquisição se mostra registada, implicando a falta destes a ilegitimidade passiva da ré e, como consequência, independentemente de ela a não ter arguido, a absolvição da instância desta, nos termos gerais dos arts. 494.º, al. e), e 495.º do CPC.
II - A falta de notificação da A. para fazer intervir no pleito os subadquirentes constitui mera nulidade processual não catalogável como “nulidade principal” que por não arguida, no momento e sede própria se deve considerar sanada.
         Agravo n.º 1077/08 -6.ª Secção Cardoso de Albuquerque (Relator) Azevedo Ramos Silva Salazar
 
I -Para que possa ocorrer recurso extraordinário de revisão os invocados novos factos ou meios de prova devem evidenciar inocência, muito mais do que a mera vaguidade ou que tão só possam vir a fundamentar simplesmente a aplicação de uma sanção penal menos gravosa, isto é, devem ser susceptíveis de conduzir a uma ponderação alternativa do tipo condenação/absolvição – cf. Ac. do STJ de 24-11-2005.
II - A lei não permite que a inércia voluntária do arguido em fazer actuar os meios ordinários de defesa seja compensada pela atribuição de meios extraordinários de defesa: como se diz no Ac. do TC n.º 376/2000, “no novo processo, não se procura a correcção de erros eventualmente cometidos no anterior e que culminou na decisão recidenda, porque para a correcção desses vícios, terão bastado e servido as instâncias de recurso ordinário, se acaso tiverem sido necessárias”.
         Proc. n.º 1149/08 -5.ª Secção Soares Ramos (relator) Santos Carvalho Simas Santos
 
I -Restrito o recurso à medida da pena única, a competência deste Supremo Tribunal limita-se à correcção das operações de determinação daquela medida ou do procedimento, à indicação dos factores que, em cada caso concreto, devam considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis ou à falta de conhecimento ou à errada aplicação, pelo tribunal, dos princípios gerais de determinação relativos à questão do limite da moldura ou à forma de actuação dos fins das penas no quadro geral da prevenção, “já não (todavia) a determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum exacto da pena”, salvo se, v.g., tiverem sido violadas regras de experiência ou se a quantificação se revelar de todo desproporcionada.
II - A finalidade primordial da aplicação das penas reside na prevenção geral, o que significa “que a pena deve ser medida basicamente de acordo com a necessidade de tutela de bens jurídicos que se exprima no caso concreto” (Anabela Rodrigues, A Determinação da Medida da Pena Privativa de Liberdade, Coimbra Editora, 2003, pág. 570), alcançando-se mediante a estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma jurídica violada.
III - As considerações de prevenção especial, traduzindo a necessidade de socialização do agente, em vista da sua preparação para o não cometimento futuro de outras infracções, no capítulo do dimensionamento da pena, hão-de ceder ao limite constituído pelas exigências mínimas de defesa do ordenamento jurídico.
IV - A culpa desempenha o papel individualizador de “limite inultrapassável de todas e quaisquer considerações preventivas” (idem, pág. 575), pois que “sendo a pena efectivamente medida pela prevenção geral, ela deve respeitar o limite da culpa e, assim, preservar a dignidade humana do condenado” (pág. 558).
         Proc. n.º 2296/08 -5.ª Secção Soares Ramos (relator) Santos Carvalho
 
I -No concurso superveniente de crimes (art. 78.º do CP), nada impede que na formação da pena única entrem penas de prisão efectiva e penas de prisão suspensa, decidindo o tribunal do cúmulo se, reavaliados em conjunto os factos e a personalidade do arguido, a pena única deve ou não ficar suspensa na sua execução.
II - As penas suspensas anteriores que já tiverem sido declaradas extintas nos termos do art. 57.º, n.º 1, do CP, não são de considerar na formulação da pena única, sem prejuízo de desconto de prisão preventiva neles eventualmente sofrida (art. 78.º, n.º 1, do CP).
III - O período de suspensão tem hoje (após a Lei 59/2007), duração igual à da pena de prisão determinada na sentença, mas nunca inferior a um ano, a contar do trânsito em julgado da decisão (art. 50.º, n.º 5, do CP).
IV - Por força do art. 2.º, n.º 4, do CP é de aplicar retroactivamente a lei penal mais favorável para o arguido, caso o período de suspensão fixado anteriormente exceda o previsto agora como limite máximo.
V - Não são de considerar no cúmulo superveniente de penas as que tenham sido suspensas e cujo período de suspensão já tenha decorrido, salvo se a suspensão já tiver sido revogada.
         Proc. n.º 2818/08 -5.ª Secção Santos Carvalho (relator) * Rodrigues da Costa
 
I -Considerando que todas as sentenças condenatórias transitaram em julgado antes da entrada em vigor da Lei 59/2007, de 04-09, é aplicável a lei anterior, salvo se o regime emergente da nova lei se mostrar, em concreto, mais favorável ao arguido, pelo que o tribunal recorrido deveria ter realizado o cúmulo jurídico à luz de cada uma das leis; não o fazendo, a decisão cumulatória enferma de omissão de pronúncia, a que alude o art. 410.º, n.º 2, al. c), do CPP.
II - O denominado cúmulo por arrastamento – que foi seguido por alguma jurisprudência do STJ (cf. Ac. de 26-10-1988, CJ, Ano XIII, tomo IV, págs. 18 e ss.) –, baseia-se numa interpretação do art. 78.º, n.º 1, do CP, nos termos da qual «a condenação por crimes cometidos antes e depois de condenações entretanto proferidas, implica a efectivação de um cúmulo jurídico, por arrastamento, das penas aplicadas e a aplicar a todos esses crimes».
III - Porém, da análise do regime emergente dos arts. 78.º, n.º 1, e 77, n.º 1, do CP, tanto na redacção emergente da Lei 59/2007, de 04-09, como na anterior, resulta que o trânsito em julgado da condenação por um crime constitui o limite temporal dos crimes a englobar no cúmulo, inviabilizando a consideração, no concurso, de penas aplicadas por crimes praticados após o trânsito dessa primeira condenação, o que afasta o denominado cúmulo por arrastamento.
IV - Como tal, os crimes cometidos posteriormente ao trânsito em julgado da primeira condenação não se encontram numa relação de concurso, pelo que as respectivas penas serão objecto de cumprimento sucessivo.
V - A jurisprudência deste STJ, após um período em que advogou o designado cúmulo por arrastamento, tem recentemente, de forma unânime, afastado a aplicação dessa teoria – Acs. de 15-03-2007, Proc. n.º 4796/06 -5.ª, de 19-12-2007, Proc. n.º 3400/07 -3.ª e de 1704-2008, Proc. n.º 681/08 -5.ª, e do TC, no Proc. n.º 243/02 -1.ª, de 22-05-2002.
VI - A orientação dominante no STJ tem sido no sentido de, em caso de conhecimento superveniente do concurso, serem incluídas na pena única todas as penas de prisão, sejam de prisão efectiva ou suspensas na sua execução – Acs. de 29-05-2008, Proc. n.º 4462/07 5.ª, de 10-01-2007, Proc. n.º 4082/06 -3.ª, de 07-02-2007, Proc. n.º 4592/05 -3.ª, e de 0310-2007, Proc. n.º 2576/07 -3.ª, e do TC, no Proc. n.º 904/05 -2.ª, de 03-01-2006.
VII - Constitui vício de insuficiência da matéria de facto provada previsto na al. a) do n.º 2 do art. 410.º do CPP, a falta de indicação da data do trânsito em julgado de algumas decisões condenatórias; perante tal omissão, deveria o tribunal a quo ter, oficiosamente, diligenciado pela obtenção do elemento em falta, solicitando-o aos tribunais respectivos, já que tal insuficiência resulta do próprio texto da decisão recorrida.
VIII - Considerando que o presente recurso foi interposto pelo arguido, tendo em atenção o princípio da proibição da reformatio in pejus, as penas em que venha a ser condenado em novo acórdão, não podem ultrapassar o limite da pena de prisão já fixado na decisão recorrida – cf. Acs. de 17-04-2004, Proc. n.º 1412/04 -5.ª, e de 09-04-2008, Proc. n.º 3187/07 -5.ª.
         Proc. n.º 1512/08 -5.ª Secção António Colaço (relator) ** Soares Ramos
 
I -Para aferir da tempestividade de interposição do recurso, importa reter que: -a sentença de 1.ª instância, lida em 31-05-2006, foi depositada em 19-06-2006; -em 14-06-2006 o recorrente requereu “cópias da gravação da produção de prova oralmente produzida”, que só lhe foram disponibilizadas em 17-07-2006; -o recorrente interpôs recurso em 20-07-2006; -o recurso não foi admitido porque o prazo de 15 dias havia terminado em 04-07-2006.
II - A decisão recorrida – que não admitiu o recurso –, foi revogada já que a entrega das cópias das gravações constituía uma parte estruturante das alegações de recurso e porque o manifesto atraso dos serviços de secretaria não pode lesar os princípios de lealdade, boa fé e confiança do sujeito processual no equilibrado e justo desenvolvimento do processo, não podendo o mesmo ser surpreendido e muito menos penalizado com tal atraso.
         Proc. n.º 2194/08 -5.ª Secção António Colaço (relator) ** Soares Ramos
 
I -A omissão de pronúncia só se verifica quando o juiz deixa de se pronunciar sobre questões que lhe foram submetidas pelas partes ou de que deve conhecer oficiosamente, entendendo-se por questões, os problemas concretos a decidir e não os simples argumentos, opiniões ou doutrinas expendidos pelas partes na defesa das teses em presença – Ac. do STJ de 17-012008, Proc. n.º 607/07 -5.ª.
II - O STJ conhece oficiosamente deste vício, quanto mais não seja quando, num recurso restrito exclusivamente à matéria de direito constate que, por força da inquinação da decisão recorrida pelo alegado vício, não possa conhecer de direito sob o prisma das várias soluções jurídicas que se apresentem como plausíveis.
         Proc. n.º 1881/08 -5.ª Secção António Colaço (relator) ** Soares Ramos
 
I -Na moldura de 3 a 10 anos de prisão [aplicável ao crime de abuso sexual de crianças p. e p. pelo art. 172.º, n.º 2, do CP], resultando provado que: -entre as 8h00 e as 9h45 do dia 14-11-1999, em T.., numa ocasião em que a ofendida, à data com 12 anos, se encontrava afastada da povoação cerca de 100 m – havia saído da casa de familiares, onde pernoitara, e caminhado a pé em direcção ao moinho da aldeia, percorrendo o respectivo caminho, a fim de escolher imagens para fotografar, uma vez que frequentava um curso de fotografia na escola secundária onde estudava –, o arguido, à data com 58 anos, tio do pai da menor, surgiu por trás da ofendida, surpreendendo-a, agarrou-a por trás, dominou-a, empurrou-a e tirou-lhe a camisola, tendo as calças caído e a menor tropeçado nelas e caído no chão; -quando a ofendida se encontrava no chão, o arguido arrancou-lhe as cuecas, afastou-lhe as pernas e introduziu o pénis na vagina da menor, que reagiu gritando, não tendo sido ouvida por ninguém; -a ofendida, que até então era virgem, ficou assustada de tal modo que nem sabia como reagir, sendo que tudo ocorreu e terminou rapidamente, sem que o arguido lhe dirigisse qualquer palavra; -ao agir do modo descrito, o arguido, que sabia a idade da ofendida, pretendia satisfazer os seus instintos sexuais, tudo fazendo com vontade livre e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei; -com a sua descrita conduta, o arguido provocou o desfloramento da ofendida e causou-lhe danos psicológicos que motivam sentimentos depressivos, acompanhados de angústia e dificuldade em manter relações afectivas com o grupo de pares; -em consequência da descrita conduta, a ofendida esteve sujeita a tratamento psicológico até cerca de um ano antes da audiência [de 17-03-2006], mantendo presentemente uma relação afectiva com o namorado; -o arguido não assumiu qualquer atitude demonstrativa de arrependimento; -o arguido tem como habilitações literárias o 12.º ano de escolaridade; vive com a mulher, auxiliar da acção educativa, com quem é casado há aproximadamente 30 anos; tem 3 filhos maiores, com quem mantém bom relacionamento; exerceu o cargo de Sargento-Mor do Serviço da Polícia Militar, encontrando-se presentemente na reserva, recebendo o montante mensal de cerca de € 2000; -o arguido é tido por pessoa considerada social e profissionalmente, integra, recta, honesta, com uma personalidade bem formada e bom pai de família; -não tem antecedentes criminais; mostra-se adequada a pena de 5 anos de prisão aplicada.
II - No n.º 1 do art. 50.º do CP, na redacção da Lei 59/2007, de 04-09, subiu-se o limiar da pena compatível com a suspensão, pelo que deverá acolher-se esta nova redacção, já que mais favorável; desde logo, porque no caso destes autos fica autorizada a suspensão, enquanto que, a ter em conta a redacção vigente à data dos factos praticados, o recorrente teria sempre de cumprir a pena de prisão aplicada.
III - O primeiro ponto a ponderar sobre a suspensão da pena aplicada tem a ver com as finalidades da punição e estas reportam-se à defesa dos bens jurídicos e à reintegração do agente na sociedade, cabendo à culpa o papel de pressuposto e limite inultrapassável da medida da pena.
IV - A defesa de bens jurídicos é um propósito geral que informa todo o sistema penal, não privativo das penas, pelo que se tem que ligar tal propósito, em matéria de fins das penas, à prevenção geral dita positiva. Importa pois saber, antes de mais nada, se nessa tarefa que compete ao Estado de gerir a indignação social, provocada junto de quem teve conhecimento do cometimento do crime, importa saber se a aludida suspensão se justifica no presente caso.
V - Depois, e já em matéria de prevenção especial, só se deverá optar pela suspensão da pena quando existir um juízo de prognose favorável, centrado na pessoa do arguido e no seu comportamento futuro. A suspensão da pena tem um sentido pedagógico e reeducativo, sentido norteado, por sua vez, pelo desiderato de afastar, tendo em conta as concretas condições do caso, o delinquente da senda do crime. Também importa acrescentar que esse juízo de prognose não corresponde a uma certeza, antes a uma esperança fundada de que a socialização em liberdade se consiga realizar. Trata-se pois de uma convicção subjectiva do julgador que não pode deixar de envolver um risco, derivado, para além do mais, dos elementos de facto mais ou menos limitados a que se tem acesso.
VI - No caso em apreciação: -não se colocam preocupações de monta ao nível da reinserção social do arguido; nada se pode apontar quanto ao seu comportamento anterior ao crime, ou posterior ao mesmo; isto, obviamente, na medida em que continua com o registo criminal limpo, mais de 8 anos volvidos sobre os factos destes autos, factos esses que integram um tipo de crime que pode revelar uma parafilia, a qual por sua vez pode manter-se ou não; -assume especial relevo o tempo decorrido desde que o recorrente praticou os factos; -no entanto, mostra-se importante fazer sentir ao agora condenado os efeitos da condenação; o seu comportamento foi altamente censurável e o recorrente não pode deixar de o interiorizar; -em termos de prevenção geral, a reacção penal aos factos em apreço poderá mostrar-se suficiente, optando-se pela suspensão da pena, desde que condicionada ao pagamento de uma quantia à ofendida e à prestação de trabalho a favor da comunidade; só desse modo se evitará uma perda da confiança posta no sistema repressivo penal pela sociedade, designadamente pela população local.
VII - O art. 51.º do CP autoriza, no seu n.º 1, a subordinação da suspensão da execução da pena ao cumprimento de deveres impostos ao condenado, e destinados a reparar o mal do crime. A título de exemplo, menciona-se na al. a) desse n.º 1, o pagamento em certo prazo de indemnização devida ao lesado, no todo ou em parte. De notar que se não está, neste domínio de deveres condicionantes da suspensão da pena, perante uma indemnização cível por perdas e danos, calculada e orientada pelos mesmos exactos propósitos desta. Está-se, pelo contrário, só perante uma “função adjuvante das finalidades da punição”.
VIII - A reparação do mal do crime passa também, no caso presente (em que não há notícia de propositura de acção cível em separado, nem foi formulado nestes autos qualquer pedido cível), pela entrega de uma quantia monetária à ofendida. A menor sofreu, em termos de causalidade adequada, importante traumatismo psicológico (dano) derivado da conduta criminosa do recorrente (facto voluntário, ilícito e doloso). Em virtude do mesmo esteve em tratamento até cerca de um ano antes da audiência de 17-03-2006. Mostra-se adequado o pagamento pelo recorrente, a título de indemnização à ofendida, da quantia de € 10 000, no prazo de 3 meses. Esse pagamento será por conta da quantia que venha a ser arbitrada, em acção que vier a ser interposta, se o for, visando a condenação do recorrente em indemnização por perdas e danos, e tendo como causa de pedir o crime destes autos.
IX - O art. 52.º do CP prevê, no seu n.º 1, a imposição do “cumprimento pelo tempo de duração da suspensão, de regras de conduta de conteúdo positivo, susceptíveis de fiscalização e destinadas a promover a sua reintegração na sociedade”. A título exemplificativo enumera a seguir o que possam ser tais regras de conduta, mencionando na al. c) desse n.º 1 “cumprir determinadas obrigações”.
X - Mostra-se adequada ao caso a imposição da obrigação de prestação de trabalho a favor da comunidade, a qual não assume aqui, obviamente, a condição de pena, e sim a de modalidade que no caso deve revestir a suspensão da pena, trabalho que se deve considerar integrado nessa pena de substituição. Fica assim o recorrente obrigado a prestar trabalho a favor da comunidade num total de duzentas horas, em termos a estabelecer pela 1.ª instância, e em consonância com os serviços de reinserção social, sob a cominação da revogação da suspensão, de acordo com o disposto no n.º 1 do art. 56.º do CP.
         Proc. n.º 792/07 -5.ª Secção Souto Moura (relator) ** António Colaço Soares Ramos (“vencido … manteria a pena aplicada, ou reduzi-la-ia para 4 anos, não suspendendo, porém, em qualquer das hipóteses, a sua execução, apesar do
 
I -Conforme vem sendo uniformemente entendido neste STJ, o julgador tem sempre que ponderar a aplicabilidade do regime penal previsto para os menores de 21 anos, mesmo que seja para concluir que o arguido não deve, no caso, beneficiar desse regime.
II - Independentemente dos elementos fornecidos pelos autos apontarem num sentido desfavorável ou favorável a esse benefício, não se configura, a tal respeito, a possibilidade de uma tomada de posição que surja como meramente implícita.
III - Tendo o recorrente 20 anos à data da prática dos factos, a decisão recorrida padece de nulidade, ao omitir qualquer referência a este regime especial, nos termos dos arts. 379.º, n.º 1, al. c), 374.º e 425.º, n.º 4, todos do CPP – cf. Acs. deste STJ de 16-05-2007 e de 1206-2008, Procs. n.ºs 1492/07 e 3245/07, ambos da 3.ª.
         Proc. n.º 3858/07 -5.ª Secção Souto Moura (relator) ** António Colaço Soares Ramos Santos Carvalho
 
I -Nos termos do art. 40.º do CP, toda a pena tem como finalidade “a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade” e, em matéria de culpabilidade, diz o seu n.º 2 que, “em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa”.
II - Com este preceito fica a indicação de que a pena assume agora, e entre nós, um cariz utilitário, no sentido de eminentemente preventivo, não lhe cabendo, como finalidade, a retribuição qua tale da culpa; a avaliação da culpa do agente fica ao serviço, fundamentalmente, de propósitos garantísticos e no interesse do arguido.
III - A doutrina vem defendendo que, se as finalidades da aplicação de uma pena residem primordialmente na tutela de bens jurídicos e, na medida do possível, na reinserção do agente na comunidade, então, o processo de determinação da pena concreta a aplicar reflectirá, de um modo geral, a seguinte lógica: -a partir da moldura penal abstracta procurar-se-á encontrar uma submoldura para o caso concreto, que terá como limite superior a medida óptima de tutela dos bens jurídicos e das expectativas comunitárias, e como limite inferior, o quantum abaixo do qual “já não é comunitariamente suportável a fixação da pena sem pôr irremediavelmente em causa a sua função tutelar” (Figueiredo Dias, Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, pág. 229);-será dentro dos limites consentidos pela prevenção geral positiva que deverão actuar os pontos de vista da reinserção social; -quanto à culpa, para além de suporte axiológico-normativo de toda e qualquer repressão penal, compete-lhe estabelecer o limite inultrapassável da medida da pena a aplicar.
IV - O n.º 2 do art. 71.º do CP manda atender, na determinação concreta da pena, «a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele». Enumera a seguir, a título exemplificativo, circunstâncias referentes à ilicitude do facto, à culpa do agente, à sua personalidade, ao meio em que se insere, ao comportamento anterior e posterior ao crime.
V - Só se deve optar pela suspensão da execução da pena quando existir um juízo de prognose favorável, centrado na pessoa do arguido e no seu comportamento futuro. A suspensão da pena tem um sentido pedagógico e reeducativo, sentido norteado, por sua vez, pelo desiderato de afastar, tendo em conta as concretas condições do caso, o delinquente da senda do crime.
VI - Esse juízo de prognose não corresponde a uma certeza, antes a uma esperança fundada de que a socialização em liberdade se consiga realizar. Trata-se pois de uma convicção subjectiva do julgador que não pode deixar de envolver um risco, derivado, para além do mais, dos elementos de facto mais ou menos limitados a que se tem acesso (cf. ob. cit., pág. 344).
VII - Confirmada a pena aplicada na decisão recorrida – de 4 anos e 1 mês de prisão –, atenta a idade muito jovem do recorrente e perante a nova redacção do art. 50.º, n.º 1, do CP, introduzida pela Lei 59/2007, de 04-09, justifica-se a elaboração de um relatório actualizado sobre as suas condições de vida para que a 1.ª instância equacione a possibilidade de se suspender a execução desta pena de prisão.
         Proc. n.º 2789/07 -5.ª Secção Souto Moura (relator) ** António Colaço Soares Ramos
 
I -A petição de habeas corpus, em caso de prisão ilegal, tem os seus fundamentos taxativamente previstos no n.º 2 do art. 222.º do CPP: a) ter sido [a prisão] efectuada ou ordenada por entidade incompetente; b) ser motivada por facto pelo qual a lei a não permite; c) manter-se para além dos prazos fixados por lei ou por decisão judicial.
II - Numa situação em que foi requerida pelo MP a declaração de excepcional complexidade, é de considerar que se pronunciou no sentido da oposição o requerente que, ouvido nos termos do art. 215.º, n.º 4, do CPP, antes de proferido o despacho a declarar a excepcional complexidade, disse que a pretensão do MP não tinha sentido e que precisava de ter acesso à factualidade invocada pelo MP para o demonstrar cabalmente.
III - O assistente não foi notificado para se pronunciar. Porém, a lei impõe essa audição por imperativo do contraditório, na pressuposição da contraposição de interesses polarizados na figura do arguido e do assistente, sendo este o titular do interesse ofendido com a prática do crime e aquele o agente da ofensa do bem jurídico que se protege com a incriminação. De sorte que é ao assistente que incumbe arguir a respectiva irregularidade.
IV - A posição do assistente é muito diversa da do arguido, a deste último contendendo com o direito de defesa e o direito à liberdade e a daquele com a tutela do interesse violado, a reclamar em princípio a posição que melhor defenda o seu interesse, que é a de sujeitar o arguido a julgamento e assegurar a medida coactiva mais eficaz no caso, para garantir esse desiderato. É por essa razão que a posição do arguido, contendendo com o direito de defesa e o direito à liberdade é constitucionalmente mais exigente, situando-se do seu lado a imposição de garantias criminais, que têm toda uma série de implicações no processo penal. A posição do assistente é menos protegida, como, por exemplo, no caso dos recursos, em que o TC tem reconhecido essa diferença de posições a propósito do convite a formular aos sujeitos processuais para corrigirem as conclusões da motivação, antes de o recurso ser rejeitado por questões de forma.
V - Se o assistente pode fazer valer os seus direitos, arguindo a irregularidade cometida com a omissão de audição, não pode o arguido fazê-lo em vez dele, nem pode invocá-la como fundamento de habeas corpus. Fundamento de habeas corpus só pode ser uma patente ilegalidade relativamente à prisão preventiva do arguido e não uma simples irregularidade que, ainda por cima, contende com o interesse do assistente.
         Proc. n.º 3074/08 -5.ª Secção Rodrigues da Costa (relator) Arménio Sottomayor
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