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Processo n.º 1106/04                          
 Plenário
 Relatora: Conselheira Maria Helena Brito
 
  
 
  
 
  
 Acordam, em plenário, no Tribunal Constitucional:
 
  
 I
 
  
 
  
 
 1.         Nos presentes autos, o Tribunal Constitucional proferiu o acórdão n.º 
 
 379/2004, de 1 de Junho, no qual se decidiu o seguinte (cfr. fls. 396 e 
 seguintes):
 
  
 
 “[...]
 b) Julgar inconstitucional, por violação das disposições conjugadas dos artigos 
 
 32º, nº 8, 43º, nºs 1 e 4 e 18º, nº 2 da Constituição da República Portuguesa, a 
 norma constante do artigo 188º, nº 1 do Código de Processo Penal, quer na 
 redacção anterior quer na posterior à que foi dada pelo Decreto-Lei nº 
 
 320-C/2000, de 15.12, quando interpretada no sentido de uma intercepção 
 telefónica, inicialmente autorizada por 60 dias, poder continuar a processar-se, 
 sendo prorrogada por novos períodos, ainda que de menor duração, sem que 
 previamente o juiz de instrução tome conhecimento do conteúdo das conversações;
 c) Julgar inconstitucional por violação dos mesmos preceitos da Constituição da 
 República Portuguesa a citada norma, na interpretação segundo a qual, a primeira 
 audição, pelo juiz de instrução criminal, das gravações efectuadas pode ocorrer 
 mais de três meses após o início da intercepção e gravação das comunicações 
 telefónicas.
 Consequentemente, concede-se provimento ao recurso, devendo o acórdão recorrido 
 ser reformulado de acordo com o presente juízo de constitucionalidade.
 
  
 
             É a seguinte a fundamentação dos dois juízos de 
 inconstitucionalidade (cfr. fls. 422 e seguintes):
 
  
 
 “[...]
 
 3 - As questões de constitucionalidade suscitadas não são novas para o Tribunal 
 Constitucional que já teve ocasião para sobre elas se pronunciar nos acórdãos 
 n.ºs 407/97, de 21/05/97, 347/01, de 10/07/01, e, mais recentemente, no acórdão 
 n.º 528/03, de 31/10/03, que para aqueles dois primeiros remeteu (cfr. 
 
 www.tribunalconstitucional.pt).
 No acórdão nº 407/97, este Tribunal decidiu «julgar inconstitucional, por 
 violação do disposto no nº 6 do artigo 32º da Constituição, a norma do nº 1 do 
 artigo 188º do Código de Processo Penal quando interpretado em termos de não 
 impôr que o auto da intercepção e gravação de conversações ou comunicações 
 telefónicas seja, de imediato, lavrado e levado ao conhecimento do juiz, de modo 
 a este poder decidir atempadamente sobre a junção ao processo ou a destruição 
 dos elementos recolhidos, ou de alguns deles, e bem assim, também atempadamente, 
 a decidir, antes da junção ao processo de novo auto da mesma espécie, sobre a 
 manutenção ou alteração da decisão que ordenou as escutas».
 No acórdão nº 347/01, em que se trouxe também à colação a jurisprudência do 
 Tribunal Europeu dos Direitos do Homem sobre a problemática das escutas 
 telefónicas, escreveu-se que «‘cobrir’ situações como a de o auto de transcrição 
 ser apresentado ao juiz meses depois de efectuadas a intercepção e gravação das 
 comunicações telefónicas, mesmo tendo em conta a gravidade do crime investigado 
 e a necessidade daquele meio de obtenção de prova, restringe despropositadamente 
 o direito à inviolabilidade de um meio de comunicação privada e faculta uma 
 ingerência neste meio para além do que se considera ser constitucionalmente 
 admissível.
 Ficar no desconhecimento do juiz, durante tal lapso de tempo, o teor das 
 comunicações interceptadas, significa o desacompanhamento próximo e o controlo 
 judiciais do modo como a escuta se desenvolve.
 
 (...)
 Por outro lado, autorizar novos períodos de escuta, a mero requerimento do 
 Ministério Público, sem que a autorização seja precedida do conhecimento 
 judicial do resultado da intercepção anterior, continua a significar a mesma 
 ausência de acompanhamento e de controlo por parte do juiz».
 No acórdão nº 528/03, salientando a evolução da jurisprudência mais recente do 
 TEDH, o Tribunal Constitucional considerou «inconstitucional a interpretação do 
 n.º 1 do artigo 188º do Código de Processo Penal, na redacção anterior à que lhe 
 foi dada pelo Decreto-Lei n.º 320-C/2000, de 15 de Dezembro, que foi acolhida 
 pela decisão recorrida. Com efeito, entender que situações como as que ocorreram 
 no presente processo – em que os autos de intercepção e gravação de conversações 
 telefónicas que tinham sido entretanto autorizadas só foram levados ao 
 conhecimento do juiz que as ordenou 38 dias depois de elas terem tido início – 
 são ainda abrangidas pela expressão imediatamente, colide frontalmente com os 
 interesses que se pretendem acautelar com aquela exigência, na medida em que 
 impede o seu acompanhamento próximo pelo juiz».
 Ora, verifica-se que esta jurisprudência do Tribunal Constitucional, para cuja 
 fundamentação se remete e se dá aqui por reproduzida, mantém inteira validade 
 para o caso em apreço, o que leva a que se considere inconstitucional a norma 
 constante do artigo 188º, nº 1, do Código de Processo Penal, interpretada no 
 sentido de a intercepção telefónica, inicialmente autorizada por 60 dias, poder 
 continuar a processar-se, sendo prorrogada por dois novos períodos (de 30 dias 
 cada um), sem que previamente o juiz de instrução controle e tome conhecimento 
 do conteúdo das conversações, por violação dos artigos 32º, nº 8, 34º, nºs 1 e 
 
 4, e 18º, nº 2, da Constituição, bem como a mesma norma, na interpretação 
 segundo a qual a primeira audição da gravação das escutas telefónicas pelo juiz 
 de instrução pode ocorrer durante o aludido segundo período de prorrogação.
 
 [...].”.
 
  
 
  
 
 2.         Na sequência do referido acórdão do Tribunal Constitucional, foram os 
 autos remetidos ao Tribunal da Relação de Coimbra, que proferiu, em 3 de 
 Novembro de 2004 o acórdão que segue (fls. 437 e seguintes):
 
  
 
 “[...]
 Daí que haja, por mera obediência, de reformular o já decidido, pois se continua 
 a manter a posição anteriormente defendida.
 
 [...]
 Sendo as conclusões que delimitam o objecto do recurso e tomando-se em 
 consideração o decidido pelo TC, vemos que o despacho que ordenou as escutas foi 
 proferido em 23/10/2000, deferindo tal diligência pelo prazo de 60 dias.
 Ainda de acordo com as conclusões que o recorrente formula, o M.mº JIC ouviu em 
 
 30/01/01, todo o material interceptado e gravado (concl. 3ª), ordenando a 
 transcrição do que lhe pareceu relevante em 18/02/01. 
 Todavia, anteriormente, em 21/12/2000 (fls. 53), o M.mº Juiz prorrogou as 
 escutas telefónicas por 30 dias.
 Ou seja, fê-lo sem que antes tivesse tomado conhecimento do conteúdo das 
 anteriormente efectuadas.
 Daí que as escutas efectuadas ao abrigo de tal despacho tenham que ser 
 declaradas nulas.
 Mas, na parte restante, afigura-se que nada é afectado pelo acórdão a que se 
 obedece.
 Acresce que se não descortina pelo exame dos autos quando se iniciou a 
 intercepção e gravação das comunicações telefónicas, ordenada a 23/10/2000 e 
 cujo resultado foi constatado a 30/01/01.
 Termos em que acordam em declarar nulas as intercepções telefónicas efectuadas 
 com base no despacho de fls. 53.
 
 [...].”.
 
  
 
  
 
 3.         Deste acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra recorreu A. para o 
 Tribunal Constitucional (fls. 449 e seguintes), pretendendo, em síntese, o 
 seguinte:
 
  
 
 “[...]
 Nestes termos, o ora recorrente pretende interpor recurso para o Tribunal 
 Constitucional, com vista à apreciação de violação de caso julgado 
 constitucional, violação essa efectuada pelo Acórdão da Relação de Coimbra de 
 
 3.11.04 em relação aos juízos de inconstitucionalidade (e subsequente ordem de 
 reformulação) formulados pelo Acórdão do Tribunal Constitucional n.° 379/04, de 
 
 1.06.04, com referência à interpretação concreta que aquele primeiro Acórdão 
 havia dado à norma do art. 188°, n.° 1, do CPP, juízos esses que implicavam a 
 obrigatoriedade de serem declaradas nulas todas as escutas efectuadas entre a 
 data da autorização (23.10.00) e a data em que o seu conteúdo foi apresentado ao 
 juiz (30.01.01), e não apenas aquelas que o Acórdão da Relação de Coimbra de 
 
 03.11.04 decidiu anular.
 Na verdade, o Acórdão da Relação de Coimbra de 3.11.04, cuja reformulação foi 
 determinada por aquele Acórdão n.° 379/04 do Tribunal Constitucional, ao 
 desobedecer a tal determinação, violou o caso julgado constitucional e, 
 consequentemente, interpretou e aplicou os arts. 2° e 80°, n.ºs 1 a 3, da Lei do 
 Tribunal Constitucional (Lei n° 28/82 de 15 de Novembro, com as alterações 
 subsequentes) e também o art. 188°, n.° 1, do CPP de modo inconstitucional, 
 fazendo com que, nessa interpretação, tais preceitos padecessem de 
 inconstitucionalidade material por violação dos princípios da legalidade, da 
 proporcionalidade, da subsidariedade e do controlo material, previstos nos arts. 
 
 210°, n.° 1, 212°, n.° 1, 221°, 32°, n.ºs 2 e 8, 34°, n.ºs 1 e 3, 18°, n.° 2, 
 
 205°, n.ºs 2 e 3, e 282°, n.° 3, da Constituição da República Portuguesa.
 Com o presente recurso, visa o recorrente obter decisão que decida sobre a 
 violação de caso julgado constitucional alegada (na esteira da jurisprudência 
 firmada pelo Acórdão do TC n.° 340/00, tirado pelo Plenário daquele Tribunal) e, 
 consequentemente, ordene ao Tribunal da Relação de Coimbra o cumprimento da sua 
 decisão mediante reformulação adequada do Acórdão daquela Relação de 3.11.04 ou, 
 se assim se não entender, conheça das inconstitucionalidades atrás arguidas ao 
 abrigo do disposto no art. 70°, n.° 1, alíneas b) e g), da Lei do Tribunal 
 Constitucional, com as mesmas consequências legais.
 
 [...].”.
 
  
 
  
 
             O recurso foi admitido por despacho de fls. 461.
 
  
 
  
 
 4.         Notificado para produzir alegações, assim o fez o recorrente A. (fls. 
 
 468 e seguintes), tendo-as concluído do seguinte modo:
 
  
 
 “1ª. O douto Acórdão n.° 379/04 deste Tribunal Constitucional, proferido em 
 
 1.06.04, que ordenou a reformulação do Acórdão da Relação de Coimbra de 7.01.04 
 de acordo com o(s) juízo(s) de constitucionalidade proferidos, implica que a 
 Relação declarasse a nulidade de todas as escutas telefónicas que, recolhidas ao 
 abrigo do despacho de 23.10.00, por um período inicial de sessenta dias, foram 
 prorrogadas por duas vezes, em 23.12.00 e 17.01.01, respectivamente por novos 
 períodos de trinta dias cada, sendo que todo o material assim recolhido só foi 
 ouvido pelo JIC em 30.01.01, isto é, mais de três meses após o seu início;
 
 2ª. Tal douto Acórdão transitou em julgado e passou a constituir caso julgado no 
 processo (art. 80°, n.° 1, da LTC), de cumprimento obrigatório para o Tribunal 
 da Relação (arts. 2° e 80°, n.ºs 1 a 3, do mesmo Diploma Legal e arts. 205°, 
 n.ºs 2 e 3, e 221° da CRP), mas aquele Tribunal, declarando que por dever de 
 obediência iria reformular a decisão, mas que continuava «na sua», acabou de 
 facto por continuar nela, pois, ao contrário do que a decisão do Tribunal 
 Constitucional implicava, recusou-se a declarar a nulidade de todas as escutas 
 recolhidas nos termos constantes dos autos ao abrigo de interpretação 
 inconstitucional censurada no Acórdão 379/04, e escolheu, de modo arbitrário e 
 incompreensível, as escutas recolhidas ao abrigo do despacho de fls. 53 para as 
 declarar – a essas e só a essas – nulas;
 
 3ª. Violou assim a Relação, no seu Acórdão «reformulado» de 3.11.04, a exigência 
 de submissão à decisão do TC determinada pelo art. 2° da LTC e também o disposto 
 no art. 80°, n.ºs 1 a 3, da mesma Lei, pois se recusa a adoptar a interpretação 
 da norma do art. 188°, n.° 1, do CPP, tal como ela foi feita e exigida pelo 
 Acórdão 379/04 do TC e outrossim, continua a interpretá-la e a aplicá-la contra 
 a Constituição e os princípios nela consagrados, designadamente os da 
 legalidade, da proporcionalidade, da subsidariedade e do controlo material, 
 previstos nos arts. 18°, n.° 2, 32°, n.ºs 2 e 8, 34°, n.ºs 1 e 3, 205°, n.ºs 2 e 
 
 3, 210°, n.° 1, 212°, n.° 1, 221° e 282°, n.° 3, da Constituição da República 
 Portuguesa.
 
 4ª. Nos termos da orientação fixada pelo Acórdão 340/2000 de 4.07.00 tirado pelo 
 Plenário do Tribunal Constitucional (DR de 9.11.00, II série, pág. 18.221 e 
 segs.), este Venerando Tribunal pode conhecer directamente do objecto do 
 presente recurso, por via do carácter oficioso do conhecimento da violação do 
 caso julgado (art. 494°, n.° 1, alínea i), e 495° do CPC) e do carácter 
 definitivo da competência constitucional atribuída a este Tribunal pelos arts. 
 
 210°, n.° 1, 212°, n.° 1, e 221º, todos da CRP, independentemente de apurar se 
 se verificaram ou não quaisquer dos pressupostos específicos previstos no art. 
 
 70° da Lei do Tribunal Constitucional, pois que, conforme naquele douto aresto 
 se frisou, é ele o tribunal competente para «decidir definitivamente sobre a sua 
 competência: desde logo é ele que diz (e di-lo definitivamente) se as questões 
 que sobem até ele para serem julgadas são ou não questões de constitucionalidade 
 ou de ilegalidade que se inscrevam no seu poder jurisdicional»;
 
 5ª. É pois esta faculdade que, com base nos preceitos legais atrás citados e no 
 disposto nos arts. 2° e 80°, n.ºs 1 a 3, da LTC, se pede a este Venerando 
 Tribunal seja exercida, ou seja, se declare que o Acórdão da Relação de Coimbra 
 de 3.11.04 não procedeu à reformulação do seu Acórdão de 7.01.04 em conformidade 
 com o juízo de constitucionalidade formulado no Acórdão n.° 379/04 do Tribunal 
 Constitucional, o qual implicava, em reformulação adequada, que o Tribunal a quo 
 viesse a declarar a nulidade de todas as escutas impugnadas, ou seja, as que 
 tiveram o seu início por despacho judicial de 23.10.00 e o seu término em 
 
 30.01.01, data em que pela primeira vez foram ouvidas pelo JIC;
 
 6ª. Mas, se porventura se entendesse apenas poder conhecer-se do presente 
 recurso no caso de se encontrarem verificados os pressupostos do art. 280°, n.° 
 
 1, alínea b), e n.° 5, da CRP e art. 70°, n.° 1, alíneas b) e g), da LTC, então 
 deve este Tribunal declarar a inconstitucionalidade material dos arts. 2° e 80º, 
 n.ºs 1 a 3, daquela Lei 28/82 de 15.11 por referência aos arts. 494°, alínea i), 
 
 495° e 498°, n.ºs 1 a 4, e 677° do CPC, por violação dos mesmos princípios e 
 preceitos constitucionais invocados na conclusão 3ª, na interpretação que 
 daqueles preceitos é feita pelo Acórdão da Relação de Coimbra de 3.11.04, 
 segundo o qual a interpretação da norma do art. 188°, n.° 1, do CPP efectuada 
 pelo TC no seu Acórdão n.° 379/04 é compatível com a declaração de nulidade 
 apenas das escutas recolhidas ao abrigo do despacho de fls. 53 e já não de todas 
 as outras recolhidas antes e posteriormente à data da prolação de tal despacho 
 
 (e) ou seja declarada a inconstitucionalidade material do art. 188°, n.° 1, do 
 CPP, por violação dos princípios constitucionais da legalidade, da 
 proporcionalidade e da subsidariedade, consagrados nos arts. 32°, n.° 8, 34°, 
 n.ºs 1 e 4, e 18°, n.° 2, todos da CRP, na interpretação concreta que dela faz 
 agora o Acórdão da Relação de 3.11.04, ou seja, de que tal norma possa permitir 
 fundamentar a validade das escutas telefónicas recolhidas com base no despacho 
 de 23.10.00 e ouvidas pelo JIC em 30.01.01, com excepção das que foram ordenadas 
 pelo despacho daquela Magistrada de fls. 53.
 
 [...].”.
 
  
 
  
 
 5.         O representante do Ministério Público junto do Tribunal 
 Constitucional produziu as contra-alegações de fls. 480 e seguintes, que 
 concluiu assim:
 
  
 
 “[...]
 
 1º - Face ao anteriormente decidido pelo Tribunal Constitucional, a decisão 
 recorrida deve ser reformulada no sentido da nulidade das escutas abranger as 
 que foram realizadas ao abrigo do despacho judicial de 23/10/200[0], por 60 
 dias, sendo prorrogadas por novos períodos ainda que de menor duração, sem que 
 previamente o juiz de instrução tome conhecimento do conteúdo das conversações 
 e, bem assim, as que entre o seu início e a primeira audição das gravações 
 registem um intervalo temporal superior a três meses.
 
 2º - Termos em que apenas parcialmente deverá o recurso proceder.
 
 [...].”.
 
  
 
  
 
             Tendo sido determinada pelo Presidente do Tribunal Constitucional a 
 intervenção do plenário, nos termos do artigo 79º-A, n.ºs 1 e 2, primeira parte, 
 da LTC, cumpre apreciar e decidir.
 
  
 
  
 II
 
  
 
  
 
 6.         O presente recurso foi interposto ao abrigo dos artigos 2º e 80º, n.º 
 s 1 a 3, da Lei do Tribunal Constitucional, na parte em que o respectivo 
 fundamento consiste na violação de caso julgado constitucional (aqui constituído 
 pelo acórdão n.º 379/2004, proferido nestes autos). 
 
  
 
             Subsidiariamente, o recorrente interpôs o recurso ao abrigo das 
 alíneas b) e g) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, pois 
 que, em seu entender, o tribunal recorrido teria perfilhado uma interpretação 
 inconstitucional do artigo 188º, n.º 1, do Código de Processo Penal, já 
 censurada pelo Tribunal Constitucional (precisamente, no seu acórdão n.º 
 
 379/2004).
 
             Não se vê obstáculo a que, na esteira do decidido no acórdão do 
 Tribunal Constitucional n.º 340/00, de 4 de Julho (publicado no Diário da 
 República, II Série, n.º 259, de 9 de Setembro de 2000, p. 18221 ss), o Tribunal 
 Constitucional conheça do eventual incumprimento do seu acórdão n.º 379/2004, 
 independentemente do preenchimento dos pressupostos específicos das invocadas 
 alíneas b) ou g) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional: na 
 verdade, não só o Tribunal Constitucional é o tribunal competente para decidir 
 definitivamente sobre a sua própria competência, como é de conhecimento oficioso 
 a violação de caso julgado.
 
  
 
  
 
 7.         Relativamente ao primeiro juízo de inconstitucionalidade formulado no 
 acórdão do Tribunal Constitucional n.º 379/2004, verifica-se que o tribunal 
 recorrido lhe deu acolhimento, pois que declarou nulas as escutas efectuadas ao 
 abrigo do despacho de fls. 53, isto é, ao abrigo do despacho que prorrogou as 
 escutas telefónicas por 30 dias, sem que o juiz tivesse tomado conhecimento 
 prévio do conteúdo das escutas anteriormente efectuadas. 
 
  
 
             Recorde-se que o Tribunal Constitucional censurara a norma constante 
 do artigo 188º, n.º 1, do Código de Processo Penal, quando interpretada no 
 sentido de “uma intercepção telefónica, inicialmente autorizada por 60 dias, 
 poder continuar a processar-se, sendo prorrogada por novos períodos, ainda que 
 de menor duração, sem que previamente o juiz de instrução tome conhecimento do 
 conteúdo das conversações”.
 
  
 
             Neste particular, portanto, nenhuma violação de caso julgado 
 constitucional se regista. 
 
             Nem o recorrente, aliás, parece invocar a violação de caso julgado 
 em relação a tal juízo de inconstitucionalidade, pois que se insurge apenas em 
 relação à não declaração de nulidade “de todas as escutas impugnadas, ou seja, 
 as que tiveram o seu início por despacho judicial de 23.10.00 e o seu término em 
 
 30.01.01” (cfr. conclusão 5ª das alegações, supra, 4.).
 
  
 
  
 
 8.         Já quanto ao segundo juízo de inconstitucionalidade, a conclusão terá 
 de ser diferente.
 
  
 
             No acórdão n.º 379/2004, o Tribunal Constitucional censurou a norma 
 constante do artigo 188º, n.º 1, do Código de Processo Penal, na interpretação 
 segundo a qual “a primeira audição, pelo juiz de instrução criminal, das 
 gravações efectuadas pode ocorrer mais de três meses após o início da 
 intercepção e gravação das comunicações telefónicas”.
 
  
 
             A execução de qualquer acórdão proferido pelo Tribunal 
 Constitucional implica o reexercício do poder jurisdicional pelo tribunal a quo 
 em conformidade com o que, sobre a compatibilidade constitucional da norma 
 aplicável, tenha sido definido no processo pelo próprio Tribunal Constitucional.
 
  
 
             No caso concreto dos autos, a reformulação da decisão então 
 recorrida, determinada pelo juízo de inconstitucionalidade constante do acórdão 
 n.º 379/2004, exigiria antes de mais que o Tribunal da Relação de Coimbra 
 verificasse se existem no processo escutas telefónicas abrangidas pela 
 interpretação normativa censurada por este Tribunal, isto é, escutas telefónicas 
 relativamente às quais a primeira audição, pelo juiz de instrução criminal, 
 tivesse ocorrido mais de três meses após o início da respectiva intercepção e 
 gravação (ordenada pelo despacho de 23/10/2000, que consta de fls. 48 e seguinte 
 destes autos). E exigiria depois, quanto às eventuais escutas que 
 correspondessem a tais circunstâncias, que a Relação de Coimbra definisse se, e 
 em que termos, poderiam ser consideradas como meio de obtenção de prova no 
 presente processo, tendo em conta o julgamento de inconstitucionalidade 
 proferido pelo Tribunal Constitucional.
 
  
 
             Ora, não decorre dos próprios termos do acórdão recorrido que o 
 Tribunal da Relação de Coimbra tenha dado cumprimento, nesta parte, ao acórdão 
 do Tribunal Constitucional.
 
  
 
             Saber se existem ou não no processo escutas telefónicas que 
 correspondam às circunstâncias censuradas nesse acórdão é algo – repete-se – que 
 só ao tribunal recorrido compete decidir e que obviamente não cabe ao Tribunal 
 Constitucional apurar.
 
  
 
             O que não pode é o tribunal recorrido invocar a circunstância de não 
 ser possível descortinar, “pelo exame dos autos, quando se iniciou a intercepção 
 e gravação das comunicações telefónicas, ordenada a 23/10/2000 e cujo resultado 
 foi constatado a 30/01/01”, para, sem quaisquer outras considerações, concluir 
 que a sua anterior decisão em nada é afectada pelo julgamento do Tribunal 
 Constitucional.
 
  
 
             Não resultando do acórdão recorrido que o Tribunal da Relação de 
 Coimbra tenha cumprido integralmente o julgamento constante do acórdão do 
 Tribunal Constitucional n.º 379/2004, tem de proceder o presente recurso.
 
  
 
  
 
 9.         Atingida esta conclusão, torna-se desnecessário apreciar o recurso 
 interposto a título subsidiário pelo recorrente. 
 
  
 
  
 III
 
  
 
  
 
 10.       Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, concede-se provimento ao 
 presente recurso, revogando-se o acórdão recorrido, na parte impugnada.
 
  
 
  
 Lisboa, 27 de Abril de 2005
 
  
 Maria Helena Brito
 Paulo Mota Pinto
 Maria João Antunes
 Maria Fernanda Palma
 Mário José de Araújo Torres
 Vítor Gomes
 Benjamim Rodrigues
 Rui Manuel Moura Ramos
 Gil Galvão
 Bravo Serra
 Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
 Carlos Pamplona de Oliveira – vencido conforme declaração que junto.
 Artur Maurício
 
  
 
  
 
  
 DECLARAÇÃO DE VOTO
 
  
 Discordo, em primeiro lugar, da decisão que fez vencimento por entender que é 
 taxativa a enumeração (constante do n.1 do artigo 70º da LTC) dos casos em que, 
 nos processos de fiscalização concreta, é possível o recurso para o Tribunal 
 Constitucional. É, portanto, totalmente inadmissível o recurso especial que, com 
 fundamento nos artigos 2º e 80º ns. 1 a 3 da mesma Lei, foi apreciado pelo 
 Tribunal. Aliás, os recursos previstos no aludido n.º 1 do artigo 70º da LTC, 
 designadamente os constantes nas alíneas b) e g) permitem ao Tribunal, na medida 
 do desejável, apurar da conformidade da decisão reformada com o anterior 
 julgamento de inconstitucionalidade.
 Discordo, ainda, quanto ao mérito da decisão. Na verdade, a reforma da decisão 
 recorrida não obriga, no presente caso – em meu entender não poderá mesmo 
 obrigar em qualquer circunstância –, a Relação de Coimbra a verificar 'se 
 existem no processo escutas telefónicas [...] relativamente às quais a primeira 
 audição pelo juiz de instrução criminal tivesse ocorrido mais de três meses após 
 o início da respectiva intercepção e gravação.' O que, também em meu entender, o 
 julgamento do Tribunal Constitucional exige é, apenas, que se reforme a decisão 
 recorrida na parte em que, com fundamento na norma julgada inconstitucional, 
 validou provas obtidas daquelas escutas. O que é bem diferente. 
 
  
 Pamplona de Oliveira