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Processo n.º 797/04
 
 1.ª Secção
 Relatora: Conselheira Maria João Antunes
 
  
 
  
 
  
 
                                     Acordam na 1.ª secção do Tribunal 
 Constitucional
 
  
 
  
 
  
 I. Relatório
 
 1. Nos presentes autos de recurso, interposto ao abrigo do disposto no artigo 
 
 70º, nº 1, alínea b), da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do 
 Tribunal Constitucional (LTC), em que é recorrente A. e recorrida a Fazenda 
 Pública, pretende o recorrente seja apreciada pelo Tribunal Constitucional a 
 inconstitucionalidade da norma contida no artigo 53º, nº 5, do Código do Imposto 
 sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS), aprovado pelo Decreto-Lei nº 
 
 442-A/88, de 30 de Novembro. Sustenta que esta viola os artigos 103º e 104º da 
 Constituição da República Portuguesa (CRP) e põe em causa os princípios 
 constitucionais da igualdade, da progressividade, da justiça, da generalidade, 
 da capacidade contributiva, da tributação pelo rendimento líquido e ainda o 
 princípio da segurança jurídica na modalidade da tutela da confiança.
 
  
 
 2. O ora recorrente impugnou junto do Tribunal Tributário de 1ª Instância de 
 Lisboa o acto de liquidação de Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares 
 
 (IRS), sustentando desde logo a inconstitucionalidade do referido normativo. 
 Naquele Tribunal foi proferida sentença que julgou totalmente improcedente a 
 impugnação, confirmando o acto administrativo-tributário objecto do processo. 
 Interposto recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, em cujas alegações é 
 reiterado o juízo de inconstitucionalidade, veio este Superior Tribunal a negar 
 provimento ao mesmo, por acórdão de 8 de Junho de 2004, no qual, para além do 
 mais, concluiu pela conformidade do preceito à Constituição.
 
  No que concerne à questão de constitucionalidade, é o seguinte o teor da 
 decisão recorrida (lavrada por remissão para anterior acórdão do Supremo 
 Tribunal Administrativo):
 
  
 
 “Quanto ao artigo 53° do CIRS, que é a norma acusada de inconstitucionalidade 
 material, dispunha, originariamente (tinha, então, o número 51º), que «as 
 pensões de valor anual igual ou inferior a 400.000$00 são deduzidas pela 
 totalidade do seu quantitativo»; e que «a dedução relativa às pensões de valor 
 anual superior ao referido (...) é igual àquele montante acrescido de metade da 
 parte que o excede, até ao montante de 1.000.000$00».
 Sucessivas alterações foram sendo introduzidas na norma ao longo do tempo, até 
 se chegar à versão que aqui nos importa, dispondo o n° 5 do artigo que «para 
 rendimentos anuais, por titular, de valor anual superior ao vencimento base 
 anualizado do cargo de primeiro-ministro, a dedução é igual ao valor referido 
 nos nºs 1 ou 3 , consoante os casos, abatido, até à sua concorrência, da parte 
 que excede aquele vencimento».
 Assim, por força desta norma, e porque o agregado do recorrente obteve, em 2001, 
 um rendimento proveniente de pensões no montante de 104.155,77 €, a dedução 
 específica se quedou em 383,77€.
 Ora, diz o recorrente, a dedução assim limitada (ou, até, em certos e 
 hipotéticos casos, excluída), aos rendimentos provenientes de pensões, contradiz 
 o n° 1 do artigo 53° (que manda deduzir a totalidade dos rendimentos com esta 
 origem, até certo montante destas ), provoca uma desigualdade fiscal horizontal, 
 tornando incoerente o sistema, e violando os princípios já apontados, além do da 
 segurança jurídica, na modalidade do princípio da confiança.
 O recorrente exprobra a sentença impugnada por não ter apreciado a 
 compatibilidade do nº 5 do artigo 53°do CIRS com aqueles princípios 
 constitucionais.
 Mas parece evidente, pelo teor das suas alegações, que a não pretende acusar de 
 nulidade por omissão de pronúncia, querendo, antes, apontar-lhe erro de 
 julgamento, ao não ter reconhecido no acto impugnado os vícios de violação de 
 lei que lhe assaca.
 Na verdade, a sentença não deixou de apreciar, e com detalhe, todas as questões 
 que o impugnante havia submetido ao Tribunal. E, a nosso ver, fê-lo de forma 
 convincente, argumentando de modo a contrariar, eficientemente, as teses 
 defendidas pelo recorrente. Não desdenhamos, por isso, aderir ao que em tal 
 sentença se escreveu.
 Não obstante, cuidaremos de analisar, destacadamente, os argumentos do 
 recorrente, procurando apreciá-los face a cada um dos princípios constitucionais 
 cujo atropelo é invocado, sendo certo que tal não poderá cumprir-se 
 integralmente, já que esses princípios, alguns deles emanação de outros, ou seu 
 desdobramento, ou meros corolários deles, nem sempre são separadamente 
 consideráveis, e as razões que valem para um coincidem com as que aproveitam a 
 outro.
 
 3.2. Sabe-se que os rendimentos auferidos a título de pensões não eram, antes do 
 CIRS, tributados em qualquer cédula parcelar, relevando, só, em sede de imposto 
 complementar.
 Essa, reconhecidamente, a razão por que o legislador do CIRS se preocupou com 
 aligeirar o impacto da tributação que pela primeira vez introduzia, 
 estabelecendo um regime próprio, favorável, de dedução específica para os 
 rendimentos oriundos de pensões.
 Assim, na versão original do CIRS, os rendimentos do trabalho dependente, por 
 exemplo, gozavam de uma dedução específica de 65% do seu valor, com o limite de 
 
 250.000$00, ou com o limite das contribuições obrigatórias para a protecção 
 social, se superior. Enquanto que aos rendimentos oriundos de pensões, se não 
 superiores a 400.000$00, deduzia-se a totalidade, e aos superiores a esse 
 montante eram deduzidos os mesmos 400.000$00, mas acrescidos de metade do 
 excedente, com o limite de 1.000.000$00.
 Porém, este tratamento benevolente dado aos rendimentos provenientes de pensões 
 não correspondia a qualquer imperativo constitucional, que exigisse ao 
 legislador ordinário o emprego de mais suaves maneiras face a rendimentos com 
 aquela origem, do que as usadas perante rendimentos de outra qualquer fonte.
 Tratou-se, apenas, de uma opção do legislador ordinário, visando, como se disse 
 já, reduzir o sobressalto resultante da introdução da tributação sobe 
 rendimentos com esta origem.
 Ora, se a especial atenção que ao legislador de 1988 mereceram os rendimentos 
 provenientes de pensões, no tocante à dedução específica, não é o resultado de 
 algum ditame constitucional, também não é a Constituição que obsta a que o 
 legislador ordinário adopte, adiante, opções diferentes, designadamente, 
 deixando de dar àqueles rendimentos tratamento preferencial, designadamente, no 
 que concerne à dedução específica a atender .
 
 3.3. As deduções específicas, como a própria designação aponta, são consagradas 
 pelo legislador tendo em atenção a sua afinidade com o rendimento a que 
 correspondem.
 Dito de outro modo, através da dedução específica visa-se considerar, 
 excluindoas da tributação, as despesas que, ao menos presumivelmente, o titular 
 do rendimento se viu obrigado a fazer para o obter.
 Assim se concretiza o princípio do rendimento líquido, que manda tributar, não 
 todo o rendimento, mas só aquele que resta depois de satisfeitos os encargos 
 indispensáveis para o conseguir .
 Mas, precisamente para que se respeite o princípio do rendimento líquido, não há 
 que        estabelecer deduções específicas iguais para todos os rendimentos, 
 independentemente da sua origem, pois não são necessariamente equivalentes as 
 despesas a fazer para os angariar. [Idealmente, a dedução específica deve 
 coincidir com as despesas que o sujeito passivo comprove,        e só assim não  
 será pela difícil praticabilidade de uma tal solução]. Por exemplo, a regra é 
 que os trabalhadores por conta de outrem suportem menos encargos para obter o 
 rendimento do seu trabalho do que os trabalhadores por conta própria, pois no 
 caso daqueles grande parte dos gastos será feita pela entidade empregadora, 
 enquanto que os trabalhadores independentes os suportarão sozinhos. Por isso, 
 tem-se entendido que a dedução específica, no caso dos rendimentos do trabalho 
 por conta própria, merece ser superior à que está fixada para os rendimentos 
 provenientes do trabalho assalariado, o que não ofende nenhum princípio 
 constitucional.
 Ora, no caso dos rendimentos provenientes de pensões, não se vislumbra a que 
 despesas dê, necessariamente, lugar a sua obtenção. Ao menos, essas despesas, a
 existirem, sempre serão diminutas, face àquelas que há que fazer para granjear 
 rendimentos da maioria das categorias sobre que incide o IRS.
 Nesta perspectiva, bem pode dizer-se que a consagração de uma dedução específica 
 atinente aos rendimentos com origem em pensões é, antes, um tratamento 
 favorável, relativamente aos rendimentos de categorias que importem custos. Por 
 exemplo, relativamente à dedução admitida aos rendimentos do trabalho por conta 
 de outrem, a qual, sendo fixa, é, essa sim, susceptível de «gerar situações de 
 desigualdade fiscal horizontal», como nota ANDRÉ SALGADO DE MATOS, a pág. 254 do 
 CÓDIGO DO IMPOSTO DO RENDIMENTO DAS PESSOAS SINGULARES (IRS) ANOTADO, citando 
 SALDANHA SANCHES, MANUAL DE DIREITO FISCAL, págs. 207-208.
 Nem haverá impedimento constitucional a que se tribute o rendimento bruto, 
 quando este coincide com o líquido, isto é, nos casos em que a sua obtenção não 
 implicou a realização de qualquer despesa.
 Razão porque não é o princípio do rendimento líquido a impedir que o legislador 
 ordinário estabeleça, relativamente aos rendimentos com esta origem, um regime 
 de dedução específica diferente, porventura, quantitativamente menos favorável 
 do que o adoptado para rendimentos de outras fontes.
 
 3.4. Também o princípio da igualdade não é beliscado por uma opção legislativa 
 que atenda a deduções específicas diferentes, consoante a origem dos 
 rendimentos.
 Numa formulação sintética, pode dizer-se que este princípio impõe que se 
 sujeitem a igual imposto todos aqueles que tenham igual capacidade contributiva.
 
 É intuitivo, e vem sendo repetido até à exaustão, pela doutrina e pela 
 jurisprudência, que o princípio da igualdade implica que se dê tratamento 
 desigual àquilo que não é igual. A desigualdade de tratamento deve, porém, ter 
 um fundamento material, não podendo surgir sem razão, ou arbitrariamente; e 
 devem ser tratados de igual modo todos aqueles relativamente a quem valha esse 
 fundamento.
 o princípio da igualdade concretiza-se na generalidade do imposto, ou seja, no 
 seu carácter universal, e na uniformidade do critério legal.
 O critério para aferir da igualdade é, naturalmente, o da capacidade 
 contributiva, medida pelo rendimento auferido, depois de subtraída a despesa 
 necessária para o conseguir, com o que se chega ao rendimento líquido. Em 
 sentido estrito, nisto se esgota o princípio do rendimento líquido. Mas o mesmo 
 princípio, em sentido alargado, impõe, ainda, que se tribute só o rendimento 
 disponível, isto é, que ao rendimento líquido, apurado do modo que se disse, se 
 retirem os encargos de subsistência do agregado familiar, ou seja, as despesas 
 indispensáveis para proporcionar um nível de vida compatível com a dignidade da 
 pessoa humana.
 Na verdade, a capacidade para contribuir para as necessidades financeiras 
 colectivas só começa a partir do mínimo de subsistência, que deve ser excluído 
 de toda a tributação.
 Mas, para alcançar este resultado - a salvaguarda do mínimo de subsistência 
 digna -, a dedução específica não é o único meio. Claramente, contribuem também 
 para o atingir, além de outros, as demais deduções e abatimentos, e as taxas do 
 imposto.
 Aliás, o princípio da capacidade contributiva, no sentido estrito que se 
 apontou, isto e, encarado só como exigência de subtracção à matéria colectáve1 
 das despesas indispensáveis para o alcançar, é indiferente a esta questão, só o 
 não sendo naquela concepção lata, que impõe a extracção do mínimo de 
 subsistência.
 Ora, a partir de um montante de rendimentos que, entre nós, no tempo e modo que 
 vivemos, é, patentemente, muito superior à média do que auferem a maioria dos 
 agregados familiares, aferindo-se, de resto, pelo vencimento anualizado 
 atribuído a um dos cargos cimeiros do Estado, a consideração de uma dedução 
 específica mais reduzida do que a atendida em outros casos, não fere o princípio 
 da capacidade contributiva, ou o do rendimento líquido, pois não é susceptível 
 de deixar o sujeito passivo desprovido do necessário à sua subsistência e do seu 
 agregado familiar. Face a rendimentos de montante relativamente elevado, não 
 haverá, constitucionalmente que acautelar o mínimo de subsistência, através da 
 dedução específica, pois esse mínimo continua garantido pela abundância dos 
 rendimentos sobejantes, mesmo depois de tributados pela sua totalidade.
 Nem ofende o princípio da igualdade, ou o da justiça, a circunstância de 
 rendimentos de igual montante, se resultantes do trabalho, beneficiarem de 
 dedução específica superior: como se viu, não há igualdade entre os gastos 
 suportados por um trabalhador no activo para obter os seus ganhos e os que se 
 impõem a um pensionista para auferir a sua pensão.
 Quanto ao princípio da generalidade, é de observar, como se faz na sentença 
 recorria, que a norma em apreço se aplica a «todos aqueles que se integram no 
 tabstand da norma», e que «não é por se aplicar apenas a uma determinada 
 universalidade, cuidando de regular juridicamente um subconjunto de sujeitos, 
 que a norma perde os requisitos da generalidade e da abstracção».
 Nem ele seria ofendido só porque, como afirma o recorrente, será fiscalmente 
 
 «mais gravoso ser reformado do que estar no activo», uma vez que a todos os que 
 auferem rendimentos de pensões a norma se aplica. Para além do que o gravame a 
 que se refere o recorrente fica por demonstrar .
 
 3.5. O princípio da progressividade é, como se disse, uma concretização do 
 princípio da igualdade, que se extrai, desde logo, do artigo 106° nº1 da 
 Constituição. Visando uma repartição justa do rendimento, não é, também, 
 afectado pela magnitude da dimensão específica atendida quanto a um rendimento 
 parcelar ou, no limite, pela sua eliminação.
 Em sede de rendimentos pessoais, como é o caso daqueles que alveja o IRS, a 
 progressividade só pode aferir-se em vista da carga fiscal que, no conjunto, 
 incide sobre todo o rendimento do agregado familiar.
 No nosso caso, o que está em jogo é, apenas, o rendimento proveniente de 
 pensões. Não é o modo como o rendimento desta origem é isoladamente tratado que 
 pode, só por si, afectar o princípio da proporcionalidade.
 Acresce que este princípio se realiza tributando mais pesadamente os rendimentos 
 relativamente elevados, e mais levemente os relativamente baixos, Nesta medida, 
 
 é de reconhecer que o nº5 do artigo 53° do CIRS, isoladamente considerado, em 
 lugar de contrariar a progressividade, persegue-a.
 
 3.6. Entre ao disposições dos artigos 1° e 53° nº 5 do CIRS, aponta o recorrente 
 uma contradição: enquanto que o artigo 1° estabelece que a tributação incide 
 sobre o rendimento líquido, e não sobre o bruto, o nº5 do artigo 53° reduz 
 progressivamente a dedução específica, podendo, mesmo, bani-la de todo.
 Aqui vislumbra o recorrente uma violação do princípio da coerência do sistema
 fiscal.
 Mais do que um princípio autónomo, aquilo que a doutrina designa por «princípio 
 da coerência do sistema» constitui um mero índice de violação de outro 
 princípio.
 De todo o modo, o princípio da coerência refere-se a um universo normativo mais 
 alargado, dificilmente se podendo dizer que é ofendido de toda a vez que duas 
 normas inseridas no mesmo diploma legal aparentam dirigir-se, cada uma, em 
 sentido diverso do da outra.
 Os objectivos do legislador atingem-se, algumas vezes, através da consagração de 
 dispositivos de sinal aparentemente contrário, ou porque um deles limita o 
 outro, ou porque cada um visa situações e resultados diferentes, ou porque um 
 excepciona o outro. A coerência que importa preservar é a do conjunto, de pouco 
 servindo o cotejo norma a norma com cada uma das suas conviventes.
 Ora, o que o recorrente faz não é imputar uma incoerência ao sistema, mas, 
 apenas, afirmar que o conteúdo de uma norma não parece percorrer o mesmo caminho 
 que o teor de outra aponta.
 Mas não existe, entre aqueles artigos 1° e 53° nº 5, qualquer contradição: o 
 artigo 1º limita-se a estabelecer que o IRS incide sobre o valor dos rendimentos 
 das várias categorias que indica, «depois de efectuadas as correspondentes 
 deduções e abatimentos» .
 Deste modo, quando, nos artigos seguintes, o mesmo legislador fixa as deduções e 
 abatimentos para cada uma daquelas categorias, não está a contradizer o que 
 dispôs no artigo 1°, mas a concretizá-lo.
 
 3.7. No expressivo dizer de CASALTA NABAIS, a pág. 145 da 2ª edição do seu 
 DIREITO FISCAL, só merece tutela a confiança «legítima, fundada e solidificada» 
 dos contribuintes. Vem isto a propósito da pretensa violação do princípio da 
 segurança jurídica, na vertente do princípio da confiança, que o recorrente 
 afirma resultar da introdução no texto da lei do nº5 do artigo 53° do CIRS.
 Face às intenções manifestadas pelo legislador do CIRS, apregoadas no preâmbulo 
 do diploma, diz o recorrente, não podia contar senão com um tratamento mais 
 favorável para as pensões. A introdução daquele nº 5, aliás, sem qualquer 
 justificação material, afectou em acentuada medida a confiança por si depositada 
 
 «na continuidade de uma relação jurídica constituída».
 Ora, por um lado, as intenções do legislador, manifestadas na parte preambular 
 de um diploma, não assumem força igual à da normatividade nele contida. O que 
 significa que não é o preâmbulo do CIRS terreno firme o bastante para que nele 
 possa ancorar-se uma confiança «legítima, fundada e solidificada» em que, no 
 futuro, não haverá alteração do normativo que regula uma dada situação.
 Para que exista violação do princípio da confiança é preciso que o legislador 
 tenha regulado as coisas de tal modo que levou os particulares a dispor de certo 
 modo as suas vidas, alterando depois, sem razão estrénua, a disciplina que 
 primeiro consagrara, traindo a confiança dos cidadãos (por si criada), que 
 razoavelmente contavam com uma certa longevidade do regime consagrado, e assim 
 viram destruídas as suas expectativas. Não há, nas normas que inicialmente 
 integravam o CIRS, nada que faça seriamente crer que o regime da dedução 
 específica em causa iria manter-se ao longo de todo o tempo. A própria novidade 
 do CIRS valeria, para um contribuinte avisado, como índice do contrário, sabido 
 como é que as leis novas são sujeitas a testes, acontecendo, com frequência, 
 que, ou porque se revelem ineficazes, ou inconvenientes, ou, até, por produzirem 
 efeitos perversos, são alteradas - sem falar nas mudanças que o decurso do 
 tempo, a alteração das circunstâncias, a melhor ponderação das coisas, ou as 
 diferentes opções do legislador, vêem a provocar .
 Tudo para dizer que se não vê que o legislador de 1988 haja criado alguma 
 expectativa que tenha traído com a introdução do nº 5 do artigo 53° do CIRS, 
 sendo certo que não basta, para que haja violação do princípio da confiança, a 
 mera crença, desenraizada, na imutabilidade das leis que vigoram num dado 
 momento histórico.
 O que aconteceu foi, apenas, que «o legislador ordinário usou, de forma que não 
 se pode considerar intolerável, a sua liberdade de conformação», conforme 
 observa o Exmº. Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal, no douto parecer 
 que emitiu.
 Improcedem, pelo exposto, todas as conclusões das alegações de recurso, não se 
 tendo por verificada a inconstitucionalidade material imputada pelo recorrente à 
 norma aplicada pelo acto tributário de liquidação cuja impugnação judicial a 
 sentença recorrida julgou improcedente.”
 
  
 
 3. Foi então interposto recurso para o Tribunal Constitucional, admitido por 
 despacho de 30 de Junho de 2004. Notificado para produzir alegações, o 
 recorrente reproduziu, no que agora releva, as considerações anteriormente 
 expendidas, sustentando a inconstitucionalidade do preceito. É o seguinte o teor 
 das conclusões de tais alegações:
 
  
 
 “(...)
 
 ·                    Com a entrada em vigor do Código do IRS, o Legislador criou 
 uma discriminação qualitativa entre alguns tipos de rendimentos, entre eles os 
 rendimentos da Categoria A e da Categoria H;
 
 ·                    Pretendendo o Legislador, à data, tributar de uma forma 
 mais favorável os rendimentos derivados de pensões;
 
 ·                    Tal foi claramente manifestado pelo legislador no preâmbulo 
 do decreto-lei que aprovou o Código do IRS, bem como no artigo 51.º do Código do 
 IRS na redacção que perdurou de 1989 a 1994.
 
 ·                    Contudo, apesar dessa ser a intenção do legislador, a 
 verdade é que, pela introdução do n.º 5 do artigo 53.º do Código do IRS, alguns 
 rendimentos de pensões, os abrangidos por esta norma, passaram a ser tributadas 
 de uma forma mais gravosa do que aquela que teria sido as expectativas criadas 
 aos pensionistas, bem como ao ora recorrente.
 
 ·                    Desta forma, viola-se alguns dos mais elementares 
 princípios constitucionais do direito fiscal:
 
 ·                    Assim, é violado o princípio da progressividade do Código 
 do IRS, uma vez que a progressividade deve ser atingida através de taxas 
 progressivas e não pela eliminação da dedução específica;
 
 ·                    É violado o princípio da capacidade contributiva, já que 
 com a eliminação/redução da dedução específica deixa de se ter em conta, o 
 mínimo de encargos necessários à obtenção dos rendimentos do sujeito passivo. 
 Porquê é que não se passa o mesmo na Categoria A e B?
 
 ·                    É, ainda, violado o princípio da igualdade, uma vez que um 
 sujeito passivo com igual capacidade contributiva no activo e na reforma, têm 
 uma tributação completamente diferente, sendo tributado mais gravosamente na 
 reforma que no activo, quando era precisamente o contrário que o legislador 
 pretendia;
 
 ·                    Mais, viola-se o princípio da tributação pelo rendimento 
 líquido, uma vez que nos casos em que existe uma eliminação, ou mesmo nos que 
 existe apenas uma redução, da dedução específica, a taxa incide directamente 
 sobre o rendimento bruto, tal não foi a intenção do legislador;
 
 ·                    O único caso em que essa foi a intenção do legislador foi 
 os rendimentos de capitais, o que se compreende dada a natureza dos mesmos, mas 
 por esse facto, para a maioria desses rendimentos o legislador criou taxas de 
 tributação liberatórias, que nunca, por nunca ser, atingem os 40%;
 
 ·                    Contudo, um pensionista que pare de ter direito à dedução 
 específica, por aplicação do n.º 5 do artigo 53.º do Código do IRS, vê os seus 
 rendimentos serem sujeitos a uma taxa de tributação de 40%. Onde é que está a 
 discriminação qualitativa que o legislador quis criar para esta categoria de 
 rendimentos?;
 
 ·                    Onde é que está o tratamento preferencial que o legislador 
 pretendeu dar a esta categoria?
 
 ·                    Mas mais, esta norma cria uma incoerência no sistema fiscal 
 português, uma vez que o artigo l.º do Código do IRS, dispõe que os rendimentos 
 sejam sujeitos à taxa depois de se proceder à dedução específica e, o n.º 5 do 
 artigo 53.º do Código do IRS, dispõe que se aplique a taxa sem que primeiro se 
 proceda à realização da dedução específica, sem que qualquer razão objectiva 
 esteja subjacente a este normativo: 
 
 ·                    Para finalizar, o n.º 5 do artigo 53.º do Código do IRS, 
 viola o princípio da segurança jurídica na modalidade do princípio da confiança:
 
 ·                    Ora, foi criada a convicção ao Recorrente, e aos 
 pensionistas em geral, que aquando da reforma ficariam sujeitos a um regime de 
 tributação mais favorável do que aquele a que se encontravam sujeitos, enquanto 
 sujeitos passivos enquadrados na Categoria A;
 
 ·                    Diga-se, expectativa essa, criada pelo próprio legislador – 
 quer no preâmbulo do decreto-lei que aprovou o Código do IRS quer no próprio 
 artigo 51.º do Código do IRS na sua versão de 1989 até 1994, pelo que 
 consubstancia um direito adquirido ou a aquisição de um verdadeiro direito 
 subjectivo público, oponível ao próprio legislador, que se encontra assim 
 assente no Estado de direito democrático;
 
 ·        Face ao exposto, concluí-se que a norma em apreço viola os mais 
 elementares princípios de direito fiscal constitucional, sendo por isso 
 materialmente inconstitucional”.
 
  
 
 4. A recorrida Fazenda Pública não contra-alegou.
 
  
 Dispensados os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
 
  
 II. Fundamentação
 
 5. O presente recurso, interposto ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º 
 da LTC, tem por objecto a apreciação da inconstitucionalidade do artigo 53º, nº 
 
 5, do CIRS.
 Esta questão não é nova na jurisprudência do Tribunal Constitucional que, 
 recentemente, nos seus Acórdãos nº 173/05 e 178/05 (ainda inéditos), teve 
 oportunidade de com ela se confrontar, tendo decidido, em ambos os arestos, não 
 julgar inconstitucional a norma do nº 5 do artigo 53º do Código do Imposto sobre 
 o Rendimento das Pessoas Singulares, aprovado pelo Decreto-Lei nº 442-A/88, de 
 
 30 de Novembro.
 
   
 
 6. A decisão do Tribunal Constitucional (Acórdão nº 178/05) fundou-se na 
 argumentação seguinte:
 
  
 
 “(...) 7. Nas conclusões das alegações, começa o recorrente por censurar à norma 
 sub judice a violação do princípio da progressividade – a que alude o n.º 1 do 
 artigo 104º da Constituição –, pois que, na sua perspectiva, ‘a progressividade 
 deve ser atingida através de taxas progressivas e não pela eliminação da dedução 
 específica’.
 Trata-se de argumento improcedente. 
 Em primeiro lugar, e como é óbvio, o princípio da progressividade do imposto 
 sobre o rendimento pessoal não impõe que, na determinação do rendimento 
 colectável, se considere uma concreta dedução específica. Dito de outro modo: da 
 progressividade do imposto consagrada no n.º 1 do artigo 104º da Constituição (e 
 que, em síntese, exige a tributação com taxas progressivas, embora o texto 
 constitucional seja pouco claro quanto ao nível de progressividade a ter em 
 conta: cfr. J. L. Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, Lisboa, Lex, 1998, 
 p. 145-147) nada se retira acerca dos montantes que deverão ser deduzidos ao 
 rendimento bruto para efeitos da determinação do rendimento colectável. 
 Na medida em que a exclusão ou redução da dedução a que porventura conduza a 
 aplicação do artigo 53º, n.º 5, do CIRS não convoca a aplicação do princípio da 
 progressividade, não pode naturalmente de tal norma resultar qualquer violação 
 desse princípio.
 Em segundo lugar, esta norma não regula as taxas do imposto. Assim sendo, é 
 evidente que não faz sentido defender, como faz o recorrente, que ela viola o 
 princípio da progressividade, pois que ‘a progressividade deve ser atingida 
 através de taxas progressivas’.
 
 8. Considera ainda o recorrente que a norma do artigo 53º, n.º 5, do CIRS viola 
 o princípio da capacidade contributiva. 
 De harmonia com o princípio da capacidade contributiva, ‘um sistema fiscal é 
 justo se a repartição dos impostos pelos cidadãos for feita de acordo com a sua 
 capacidade económica, independentemente do grau de satisfação que cada um possa 
 retirar da fruição dos bens e serviços públicos’ (cfr. J. Albano Santos, Teoria 
 Fiscal, Universidade Técnica de Lisboa – Instituto Superior de Ciências Sociais 
 e Políticas, 2003, p. 405). 
 No entender do recorrente, tal princípio seria violado ‘já que com a 
 eliminação/redução da dedução específica deixa de se ter em conta o mínimo de 
 encargos necessários à obtenção dos rendimentos do sujeito passivo’.
 Também não procede este argumento do recorrente. 
 Em primeiro lugar, porque o artigo 53º do CIRS não regula a possibilidade ou 
 impossibilidade de dedução de tais encargos, mas apenas a possibilidade ou 
 impossibilidade de dedução de um certo quantitativo (que é, em regra, o de € 
 
 7596,69), não relacionado com as despesas que o titular do rendimento se viu 
 obrigado a fazer para obter o respectivo rendimento: é que, como se salienta no 
 acórdão recorrido (supra, 3.), no caso de rendimentos provenientes de pensões 
 não se vislumbra a que despesas dê necessariamente lugar a sua obtenção. 
 Ora, não regulando o artigo 53º do CIRS a possibilidade ou impossibilidade de 
 dedução de encargos necessários à obtenção dos rendimentos do sujeito passivo, 
 nenhuma limitação pode introduzir nesse domínio a norma do seu n.º 5. 
 Em segundo lugar, a eventual eliminação ou redução da dedução a que se refere o 
 artigo 53º do CIRS não exclui a possibilidade de outras deduções serem feitas 
 pelo sujeito passivo do imposto: como já atrás se salientou, o CIRS prevê 
 múltiplas deduções a outras categorias de rendimentos e múltiplas deduções à 
 colecta, que podem contemplar os encargos necessários à obtenção dos rendimentos 
 do sujeito passivo, se eles tiverem existido. Observa J. L. Saldanha Sanches, 
 ob. cit., p. 205, nota 283, que o CIRS ‘usa o termo «deduções» para as despesas 
 conexas com a obtenção do rendimento (arts. 25º e 26º) reservando o termo 
 
 «abatimentos» para as despesas essencialmente pessoais como as realizadas com os 
 dependentes, a habitação ou a saúde. As deduções são formas de tornar líquidos 
 certos rendimentos, os abatimentos o modo de levar em conta, mediante 
 diferenciações horizontais, aspectos determinantes da capacidade contributiva 
 dos diversos agregados familiares’.
 Nenhum impedimento levantando o artigo 53º, n.º 5, do CIRS à dedução, nos termos 
 gerais, dos encargos necessários à obtenção dos rendimentos do sujeito passivo, 
 nenhuma razão tem portanto o recorrente quando, com base nesse argumento, 
 conclui no sentido da violação do mencionado princípio da capacidade 
 contributiva.
 
 9. Invoca ainda o recorrente a violação do princípio da igualdade de tributação.
 Este princípio, que assenta no da capacidade contributiva, ‘diz-nos que as 
 pessoas são tributadas em conformidade com a respectiva capacidade contributiva, 
 o que significa, de um lado, que ficarão excluídos do campo da incidência dos 
 impostos aquelas pessoas que não disponham dessa capacidade e, de outro lado, 
 que face a detentores de capacidade contributiva, os contribuintes com a mesma 
 capacidade pagarão o(s) mesmo(s) imposto(s) (igualdade horizontal) e os 
 contribuintes com diferente capacidade pagarão diferentes impostos, seja em 
 termos qualitativos, seja em termos quantitativos (igualdade vertical)’ (cfr. 
 José Casalta Nabais, O dever fundamental de pagar impostos, Coimbra, Almedina, 
 
 1998, p. 443). 
 Na perspectiva do recorrente, o regime instituído no artigo 53º, n.º 5, do CIRS 
 levaria a que o sujeito passivo com igual capacidade contributiva no activo e na 
 reforma fosse tributado mais gravosamente na reforma do que no activo.
 Não demonstra porém o recorrente em que medida a circunstância de o rendimento 
 anual do sujeito passivo do imposto ser superior ao vencimento base anualizado 
 do cargo de primeiro-ministro – que é a circunstância a que atende a norma do 
 artigo 53º, n.º 5, do CIRS, para efeitos da redução ou exclusão da dedução – se 
 reflecte numa tributação mais gravosa dos rendimentos provenientes de pensões. 
 A invocação da violação do princípio da igualdade só poderia considerar-se 
 pertinente se tal circunstância não se reflectisse na tributação dos rendimentos 
 de outras categorias ou se reflectisse menos gravosamente nessa tributação. 
 Ora, o recorrente não demonstra que as deduções previstas, por exemplo, no 
 artigo 25º do CIRS (relativas aos rendimentos do trabalho dependente), não 
 tenham em devida conta essa circunstância, ainda que (como efectivamente ocorre) 
 a ela não aludam expressamente. Por outras palavras, da argumentação do 
 recorrente não resulta, por exemplo, que o titular de rendimentos do trabalho 
 dependente que aufira um rendimento anual superior ao vencimento base anualizado 
 do cargo de primeiro-ministro acabe, em regra, por ser tributado mais suavemente 
 do que o titular de rendimentos provenientes de pensões. 
 E a verdade é que são diversas as situações de quem aufere os rendimentos 
 previstos no n.º 1 do artigo 53º do CIRS (isto é, rendimentos de valor anual 
 igual ou inferior a € 7596,69), as de quem aufere rendimentos simplesmente 
 superiores aos previstos no n.º 1 do artigo 53º – a quem é aplicável o n.º 2 do 
 mesmo artigo 53º – e as de quem aufere rendimentos de valor anual superior ao 
 vencimento base anualizado do cargo de primeiro-ministro (hipótese do n.º 5 do 
 artigo 53º). As situações referidas são diferentes, quer quanto ao montante dos 
 rendimentos auferidos, quer quanto ao montante da dedução que é efectuada, o que 
 basta, só por si, para se excluir a existência de violação do princípio da 
 igualdade.
 Não existe, por outro lado, identidade de situações entre os rendimentos de 
 pensões e os rendimentos provenientes, por exemplo, do trabalho dependente 
 quanto aos custos necessários para obtenção de rendimentos de cada uma dessas 
 categorias, pelo que, também sob este aspecto, a previsão de uma dedução não 
 viola o princípio da igualdade. É que – independentemente de outras 
 considerações – não pode comparar-se a dedução específica prevista no artigo 53º 
 do CIRS com a dedução dos custos que o contribuinte tem de suportar para a 
 obtenção de rendimentos de outras categorias. Improcede assim igualmente a 
 acusação de ‘discriminação qualitativa’ deduzida pelo recorrente.
 Conclui-se portanto que não existe qualquer base sólida para censurar à norma 
 sub judice a violação do princípio da igualdade.
 
 10. De acordo com o recorrente, a norma do artigo 53º, n.º 5, do CIRS violaria 
 ainda o princípio da tributação pelo rendimento líquido, ‘uma vez que nos casos 
 em que existe uma eliminação, ou mesmo nos que existe apenas uma redução, da 
 dedução específica, a taxa incide directamente sobre o rendimento bruto’.
 Esta argumentação do recorrente prende-se com uma outra a que já se fez 
 referência (supra, 8.): a de que a norma do artigo 53º, n.º 5, do CIRS impediria 
 a dedução das despesas específicas para a obtenção do rendimento total auferido 
 e, como tal, ocasionaria a tributação pelo rendimento bruto (cfr. fls. 132 a 
 
 139).
 Mas, como já se salientou, nem a norma do artigo 53º, n.º 5, do CIRS regula a 
 possibilidade ou impossibilidade de dedução de despesas, nem essa norma exclui a 
 aplicação, se for caso disso, das outras regras do Código relativas a deduções 
 ao rendimento colectável e a deduções à colecta.
 Como tal, nunca poderia essa norma violar o referido princípio da tributação 
 pelo rendimento líquido.
 
 11. A norma do artigo 53º, n.º 5, do CIRS ofenderia ainda, segundo o recorrente, 
 o princípio da segurança jurídica, na modalidade do princípio da confiança, pois 
 que ‘foi criada [pelo próprio legislador, quer no preâmbulo do decreto-lei que 
 aprovou o Código do IRS, quer no próprio artigo 51º do Código do IRS, na sua 
 versão de 1989 até 1994] a convicção ao Recorrente, e aos pensionistas em geral, 
 que aquando da reforma ficariam sujeitos a um regime de tributação mais 
 favorável do que aquele a que se encontravam sujeitos, enquanto sujeitos 
 passivos enquadrados na Categoria A’.
 Trata-se novamente de argumento improcedente. Na verdade, ele pressupõe, desde 
 logo, que ao recorrente havia sido criada a expectativa de que a circunstância 
 de auferir um rendimento anual superior ao vencimento base anualizado do cargo 
 de primeiro-ministro não seria considerada para efeitos de cálculo de uma 
 dedução ao rendimento colectável. 
 Ora mesmo que o mencionado preâmbulo do diploma que aprovou o Código do IRS e o 
 citado anterior artigo 51º tivessem criado ao recorrente a expectativa de que as 
 pensões seriam objecto de um tratamento mais favorável do que os rendimentos do 
 trabalho dependente ou de capitais, parece evidente que nunca lhe podiam ter 
 criado a expectativa legítima de que a circunstância de auferir um rendimento 
 anual superior ao vencimento base anualizado do cargo de primeiro-ministro não 
 seria considerada para efeitos de cálculo de uma dedução ao rendimento 
 colectável. Dito de outro modo, não é minimamente razoável sustentar que ao 
 recorrente havia sido criada a convicção de que o regime do artigo 53º, n.º 5, 
 do CIRS nunca viria a existir; quando muito, teria sido criada uma expectativa 
 acerca das tendências do sistema de tributação das pensões.
 Esta expectativa é certamente demasiado vaga para imputar à norma em apreço uma 
 qualquer violação do princípio da confiança, ainda que se considerasse – questão 
 que nem sequer interessa apreciar, porque se encontra prejudicada pelas 
 considerações anteriores – que o preâmbulo de um diploma legal ou a redacção, em 
 certo momento, de um preceito, podem fundar expectativas legítimas. 
 Ao introduzir no Código do IRS a norma que agora consta do n.º 5 do artigo 53º, 
 o legislador ordinário fez uso, de modo que não pode considerar-se intolerável, 
 da sua liberdade de conformação. Com essa actuação, traduzida na fixação de um 
 limite à dedução prevista quanto a rendimentos da categoria H, para rendimentos 
 anuais superiores ao vencimento anualizado do cargo de primeiro-ministro, não se 
 frustrou qualquer confiança legitimamente formada sobre a manutenção do direito 
 anterior. Dir-se-á até que é natural que o quadro legislativo dos impostos 
 evolua e que determinados pontos do regime, como o dos limites a deduções, 
 sobretudo para rendimentos relativamente elevados, não possam considerar-se como 
 tipicamente merecedores de uma estabilidade tal que os torne imunes a alterações 
 ou susceptíveis de fundar uma confiança legítima, digna de protecção quanto à 
 sua manutenção.
 
 12. Por fim, aponta ainda o recorrente a violação dos princípios da generalidade 
 e da justiça – para além da violação do ‘princípio da coerência do sistema 
 fiscal’, mas este, não revestindo autónoma relevância constitucional, como é, 
 aliás, reconhecido pelo recorrente (cfr. fls. 131-132 e 141-142), não será aqui 
 considerado. 
 Em relação aos princípios da generalidade e da justiça, não concretiza 
 minimamente o recorrente as razões da respectiva violação, intuindo-se apenas 
 que elas coincidiriam com as razões que alicerçam a alegada violação do 
 princípio da igualdade. Mas esta questão já foi apreciada e, como se explicou, 
 não pode imputar-se à norma do artigo 53º, n.º 5, do CIRS a violação de tal 
 princípio constitucional.
 Improcede portanto, também nesta parte, o presente recurso de 
 constitucionalidade”.
 
  
 
 É esta jurisprudência – para cuja fundamentação se remete – que, por manter 
 inteira validade, agora há que reiterar. 
 
  
 III. Decisão
 Pelo exposto, decide-se:
 a)      Não julgar inconstitucional a norma contida no nº 5 do artigo 53º do 
 Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, na redacção 
 introduzida pelo Decreto-Lei nº 198/2001, de 3 de Julho, e, em consequência;
 b)      Negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida no que se 
 refere ao juízo de constitucionalidade.
 
  
 Custas pelo recorrente, fixando-se em 20 (vinte) unidades de conta a taxa de 
 justiça.
 
  
 Lisboa, 20 de Abril de 2005
 
  
 Maria João Antunes
 Rui Manuel Moura Ramos
 Maria Helena Brito
 Carlos Pamplona de Oliveira (vencido conforme a declaração aposta ao acórdão 
 
 178/05)
 Artur Maurício