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 - ACRL de 20-12-2018   Administrador judicial provisório . Parecer sobre a situação de insolvência da empresa devedora.
Aprovado o plano de recuperação tendente à revitalização da empresa devedora e não sendo o mesmo homologado, o administrador judicial provisório deve emitir parecer sobre a situação de insolvência da empresa devedora.
Proc. 757/16.7T8AGH-A.L1 6ª Secção
Desembargadores:  Cabral Amaral - Cristina Neves - -
Sumário elaborado por Susana Leandro
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Processo nº 757/16.7T8AGH-A.L1
Apelação
Relator: Eduardo Petersen Silva
1ª Adjunta: Desembargadora Cristina Neves
2º Adjunto: Desembargador Manuel Rodrigues
Acordam os juízes que compõem este colectivo do Tribunal da Relação de Lisboa:
I. Relatório
No Processo Especial de Revitalização da devedora JC... — Artes Gráficas, Lda, foi aprovado plano de revitalização ao qual se opôs o credor NV...A, SA, tendo sido proferida decisão, em 18.4.2017, a qual, com fundamento no artigo 215º do CIRE e por violação não negligenciável de norma aplicável ao conteúdo do plano de recuperação, recusou a homologação do plano e declarou encerrado o PER.
O credor NV...A, SA veio requerer, em 15.9.2017, que o tribunal notificasse o Administrador Provisório para dar cumprimento ao disposto no artigo 17º-G, nº 3 e 4, do CIRE, alegando aguardar desde a data da decisão que o mesmo emitisse parecer acerca da situação de insolvência da empresa.
Por despacho de 2.10.2017 foi este requerimento indeferido, sustentando-se que, tendo o processo negociai terminado com a aprovação do plano, o artigo 17º-G do CIRE não tinha aplicação, por se referir apenas aos casos em que o processo negociai tivesse terminado sem a aprovação do plano. Por outro lado, mostrando-se findo o PER, o Administrador Provisório cessara as suas funções, carecendo de legitimidade para requerer a insolvência do devedor, ao contrário do que sucedia com o próprio credor requerente.
Inconformado, o NV...A, SA S.A. interpôs o presente recurso' formulando, a final, as seguintes conclusões:
4. O artigo 17º-F do CIRE que regula as situações em que ocorreu a conclusão das negociações com a aprovação do plano de recuperação tendente à revitalização da empresa e o nº 8 de tal artigo, dispõe que: Caso o juiz não homologue o acordo aplica-se o disposto nos nº 2 a 4, 6 e 7 do artigo 17º-G (negrito e sublinhado nosso).
(...)
6. Aliás, o Senhor Administrador Judicial Provisório notificado pelo recorrente do requerimento apresentado, notificou todos os credores para efeitos de audição e emissão de parecer acerca da situação de insolvência da empresa devedora.
7. Entende-se, assim, que o (...) despacho aqui recorrido violou, por erro de interpretação e de aplicação, nomeadamente, o disposto nos artigos 17º-F e 17º-G, Os 3 e 4 do CIRE, devendo ser revogado por (...) acórdão que ordene a notificação do Senhor Administrador Judicial Provisório para que emita o seu parecer a situação de insolvência da empresa devedora e, em caso afirmativo, requeira a respectiva insolvência, com todas as demais consequências legais.
Não consta dos autos a apresentação de contra-alegações.
Corridos os vistos legais, cumpre decidir:
II. Direito
Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões da alegação, a única questão a decidir é a de saber se, concluído o processo negociai com a aprovação do plano de recuperação tendente à revitalização do devedor mas não sendo o mesmo homologado por despacho do juiz, deve o administrador judicial provisório emitir parecer sobre a situação de insolvência da empresa.
III. Matéria de facto — a constante do relatório que antecede.
IV. Apreciação
Dizer em primeiro lugar que, embora o tribunal tenha discorrido sobre a cessação de funções do administrador e a sua falta de legitimidade para requerer a insolvência, esta última parte não integra a decisão recorrida, na medida em que a decisão se compreende como resposta ao requerimento do credor, cujo único pedido foi o de o tribunal notificar o administrador para emitir parecer sobre a situação de insolvência da empresa. Isto significa que aquela menção, na decisão recorrida, sobre a falta de legitimidade, no máximo se apresenta como uma antecipação de decisão relativamente a um requerimento de insolvência que o administrador viesse a fazer, sendo porém que o tribunal de recurso só reaprecia decisões — artigo 627° n° 1 do CPC — e não meras declarações de intenção por parte do tribunal recorrido.
Dizer seguidamente que se o próprio credor aqui recorrente resolveu, por sua iniciativa, notificar o administrador do requerimento que apresentou, e se o administrador já está a proceder a audições para emitir o parecer, então até parece que o presente recurso é inútil, só se podendo encontrar a utilidade de, na sua procedência, vincular o administrador à emissão do parecer e vincular o tribunal, se o administrador entregar nos autos tal parecer, a neles o manter.
Dispõe com efeito o artigo 17º-F nº 7 do CIRE que Caso o juiz não homologue o acordo aplica-se o disposto nos n° 2 a 4, 6 e 7 do artigo 17º-G, ou seja, estabelece a lei um paralelismo entre a situação de não aprovação do plano de recuperação por parte dos credores e de não homologação do plano de recuperação por parte do juiz. Em ambos os casos, e partindo do princípio que o PER foi previsto e instituído para a empresa que se encontra em situação económica difícil ou em insolvência iminente mas ainda, por si, ou conjuntamente com algum ou alguns credores, entende que tem condições de recuperação, e intenciona vincular os credores ao referido plano, viabilizando a sua recuperação, a apresentação a PER tem o efeito de suspensão, digamos, da continuação dos ataques dos credores, para usar uma imagem que abrange a interposição e prosseguimento de acções de cobrança e impede o corte dos fornecedores de serviços essenciais ao funcionamento da empresa, e aquela primitiva intenção e esta suspensão justificam-se na medida do tempo necessário a um escrutínio rigoroso da razoabilidade da perspectiva de recuperação. Havendo conclusão neste sentido e se o plano for homologado judicialmente, inicia-se o tempo e o modo de recuperação. Não havendo conclusão nesse sentido ou não permitindo o tribunal que o plano acordado possa ser posto em prática, então volta-se à estaca zero: - a empresa devedora está em situação económica difícil ou em insolvência iminente.
De volta ao princípio, o legislador não autoriza que tudo se passe como se nada se tivesse passado. Aliás, estamos em presença duma lógica economicista que se sobrepõe ao princípio geral da obrigação daquele que se encontra em insolvência se apresentar a ela. Esta lógica vincula a empresa devedora. Tendo-se apresentado a PER e não o tendo conseguido, então aproveitam-se os esforços já realizados, o conhecimento já adquirido pelos credores e pelo administrador provisório, e resolve-se definitivamente a equação: a empresa está em situação económica difícil mas não tanto, tanto que pode seguir em paz e voltar a bater-se de igual para igual e sem privilégios defensivos com todos os credores que tem e que venha a ter, ou está em insolvência iminente que, por não ter sido aprovado ou homologado o plano com que intencionava recuperar-se, passará de iminente a efectiva?
Repare-se ainda que, de algum modo, o aproveitamento dos esforços de conhecimento da situação económica real da empresa e das suas reais perspectivas, durante o processo negocial é também uma compensação aos credores pelo período de suspensão das suas possibilidades de acção contra o devedor.
Donde, com todo o sentido, o referido artigo 17º-F do CIRE, no caso de não homologação do plano acordado, permite, pela remissão do seu nº 8 para o nº 4 do artigo 17º-G do CIRE, que prossigam as funções do administrador provisório concretamente com a emissão de parecer sobre a situação económica da empresa, em tanto que se concluir que se encontra na situação de insolvência, deverá requerer ele mesmo a insolvência, no que se revela portanto mais uma compensação para os credores que teriam legitimidade para a requerer.
Nestes termos, procede o recurso, devendo revogar-se o despacho recorrido, e em consequência determinar-se ao tribunal recorrido que ordene a notificação do administrador judicial provisório para que emita parecer sobre a situação de insolvência da empresa devedora.
Sem custas — artigo 527º nº 1 e 2 do CPC.
V. Decisão
Nos termos supra expostos, acordam conceder provimento ao recurso e em consequência revogam o despacho recorrido e em consequência determinam ao tribunal recorrido que ordene a notificação do administrador judicial provisório para que emita parecer sobre a situação de insolvência da empresa devedora.
Sem custas.
Registe e notifique.
Lisboa, 20.12.2018
Eduardo Petersen Silva
Cristina Neves
Manuel Rodrigues
Sumário (a que se refere o artigo 6639 n9 7 do CPC)
Aprovado o plano de recuperação tendente à revitalização da empresa devedora e não sendo o mesmo homologado, o administrador judicial provisório deve emitir parecer sobre a situação de insolvência da empresa devedora.
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