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Processo n.º 732/2005
3.ª Secção
Relator: Conselheiro Bravo Serra
1. Inconformada com a sentença proferida em 8 de Julho
de 2003 no 4º Juízo do Tribunal Tributário de 1ª Instância de Lisboa e que
julgou procedente a impugnação deduzida por A., no tocante à liquidação
adicional de imposto sobre o valor acrescentado referente aos anos de 1995 e
1996, no montante global de Esc. 10.151.241$00, recorreu a Fazenda Pública para
a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo.
Na resposta à alegação produzida pela recorrente, a
recorrida formulou as seguintes «conclusões»: –
“I Conforme se demonstrou, à saciedade, tanto na impugnação, como também nesta
sede, o direito assiste à Recorrida.
II A Recorrida agiu de acordo com a lei quando optou por não proceder à
liquidação de IVA sobre as ofertas de pequeno valor económico, na parte em que
as mesmas ultrapassaram 5/1000 do volume de facturação do respectivo exercício
anterior.
III Pois, tal como refere a lei, tratava-se de ofertas de diminuto valor
económico, em conformidade com os usos económicos do sector de actividade da
Recorrida.
IV Julgou bem a douta sentença ao anular as liquidações adicionais de IVA.
V A Recorrida não devia nem deve liquidar IVA sobre as ofertas que faz quando o
valor das mesmas excede a permilagem de 5/1000 do volume de facturação do
exercício anterior, conforme estatuído na Circular 19/89, de 18 de Dezembro da
Administração Fiscal.
VI A Recorrida agiu em perfeita consonância com a lei, pois, estando o preço das
ofertas que faz aos seus clientes, em conformidade com os usos comerciais do seu
sector de actividade, a mesma não devia liquidar imposto sobre as mesmas.
VII A Recorrida não tem de se cingir ou de agir de acordo com a Circular 19/89,
de 18 de Dezembro, porquanto a mesma é ilegal.
VIII A ilegalidade da Circular em questão resulta do facto de fixar e impor aos
contribuintes que ajam em sua desconformidade, normas de incidência tributária,
sem qualquer tipo de habilitação legal para o efeito.
IX As doutas Alegações da Fazenda decaem pela falta de alegação e demonstração
da actuação da Recorrida contra o disposto na lei, ou seja, que a Recorrida
praticou ofertas cujo preço estivesse desconforme com os usos comerciais.
X Nem o poderia fazer, pois as ofertas praticadas pela Recorrida, como técnica
de publicidade, estão perfeitamente de acordo com os usos comerciais do sector
de actividade, quer no que diz respeito ao tipo, quer ao próprio preço das
ofertas.
XI Não é elemento definidor de usos comerciais gerais e abstractos, o disposto
na Circular 19/89, de 18 de Fevereiro.
XII A Circular além de ser ilegal por falta de habilitação legal para
interpretar extensivamente normas de incidência tributária e aplicar
correctivamente essa interpretação a todos os contribuintes,
XIII É ilegal, por violar o princípio da igualdade ao pretender tratar da mesma
forma situações objectivamente desiguais, tais como os usos comerciais de
diversos sectores de actividade e
XIV É ilegal pela abusiva desvirtuação de norma comunitária e respectiva
transposição ilegal.
XV São devidos juros indemnizatórios a favor da Recorrida pelo pagamento
indevido de imposto.”
Anote-se que, no «teor» da resposta à alegação da
Fazenda Pública – e no que concerne ao por esta invocado no sentido de dever, no
caso, ser respeitada a fixação de um critério uniforme da Administração Fiscal
quanto à definição do que deveria ser entendido como ofertas de pequeno valor,
definição essa levada a efeito por intermédio da Circular nº 18/98, de 18 de
Dezembro – a recorrida fez escrever: –
“(…)
47º
Assim, para a Administração Fiscal, não bastando o abuso, por si representado
nessa fixação e aplicação com eficácia externa da sua interpretação da lei,
48º
Acaba por contestar a lei, alegando, na prática que a mesma é demasiado vaga e
que não comporta avaliação casuística, sob pena de ser violado o princípio da
igualdade!!!
49º
A ora Recorrida não consegue alcançar a razão da Administração Fiscal defender
que os critérios de usos comerciais estabelecidos e aplicáveis a todos os
contribuintes são justos, à luz (da imposição) do princípio da igualdade.
50º
Quando o princípio da igualdade consiste, precisamente, em tratar igual o que é
igual e diferenciadamente o que é desigual.
(…)
54º
A Administração Fiscal não emitiu qualquer outro entendimento relativamente ao
enquadramento dos usos comerciais e qualquer outro sector de actividade, como
se,
55º
Em relação a todos os demais sectores de actividade valesse a máxima consagrada
na Circular 18/89, de 18 de Dezembro.
56º
O valor das ofertas em conformidade com os usos comerciais, não poderá deixar de
atender aos diferentes sectores de actividade dos contribuintes.
57º
Não o fazendo, é a Administração Fiscal viola o princípio da igualdade por não
tratar de forma desigual situações que não são, de facto, iguais.
(…)
68º
De facto, mesmo que, à cautela e por dever de bom patrocínio se lograsse
entender que a Administração fixasse, mediante autorização legislativa para ao
efeito, preços unitários máximos dos brindes, para e por diversos sectores de
actividade, abaixo dos quais haveria exclusão de tributação,
69º
Não pode a ora Recorrida conformar-se com o facto de a Administração Fiscal
portuguesa ter ‘interpretado’ a norma legal em análise no sentido de se
encontrarem sujeitas a tributação as ofertas cujo montante global ultrapassa o
limite de 5/1000 do volume de facturação dos sujeitos passivos.
70º
As Circulares da Administração Fiscal são orientações genéricas do dirigente
máximo do serviço de Finanças que visam a uniformização da interpretação e
aplicação das normas tributárias pelos serviços.
71º
Na interpretação da lei, o intérprete não pode considerar o pensamento
legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal.
72º
Não existe qualquer correspondência (verbal ou semântica) entre o estatuído na
lei (alínea f) in fine do n.º 3 do artigo 3.º do Código do IVA) e o que se
encontra plasmado na Circular 19/89 de 18 de Dezembro, sobretudo na parte em
que esta considera que, em termos globais, o valor anual das ofertas não poderá
exceder 5/1000 do volume de negócios do ano anterior da empresa ofertante.
73º
O conceito de pequeno valor das ofertas estatuído tanto no Código do IVA, como
na própria Directiva comunitária donde aquele dimana, não pode ser interpretado
no sentido defendido pelas Autoridades Fiscais.
74º
O pequeno valor das ofertas (em conformidade com os usos comerciais do sector
respectivo), tem, necessariamente, de ser aferido, caso a caso, pelo respectivo
valor unitário.
75º
Se acaso restassem dúvidas sobre tal interpretação, poder-se-ia constatar que a
orientação nacional nessa matéria seria, pelo menos, original, atendo o disposto
nos restantes ordenamentos comunitários e estaria em clara desconformidade com a
Directiva Comunitária.
(…)
80º
A interpretação inovadora que a Administração Fiscal faz da lei e da norma
comunitária, além de totalmente errada, causa enormes prejuízos financeiros
àqueles que se dedicam à actividade comercial da venda por correspondência, em
que, recorde-se, as margens de lucro são extremamente baixas, pois veda-lhe a
possibilidade de publicitarem a sua actividade.
81º
A interpretação do artigo em questão do Código do IVA pelas Autoridades Fiscais
passível porventura de aplicação adequada em certos sectores de actividade
comerciais, além de estar totalmente contra os usos comerciais concretos da
Recorrida e de todas aquelas que operem nesse sector de actividade,
82º
Acaba por, ao ser aplicada correctivamente à Recorrida ou pelos demais
contribuintes, contribuir para a perda de competitividade internacional das
empresas portuguesas que se decidam a esta actividade.
(…)”
O Tribunal Central Administrativo, por acórdão de 25 de
Maio de 2004, concedeu provimento ao recurso, em consequência julgando
improcedente a impugnação deduzida pela A..
Em síntese, e para o que ora releva, aquele aresto
aceitou que, como à Administração Fiscal cabe competência “para decidir sobre
todos os pressupostos necessários à liquidação”, era a mesma competente para
proceder à especificação de normas tributárias que utilizassem conceitos
indeterminados exigentes de preenchimento por aquela Administração, desde que a
lei assegure “aos interessados «uma suficiente densificação que sirva de
critério orientador à actividade administrativa e à dos próprios tribunais,
quando chamados a controlar o uso de tais conceitos pela Administração»”. E, no
tocante ao limite de 5/1000 do volume de negócios, como estabelecimento do
máximo de valor das «ofertas de pequeno valor económico», estabelecimento esse
levado a efeito pela Circular nº 18/98, disse que isso ainda integrava “o
preenchimento do próprio conceito global das ofertas de pequeno valor”, vindo,
adiante – após sublinhar que era “certo que, face à lei, os procedimentos
definidos pela AT (nomeadamente através de Circulares) não podem derrogar o
princípio da legalidade tributária”, razão pela qual, a essa luz, era “possível
afirmar a desconformidade do acto recorrido com as normas legais referidas e
que, deste modo, os pressupostos realmente existentes impunham decisão
administrativa de sinal contrário” – a sustentar que o entendimento da sentença
impugnada no sentido de se dever atender às circunstâncias de cada caso não era
aceitável, antes sendo objectivo “o critério fixado pela AT no ajuizado ofício
circular”, pois que “funda-se na lei por apelo às normas constantes do POC”, e
que “como a lei confere à AF a margem para fixar um critério segundo parâmetros
de razoabilidade, não colhe a afirmação da impugnante de que a Circular além de
ser ilegal por falta de habilitação legal para interpretar extensivamente normas
de incidência tributária, é ilegal, por violar o princípio da igualdade ao
pretender tratar da mesma forma situações objectivamente desiguais, tais como os
usos comerciais e que [é] ilegal pela abusiva desvirtuação de norma comunitária
e respectiva transposição legal”, acrescentando que “o critério legal de oferta
de pequeno valor é preenchido pela AT dentro dos limites que a lei lhe confere
(razoabilidade) e é objectivo ao fazer variar a matéria tributável em função do
volume de negócios (5/1000)”.
Do acórdão tirado no Tribunal Central Administrativo
veio a A., solicitar a respectiva aclaração, vindo, quatro dias mais tarde, a
“apresentar RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA” do mesmo aresto, arguindo nulidades a
ele dirigidas.
No requerimento consubstanciador desta segunda
pretensão, a impugnante formulou, inter alia, as seguintes «conclusões»: –
“
(…)
V.2. DA OMISSÃO DE PRONÚNCIA QUANTO À INCONSTITUCIONALIDADE POR VIOLAÇÃO DO
PRINCÍPIO DA LEGALIDADE
V. A Circular n.º 19/89, ao limitar a norma de incidência negativa prevista na
alínea f) in fine, do n.º 3, do art.º 3º do Código do IVA, é inconstitucional
por violação do disposto nos art.º 165.º, n.º 1, alínea i) e no art.º 103.º, n.º
2, da Constituição da República Portuguesa, ferindo o princípio da separação dos
poderes;
VI. A Administração Fiscal usurpou as funções do legislador;
VII. Tal inconstitucionalidade não deixaria de verificar-se mesmo que a
disposição referida na Conclusão I. existisse;
VIII. Isto porque ‘a lei do POC’ foi aprovada e posta em vigor sem precedência
de lei autorizativa;
IX E porque se trata de matéria de reserva relativa da Assembleia da República,
que apenas pode ser objecto de delegação directa, i. e., em Decreto-Lei
directamente autorizado;
X. Não poderia o Governo usar tal autorização para, por sua vez, deferir em
Decreto-Lei a fixação de tais critérios à Administração Fiscal;
XI Mais, a Circular n.º 19/89 é também ilegal por violação do disposto no art.º
8.º, n.º 1 da Lei Geral Tributária;
XII. Questões que a Recorrida suscitou em sede de contra-alegações e sobre as
quais o Douto Acórdão não se pronuncia;
XIII. Razão pela qual, face a esta omissão de pronúncia o Douto Acórdão é nulo;
(…)”
Por acórdão de 18 de Janeiro de 2005, o Tribunal Central
Administrativo indeferiu os pedidos de aclaração e julgou improcedentes as
arguidas nulidades.
Do acórdão de 25 de Maio de 2004 interpôs a A.,
recursos, ordinário para o Supremo Tribunal Administrativo, recurso por oposição
de julgados, também para aquele Supremo, e recurso para o Tribunal
Constitucional, sendo este último ancorado na alínea b) do nº 1 do artº 70º da
Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, por seu intermédio visando “a aplicação da
Circular n.º 19/89, de 18 de Dezembro da Direcção-Geral dos Impostos, que cria
uma norma de incidência fiscal distinta daquela que está prevista na alínea f)
in fine, do n.º 3, do art.º 3.º do Código do IVA”, “Circular que o douto Acórdão
recorrido vem aplicar”, e cujo “próprio conteúdo” “se encontra ferido de
inconstitucionalidade material” por violação do princípio da igualdade,
acrescendo “que, a remissão para ‘a lei do Poc’ feita pelo Douto Acórdão, mesmo
que existisse, como erroneamente se refere, não resolveria a questão”, já que, a
“haver uma disposição no Plano Oficial de Contabilidade que dispusesse que as
ofertas ‘serão tidas como custo fiscal desde que devidamente documentadas e não
excedam os limites considerados razoáveis pela DGCI.’, teria como resultado a
impossibilidade da sua aplicação por inconstitucionalidade formal”, e isso
porque “o Plano Oficial de Contabilidade consta de Decreto-Lei expressamente
aprovado no âmbito da competência própria do Governo, sem precedência de
qualquer Lei de autorização”.
Por despacho lavrado em 10 de Maio de 2005 pelo Relator
do Tribunal Central Administrativo não foi admitido o recurso desejado interpor
para o Supremo Tribunal Administrativo, foi admitido o recurso por oposição de
julgados e não foi admitido o recurso interposto para o Tribunal Constitucional.
Quanto a esta última não admissão – a do recurso para o
Tribunal Constitucional – fundou-se o Relator do Tribunal Central Administrativo
na circunstância de, entendendo ele que o recurso por oposição de julgados é um
recurso ordinário, e porque esse recurso foi interposto e admitido, não haveria
possibilidade de impugnação perante este órgão de fiscalização concentrada da
constitucionalidade normativa.
É do despacho de 10 de Maio de 2005 que, pela A., vem
deduzida reclamação para o Tribunal Constitucional na qual, em súmula, invocando
o Acórdão nº 7/95, pugna por se dever julgar no sentido do seu deferimento.
Ouvido sobre a reclamação, o Ex.mo Representante do
Ministério Público junto deste Tribunal pronunciou-se no sentido de ela ser
manifestamente improcedente, já que “a entidade recorrente – confrontada com a
decisão proferida pela TCA – optou por interpor recurso, fundado em oposição de
julgados, para o Pleno do STA, o qual se mostra admitido no Tribunal ‘a quo’”, o
que “implica que se não mostra ainda proferida, no âmbito da jurisdição
administrativa e fiscal, a ‘última palavra’ sobre o litígio, o que significa que
não é, neste momento, viável a interposição do recurso de constitucionalidade
previsto na alínea b) do nº 1 do art. 70º da Lei nº 28/82, o qual incide
necessariamente sobre a decisão ‘final’ ou ‘definitiva’ proferida na ordem
jurisdicional competente (cfr., v.g., os acs. 411/00 e 253/01)”.
Cumpre decidir.
2. Como tem sido jurisprudência firme deste órgão de
administração de justiça, porque, nos termos do nº 4 do artº 77º da Lei nº
28/82, de 15 de Novembro, a decisão que revogar o despacho de não admissão do
recurso, faz caso julgado quanto à admissibilidade deste, incumbe ao Tribunal
Constitucional, na apreciação das reclamações a que se reportam o nº 4 do artº
76º daquela Lei e o citado artº 77º, pesar se se verifica o preenchimento de
todos os pressupostos do recurso, e não só aferir da fundamentação que conduziu
à não admissão (cfr., a título exemplificativo, o Acórdão nº 641/99 disponível
em www.tribunalconstitucional.pt).
2.1. Ora, in casu, como se viu, o despacho prolatado em
10 de Maio de 2005 pelo Relator do Tribunal Central Administrativo esteou-se na
consideração segundo a qual, devendo o recurso por oposição de julgados ser
perspectivado como um recurso ordinário, e porque ele, na situação em presença,
foi interposto, daí decorria a impossibilidade de recurso para o Tribunal
Constitucional, por se não encontrarem esgotados os recursos ordinários que no
caso cabiam.
Cita a reclamante, em abono da sua tese, o Acórdão deste
Tribunal nº 7/95.
Olvida, porém, as alterações de redacção que à Lei nº
28/82 foram introduzidas pela Lei nº 13-A/98, de 26 de Fevereiro.
Na verdade, como se assinalou no Acórdão deste Tribunal
nº 411/2000 (publicado nos Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 48º, 713 e
segs): –
“(…)
De facto, quando determinada decisão de um tribunal (no caso, do Tribunal
Central Administrativo) apenas admita o recurso fundado em oposição de julgados
(ou seja, o recurso destinado a uniformização da jurisprudência), a parte que,
durante o processo, acaso tenha suscitado a inconstitucionalidade de uma norma
legal e tenha visto a sua pretensão desatendida, pode recorrer imediatamente
dessa decisão para o Tribunal Constitucional (cf. artigos 70º, nºs 1, alínea b)
e 2, e 72º, nº 2, da Lei do Tribunal Constitucional). Ou seja: mesmo que, na
respectiva ordem jurisdicional, o recurso para uniformização de jurisprudência
seja um recurso ordinário, o ónus da exaustão deste tipo de recursos não lhe
impõe que, antes de recorrer para o Tribunal Constitucional, recorra para o
Pleno do Supremo Tribunal Administrativo.
A imediata interposição do recurso de constitucionalidade, num tal caso, não
priva a parte do direito de, posteriormente, interpor recurso de uniformização
de jurisprudência: é que, se o Tribunal Constitucional não conhecer do recurso
para si interposto ou lhe negar provimento, só então começa a correr o prazo
para a interposição do recurso ordinário de uniformização de jurisprudência para
o Pleno do Supremo Tribunal Administrativo (cf. artigo 80º, nº 4, in fine).
A parte pode, no entanto, optar por, em vez de recorrer logo para o Tribunal
Constitucional, interpor recurso para o Pleno do Supremo Tribunal
Administrativo, para uniformização de jurisprudência, da decisão do Tribunal
Central Administrativo.
Se assim proceder, também a parte não verá precludida a possibilidade de
impugnar perante o Tribunal Constitucional a decisão do Pleno que, acaso, lhe
seja desfavorável. E isso, quer o Pleno profira decisão de mérito, quer, por
entender que se não verifica a invocada oposição de julgados, não conheça do
recurso: de facto, a não interposição de recurso para o Tribunal Constitucional
da decisão do Tribunal Central Administrativo não faz precludir o direito de o
interpor da decisão do Pleno que a confirma (cf. o citado artigo 70º, nº 6); e,
no caso de o Pleno não admitir o recurso, o prazo para recorrer para o Tribunal
Constitucional conta-se do momento em que torna definitiva essa decisão de não
admissão (cf. artigo 75º, nº 2 da Lei do Tribunal Constitucional).
No presente caso, porém, o reclamante não se limitou a escolher um dos caminhos
apontados, antes interpôs da dita decisão recurso para o Tribunal Constitucional
e, simultaneamente, recurso para o Pleno do Supremo Tribunal Administrativo.
Ora, isso não é possível, pois, ao optar por recorrer logo para o Pleno do
Supremo Tribunal Administrativo para dirimir o conflito jurisprudencial que, em
seu entender, no caso se verifica, ele mantém-se no âmbito dos recursos
ordinários, que, assim, só ficarão esgotados quando o Pleno decidir o recurso
para si interposto.
Mas, sendo isto assim, o recurso de constitucionalidade, que ele interpôs
simultaneamente com o recurso para o Pleno, vem interposto sem ter sido ainda
‘proferida a ‘última palavra’ sobre o litígio na ordem jurisdicional em causa’.
(…)”.
E na mesma senda decidiu o Acórdão nº 253/2001
(disponível em www. tribunalconstitucional.pt).
Na verdade, como actualmente decorre do preceituado na
parte final do nº 2 e no nº 6, um e outro do artº 70º da Lei nº 28/82, se a
interposição de recurso destinado a uniformização de jurisprudência não
consubstancia o requisito ou pressuposto de interposição consistente no
esgotamento dos recursos ordinários (e isto independentemente da caracterização
dos recursos destinados a uniformização de jurisprudência como impugnações
ordinárias, extraordinárias ou sui generis), não obstando, assim, a que a
decisão seja admissível imediatamente para o Tribunal Constitucional, questão
diversa é a de saber se a «parte», escolhendo interpor aquele recurso, pode, ao
mesmo tempo, interpor o último. E, quanto a esta questão, a resposta que este
órgão de fiscalização concentrada da constitucionalidade vem dando é aquela que
resulta dos citados arestos.
A isto acresce ainda o que a seguir se irá expor.
De facto, como acima se assinalou, incumbe a este
Tribunal averiguar se se encontram congregados todos os pressupostos do recurso
querido interpor.
Ora, como resulta do relato supra efectuado, aquando do
recurso interposto pela Fazenda Pública para o Tribunal Central Administrativo –
e recurso esse no qual essa entidade pugnava pela revogação da sentença
proferida no Tribunal Tributário de 1ª Instância de Lisboa, pois que a mesma, na
óptica da recorrente, não atendeu, quando o devia ter feito, ao estabelecido na
Circular nº 18/89 da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos – a ora
reclamante, na resposta à alegação, não suscitou a desconformidade
constitucional das eventuais normas porventura extraíveis de tal Circular.
O que então disse, isso sim, é que a aludida Circular
era ilegal por fixar normas de incidência tributária sem qualquer tipo de
habilitação legal, por interpretar extensivamente normas de incidência
tributária, por violar o princípio da igualdade ao pretender tratar da mesma
forma situações objectivamente desiguais, e por efectuar uma abusiva
desvirtuação de norma comunitária e respectiva transposição [i?]legal.
Se a agora reclamante entendesse que os normativos quiçá
extraíveis da dita Circular eram desarmónicos com a Lei Fundamental, era o
momento da apresentação da resposta à alegação formulada pela então recorrente
Fazenda Pública o processualmente adequado para equacionar uma tal questão.
Não o fez, porém.
Uma impostação dessa questão só veio a ser levada a
efeito no requerimento – que apelidou de “RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA” e em
que veio arguir nulidade do acórdão de 25 de Maio de 2004.
Simplesmente, como tem sido sustentado na jurisprudência
deste Tribunal, a suscitação da questão de inconstitucionalidade, tem de ocorrer
durante o processo, ou seja, antes de ser proferida a decisão que se pretende
impugnar por intermédio do recurso de fiscalização concreta a que se reporta a
alínea b) do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82, não sendo, por isso, adequado que
essa suscitação só ocorra em requerimentos de arguição de nulidade, pedidos de
reforma ou de aclaração (cfr. verbi gratia, Acórdão nº 311/90, in Diário da
República, II Série, de 19 de Março de 1991).
Neste contexto, e independentemente da questão de saber
se constitui ratio juris da decisão ínsita no acórdão de 25 de Maio de 2004 do
Tribunal Central Administrativo algum ou alguns normativos que porventura se
extraiam da Circular nº 18/89 (questão, aliás, de cuja resposta afirmativa se
poderia duvidar), por não ter sido suscitada em momento processualmente adequado
a questão de inconstitucionalidade atinente a tal Circular, de concluir era, por
esta via, que se não podia abrir o recurso desejado interpor pela ora
reclamante.
Por outro lado, e se se entender que pelo recurso
interposto para este Tribunal, para além da questão referente à mencionada
Circular, ainda se queria abarcar normativo ou normativos insertos no Plano
Oficial de Contabilidade, o que veio de ser dito como relativamente aqueloutra
questão no sentido de não ter sido suscitada a questão de inconstitucionalidade
é igualmente aplicável a estoutra, sendo que, relativamente à última, nem sequer
a ora reclamante, no requerimento apelidado de “RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA” e
dirigido ao acórdão de 25 de Maio de 2004, colocou o problema de uma eventual
desconformidade constitucional do ou dos citados normativos.
Em face do exposto, indefere-se a reclamação,
condenando-se a impugnante nas custas processuais, fixando-se a taxa de justiça
em vinte unidades de conta.
Lisboa, 25 de Outubro de 2005
Bravo Serra
Gil Galvão
Artur Maurício