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    Sumários do STJ (Boletim) -
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ACSTJ de 30-11-2000
 Abuso sexual de crianças Coacção sexual Crime semi-público Crime público Bem jurídico protegido Crime continuado Concurso de infracções Consentimento
I - No n.º 1 do art.º 178.º, do CP, reconhece-se a necessidade do resguardo da vida privada e da intimidade de cada um, em domínios tão delicados quanto são os da sexualidade e se ergue, assim, aquela necessidade, como princípio mais importante do que o que preside ao poder punitivo do Estado, colocando-se na disponibilidade do ofendido a decisão e a von-tade de proceder (ou não) criminalmente contra o agente do ilícito.
II - O n.º 2 do mencionado artigo devolve ao mesmo Estado, em condicionalismos particular-mente graves que o legislador achou por bem não dever condicionar ao arbítrio particular, nem deixar que se limitassem por este, o livre exercício da acção penal, numa primeira fase e a concretização do 'jus puniendi' numa segunda.
III - Daí, conferir-se carácter público, através daquele n.º 2, aos crimes elencados no n.º 1, se a vítima for menor de 16 anos e o seu interesse o impuser, legitimando-se que o MP, naque-las condições e quando conclua que a protecção do menor impõe tutela penal efectiva e que o desencadeamento de um processo lhe não é prejudicial, dinamize a acção penal cor-respondente.
IV - Este fenómeno da transmudação de um crime semi-público em crime público, para além de se reflectir nos n.ºs 5 e 6 do art.º 113.º, do CP - dos quais desponta, ante certas situa-ções, o primado de que podemos apelidar de interesse público do procedimento - não atin-ge a essência do art.º 116.º, do mesmo Código, antes explica as excepções ao que nele se dispõe.
V - O bem jurídico a proteger, quer no crime de coacção sexual (art.º 163.º, do CP), quer no de abuso sexual de crianças (art.º 172.º, do CP), é a liberdade: a liberdade de se relacionar se-xualmente ou não e com quem, para os adultos; a liberdade de crescer na relativa inocência até se atingir a idade da razão para então e aí se poder exercer plenamente aquela liberda-de.
VI - No que respeita aos crimes de natureza sexual, o vector fundamental é, presentemente, o atentado violento (coacção sexual) ou não violento (abuso sexual) contra a liberdade ou auto determinação sexuais, mediante actos sexuais de relevo: se o acto sexual de relevo cometido contra a criança é logrado, não através de abuso mas através de violência, depa-ramos com um crime de coacção (agravado pela idade da vítima) e não com um crime de abuso sexual de menores.
VII - Se os factos cometidos pelo arguido preenchem, simultaneamente, a prática de um crime de coacção sexual agravado, na forma continuada, p. p. pelos art.ºs 163.º e 177.º, do CP, e um crime de abuso sexual de crianças (art.ºs 172.º, n.º 1 e 177.º, do referido Código) cujos factos estão intercalados naquela continuação, deve este ilícito considerar-se integrado na mesma continuação criminosa, devendo o arguido ser condenado apenas pelo primeiro dos ilícitos mencionados, não deixando de ser valoradas, em sede de determinação da medida da pena, todas as cambiantes integradoras do segundo.
VIII - Até aos 14 anos de idade, gozam os menores de uma protecção absoluta no que concer-ne ao seu desenvolvimento e crescimento sexuais, pelo que a lei os protege, inclusivamente deles próprios, considerando irrelevante o eventual consentimento que prestem para a prá-tica de actos sexuais.
Proc. n.º 2761/00 - 5.ª Secção Oliveira Guimarães (relator) Dinis Alves Guimarães Dias Carmona d
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