Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
Actualidade | Jurisprudência | Legislação pesquisa:


    Sumários do STJ (Boletim) -
Procurar: Assunto    Área   Frase
Processo   Sec.                     Ver todos
ACSTJ de 30-11-2000
 Recurso penal Matéria de facto Tribunal do Júri Supremo Tribunal de Justiça Duplo grau de jurisdição Constitucionalidade Princípio da igualdade Contradição insanável da fundamentação Insufic
I - O n.º 3 do art. 412.º do CPP respeita apenas a situações em que o tribunal ad quem tem poderes de cognição abarcando a matéria de facto, o que possibilita a modificabilidade des-ta - cfr. arts. 428.º, n.º 1 e 431.º, al. b), do referido Código - não sendo de observar nos ca-sos em que o recurso é interposto (de acórdão final proferido pelo tribunal do júri) para o STJ, uma vez que a este tribunal só cabe o reexame da matéria de direito, salvo o conheci-mento dos vícios e das nulidades previstos nos n.ºs 2 e 3 do art. 410.º do supra indicado di-ploma.
II - No nosso direito constitucional não está consagrado o princípio do duplo grau de jurisdi-ção em matéria de facto e, consequentemente, o recurso de acórdão de tribunal do júri per saltum para o STJ, de harmonia com o disposto no art. 432.º, n.º 1, al. c), do CPP, constitui solução compatível com a exigência constitucional consagrada no art. 32.º, n.º 1, da CRP.
III - Para além disso e até por isso, tal solução não viola o princípio da igualdade previsto no art. 13.º da CRP, porquanto não coloca quem é julgado por tribunal do júri em desigualda-de perante quem quer que seja, sendo certo que aquele tribunal é constituído por juizes de direito - como o tribunal colectivo - e por cidadãos não juizes (o que lhe confere uma mais intensa legitimidade democrática).
IV - A contradição insanável da fundamentação - art. 410.º, n.º 2, al. b), do CPP - ocorre quan-do se dá como provado e como não provado o mesmo facto, quando se afirma e se nega a mesma coisa ao mesmo tempo, ou quando simultaneamente se dão como provados factos contraditórios ou quando a contradição se estabelece entre a fundamentação probatória e a decisão sobre a matéria de facto.
V - A insuficiência da matéria de facto para a decisão - art. 410.º, n.º 2, al. a), do CPP - só ocorre se a matéria de facto dada como provada é insuficiente para a decisão de direito.
VI - As circunstâncias elencadas nas alíneas do n.º 2 do art. 132.º do CP não são elementos do tipo, antes são elementos da culpa. Portanto, não são de funcionamento automático, poden-do verificar-se qualquer delas sem que por isso se possa concluir pela especial censurabili-dade ou perversidade do agente; e podendo não ocorrer nenhuma delas e mesmo assim existirem outras não descritas susceptíveis de conduzir àquela especial censurabilidade ou perversidade.
VII - Daí que se torne sempre necessário apurar em concreto, na ponderação de todas as cir-cunstâncias de cada caso, se o conjunto destas conduz à especial censurabilidade ou per-versidade do agente que constitui o fundamento da qualificação.
VIII - Resultando da matéria de facto provada que:- Quando o arguido já tinha saído da herdade em que havia andado a caçar juntamente com o co-arguido e ia a dirigir-se para a moto em que com este abandonaria o local, ouviu, qua-se em simultâneo, gritos de palavras não perceptíveis, um tiro e o arranque do referido meio de transporte;- O arguido virou-se para a sua direita e viu o 'vulto' de um homem, que estava a cerca de 5 metros de si e que era a vítima que se dirigia na sua direcção em passo acelerado;- O arguido, esticando o braço que empunhava uma arma caçadeira, fez dois disparos nessa direcção, os quais atingiram a vítima, provocando-lhe lesões corporais que foram causa di-recta e necessária da morte dela;- O arguido, ao disparar os dois tiros, representou a morte da vítima como consequência possível da sua conduta, conformando-se com esse resultado, e em nenhum momento se apercebeu que aquela era elemento da guarda florestal; e- Não se mostrando evidenciado que a actuação do arguido se tivesse dirigido a encobrir caça ilegal, a facilitar a sua fuga ou a do co-arguido ou a assegurar a impunidade de ambos;tal quadro fáctico não dá azo a que se valore o homicídio como praticado em circunstânci-as reveladoras de especial censurabilidade ou perversidade do arguido.
IX - Perante a situação real, qual seja a de a assistente-demandante ser beneficiária de uma pensão no montante de 112.253$00, a qual é abonada 14 vezes ao ano, a que corresponde o valor anual de 1.571.542$00, e a situação hipotética a considerar, de que, sendo o marido daquela ainda vivo, teria a disponibilidade de 2.100.00$00 por ano (75% de 2.800.000$00, correspondentes a 14 meses a 200.000$00), posição esta que muito provavelmente melho-raria de ano para ano até ao termo da vida profissional activa do falecido, mais 22 anos, para ressarcimento de danos patrimoniais (art. 495.º, n.º 3, do CC), em termos de equidade, mostra-se adequado o montante indemnizatório de 10.000.000$00.
X - O art. 2.º, n.º 1, do DL 59/89, de 22-02, deve ser interpretado no sentido de que as institui-ções de segurança social têm o direito de serem reembolsadas dos montantes que já tenham sido pagos e dos que ainda se venham a pagar, em consequência da morte de um seu subs-critor, sendo que estes últimos só depois de os haver satisfeito ao beneficiário.É a solução que, conforme aos princípios que estão na base do apontado DL, melhor con-duz a uma economia de processos.
XI - Assim, o arguido deverá também ser condenado no pagamento à instituição de segurança social (C.G.A.) das prestações que esta vier a satisfazer aos beneficiários da pensão por morte, resultante de acidente de serviço, da vítima, e à medida que forem sendo pagas, sendo óbvio que se porventura deixarem de ser pagas pela referida instituição, por ter ces-sado a respectiva obrigação, em consequência de qualquer facto dela extintivo (p. ex. a morte dos beneficiários), deixarão de ser exigíveis ao primeiro.
Proc. n.º 2188/2000 - 5.ª Secção Hugo Lopes (relator) Oliveira Guimarães Dinis Alves Guimarães
   Contactos      Índice      Links      Direitos      Privacidade  Copyright© 2001-2024 Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa