ACSTJ de 19-03-2009
Nulidade de acórdão Contradição Processo disciplinar Nota de culpa Factos concretos Caso julgado
I – A nulidade, de sentença ou acórdão, por contradição entre a decisão e os seus fundamentos [alínea c), do art. 668.º do CPC] traduz-se num vício real no raciocínio do julgador (e não um simples lapsus calami): a fundamentação aponta num sentido; a decisão segue caminho oposto ou, pelo menos, direcção diferente. II – Não configura a sobredita nulidade, mas antes uma discordância em relação à matéria de facto fixada, a invocação, pela recorrente, de que o acórdão recorrido não alterou a matéria de facto, mas simultaneamente reconheceu, em relação à mesma, a falta de documentos e o carácter opinativo de uma determinada testemunha. III – Resulta das disposições conjugadas dos art.s 411.º, n.º 1, 415.º, n.º 3 e 435.º, n.º 3, do CT que a nota de culpa deve conter, além do mais, a descrição circunstanciada dos factos que são imputados ao trabalhador, não podendo, na decisão final do processo disciplinar, impositora do despedimento, ser invocados factos não constantes da nota de culpa nem referidos na defesa escrita do trabalhador, salvo se atenuarem ou diminuírem a sua responsabilidade, e que, na acção de impugnação do despedimento, o empregador apenas pode invocar factos e fundamentos constantes da decisão de despedimento comunicada ao trabalhador. IV – A consequência do desrespeito ou preterição desses comandos legais é a de não serem atendidos os factos fundantes da decisão de despedimento não circunstanciadamente descritos. V – Por isso, não obstante na acção de impugnação de despedimento a autora ter colocado determinados factos no âmbito da invalidade do procedimento disciplinar, por não conterem uma descrição circunstanciada – quando os deveria colocar em termos de não poderem ser considerados na apreciação da justa causa de despedimento –, nada impede que, oficiosamente, o tribunal conheça da questão nesta sede (de não atendibilidade dos factos na apreciação da justa causa de despedimento). VI – Tendo a sentença julgado procedente o pedido reconvencional e, em conformidade, condenado a autora no mesmo, condenação essa que não foi impugnada na apelação, mas apenas na revista, não pode o Supremo pronunciar-se sobre a mesma, por a tal obstar o caso julgado formado por aquela decisão da 1.ª instância (artigo 671.º do CPC). VII – Mas ainda que a autora tivesse impugnado tal decisão na apelação, dado que o acórdão recorrido não se pronunciou sobre a mesma, o que teria ocorrido seria nulidade do acórdão recorrido por omissão de pronúncia, que não é de conhecimento oficioso pelo tribunal, antes carece de ser arguida pelos interessados [art.s 77.º do CPT e 668.º, n.º 1, al. d), 1.ª parte, e n.º 3 do CPC, aplicável por força do art. 1.º, n.º 2, alínea a) do CPT]. VIII – E, não tendo a autora no requerimento de interposição da revista arguido a aludida nulidade, dela não pode o Supremo conhecer.
Recurso n.º 1686/08 -4.ª Secção Mário Pereira (Relator)* Sousa Peixoto Sousa Grandão
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