ACSTJ de 12-02-2009
Avença Contrato de trabalho Subordinação jurídica Violação do direito a férias Contrato de trabalho a termo Administração Pública
I -O contrato de avença constitui uma modalidade de contrato de prestação de serviço, e encontra-se definido nos arts. 17.º do Decreto-Lei n.º 41/84, de 3 de Fevereiro, e 7.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º409/91, de 17 de Outubro, como aquele que “…tem por objecto prestações sucessivas no exercício de profissão liberal (…)”, exercendo o prestador a sua actividade como um profissional livre, logo, com total independência e autonomia técnica. II – Constitui contrato de trabalho subordinado aquele que, embora designado como contrato de avença, tem por objecto a elaboração de propostas de decisão nos autos de contra-ordenação resultantes de infracção ao direito estradal, e era executado por um jurista sem qualquer autonomia técnico-jurídica ou discricionária, utilizando modelos pré-figurados, actuando sob a direcção e inspecção de representantes da DGV, não lhe sendo permitido interpretar disposições legais e aplicar a medida da coima e sanção que entendesse adequadas, estando ainda sujeito a um rigoroso horário de trabalho, que deveria ser cumprido nas próprias instalações da DGV. III – É insuficiente para alterar esta conclusão, e destina-se apenas a manter a aparência de um contrato de avença, a subsistência de certos requisitos formais mais consentâneos com a originária qualificação do contrato, como a não inscrição na Segurança Social, o não pagamento de subsídios de férias e de Natal, a passagem de “recibos verdes” e o pagamento do IVA pelo valor das remunerações pagas. IV - Ao estabelecer que “[s]ão nulos todos os contratos de prestação de serviços, seja qual for a forma utilizada, para o exercício de actividades subordinadas, sem prejuízo da produção de todos os seus efeitos como se fossem válidos em relação ao tempo durante o qual estiveram em execução”, o art. 10º, n.º 6, do Decreto-Lei n.º 184/89, de 14 de Junho estriba-se no necessário pressuposto de que outro contrato não haja sido o contrato efectivamente celebrado. V - Se o tribunal não se acha adstrito, na tarefa de qualificação do vínculo, à designação que as partes lhe conferiram, mal se entenderia que, ao arrepio da qualificação operada, lhe fosse imposto, a final, que atendesse aos efeitos de um contrato ficcionado (o contrato de avença). VI – Se um dado contrato celebrado entre a Administração e um particular é susceptível de ser qualificado como contrato de trabalho, apesar de lhe ser atribuído um outro nomen iuris,a consequência é esse contrato passar a reger-se pela lei geral do trabalho ou pelo regime da constituição, modificação e extinção da relação jurídica de emprego público consignado no Decreto-Lei n.º 427/89 de 07.12, consoante o contrato em causa possa ser considerado contrato de trabalho por tempo indeterminado ou contrato de trabalho a termo certo. VII - Assumida a natureza laboral do convénio, e sendo-lhe aposto um termo, tal contrato de trabalho é nulo por violação do disposto no art. 18.º, n.º2 do Decreto-Lei n.º 427/89, havendo que coligir o regime do art. 15.º da LCT, tanto por virtude do que dispõe o art. 294.º do CC, quanto daquilo que preceitua o n.º 5 do referido art. 18.º, ou seja, o convénio “…produz efeitos como se fosse válido em relação ao tempo durante o qual esteve em execução.” VIII – Para beneficiar do direito indemnizatório previsto no art. 13.º do D.L. n.º 874/76, de 28 de Dezembro, o trabalhador tem o ónus de provar que ocorreu um efectivo impedimento ao gozo de férias, visto que se trata de um facto constitutivo do direito que se arroga. IX - Verifica-se um efectiva obstrução ao gozo de férias, se a DGV distribui processos para despachar ao jurista todos os dias úteis do ano e efectua regularmente a contagem dos processos distribuídos ainda não despachados, suspendendo a remuneração daquele até que recuperasse os atrasos constatados, sendo ainda que, quando os juristas avençados questionavam os responsáveis da DGV sobre o gozo de férias e o seu pagamento, estes respondiam não terem aqueles direito a tais regalias.
Recurso n.º 2583/08 -4.ª Secção Sousa Grandão (Relator)* Pinto Hespanhol Vasques Dinis
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