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    Sumários do STJ (Boletim) - Laboral
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ACSTJ de 21-01-2009
 Subordinação jurídica Contrato de trabalho Director Despedimento ilícito Norma imperativa Equidade Danos não patrimoniais
I – A distinção entre contrato de trabalho e contrato de prestação de serviços assenta em dois elementos essenciais: o objecto do contrato (prestação de actividade ou obtenção de um resultado); e o relacionamento entre as partes (subordinação ou autonomia). II – O contrato de trabalho tem como objecto a prestação de uma actividade e, como elemento típico e distintivo, a subordinação jurídica do trabalhador, traduzida no poder do empregador de conformar, através de ordens, directivas e instruções, a prestação a que o trabalhador se obrigou. III – Diversamente, no contrato de prestação de serviço, o prestador obriga-se a proporcionar um resultado, que efectiva por si, com autonomia, sem subordinação à direcção da outra parte. IV – A subordinação jurídica, característica fundamental do vínculo laboral e elemento diferenciador do contrato de trabalho, implica uma posição de supremacia do credor da prestação do trabalho e a correlativa posição de sujeição do trabalhador, cuja conduta pessoal, na execução do contrato, está necessariamente dependente das ordens, regras ou orientações ditadas pelo empregador, dentro dos limites do contrato e das normas que o regem, a que o trabalhador deve obediência. V – Para alcançar a identificação da relação laboral, é fundamental proceder à análise da conduta dos contraentes na execução do contrato, recolhendo do circunstancialismo que o envolveu indícios que reproduzem elementos do modelo típico do trabalho subordinado ou do modelo da prestação de serviço, por modo a poder-se concluir, ou não, pela coexistência no caso concreto dos elementos definidores do contrato de trabalho. VI – Ao trabalhador, que pretenda fazer valer direitos emergentes de um contrato de trabalho, incumbe, nos termos do artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil, alegar e provar os elementos de facto constitutivos da relação laboral, ou seja, que exerce para outrem uma actividade remunerada, sob a autoridade e direcção daquele que beneficia dessa actividade. VII – É de qualificar como de trabalho o contrato pelo qual o Autor foi admitido ao serviço da Ré, para desempenhar o cargo de Director de Recursos Humanos, mediante uma remuneração mensal ilíquida de € 5.863,12, em 14 meses por ano, neles se incluindo os subsídios de férias e de Natal, tendo sido acordado como local de trabalho a sede da Ré, um período normal de trabalho semanal de 40 horas, e diário de 8.00 horas (com início às 9.00 horas, termo às 18.00 horas e intervalo para descanso das 12.00 horas às 13.00 horas) e isenção de horário de trabalho, tendo sido atribuído ao Autor um gabinete próprio, com equipamento informático e a respectiva password de acesso, um cartão magnético com o número sequencial em relação aos cartões atribuídos aos empregados da Ré, constatando-se também que no exercício das suas funções o autor tinha como superiores hierárquicos o Director Geral e o Conselho de Administração da Ré e como subalternos os membros da equipa de colaboradores que integram a Direcção de Recursos Humanos. VIII – A tal conclusão não obsta a autonomia técnica própria das funções que exercia o Autor, nem as circunstâncias, de carácter formal, de ter sido acordado, no primeiro mês de vigência do contrato, que, para efeito de quitação das retribuições pagas, o Autor apresentaria, como veio a ocorrer, facturas ou recibos verdes, emitidos pela sociedade unipessoal de que era sócio-gerente e único suporte, e de a Ré não efectuar os descontos legais para a segurança Social e o Fisco. IX – Os tribunais só podem resolver segundo a equidade (artigo 4.º do Código Civil): a) quando haja disposição legal que o permita; b) quando haja acordo das partes e a relação jurídica não seja indisponível; c) quando as partes tenham previamente convencionado o recurso à equidade, nos termos aplicáveis à cláusula compromissória. X – Quanto à determinação das importâncias devidas em consequência de despedimento ilícito não se verifica qualquer das situações referidas no mencionado artigo 4.º, sendo que, em tal matéria, não é consentido o recurso a juízos de equidade, em face do disposto no artigo 13.º da LCCT (Regime Jurídico da Cessação do Contrato Individual de Trabalho e da Caducidade do Contrato de Trabalho a Termo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro), preceito de natureza imperativa (artigo 2.º, n.º 1, da LCCT). XI – Diversamente, no que toca à indemnização por danos não patrimoniais, o artigo 496.º, n.º 3, 1.ª parte, do Código Civil, consagra expressamente o apelo à equidade. XII – O Autor sofreu danos de ordem moral que justificam a tutela do direito, no circunstancialismo em que se apura que a Ré afixou na sua sede uma “Comunicação Interna”, na qual anunciava que o Autor deixava de exercer as funções na mesma, sem mais qualquer explicação ou esclarecimento, no dia seguinte foi executado o bloqueamento e interditado o acesso ao funcionamento do computador que lhe estava atribuído, tendo, no final do dia, quando o Autor saía das instalações da Ré, sido abordado pelos elementos da Segurança e, ao contrário do costume, foi por estes revistado, bem como o carro (do Autor) em que se fazia transportar e, posteriormente, no dia seguinte, quando se apresentou ao serviço, por ordens da Ré foi impedido de entrar nas suas instalações, tendo a imagem e dignidade do Autor sido afectados pelos comportamentos da Ré, vendo-se obrigado a recorrer aos favores de empréstimos junto de amigos e familiares para poder satisfazer e cumprir os seus compromissos e pagamento das despesas pessoais e familiares. XIII – Na sobredita situação, desconhecendo-se as condições económicas das partes e assumindo particular relevância a gravidade da culpa e da ilicitude dos factos, bem como a intensidade da ofensa ao sentimento de auto-estima e os consequentes sofrimentos de ordem psíquica, que demandaram apoio médico especializado, mostra-se adequada a indemnização ao Autor de € 15.000,00, a título de danos não patrimoniais.
Recurso n.º 2470/08 -4.ª Secção Vasques Dinis (Relator)* Bravo Serra Mário Pereira* Sumário do Relator