ACSTJ de 18-12-2008
Acidente de trabalho Trabalhador subordinado Contrato de prestação de serviços Contrato de trabalho Presunção Princípio da igualdade Constitucionalidade
I – Decorre do disposto no artigo 2.º, n.º 2, da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro (LAT), que se consideram trabalhadores por conta de outrem, para efeitos de protecção conferida por essa lei: (i) os que se encontrem vinculados por contrato de trabalho ou contrato equiparado; (ii) os que, encontrando-se na dependência económica da pessoa servida, prestem, em conjunto ou isoladamente, determinado serviço. II – O referido conceito de trabalhador por conta de outrem (definido no n.º 2, do artigo 2.º, da LAT), é mais abrangente do que aquele que contempla a parte que se obriga por força do negócio jurídico a que se reporta o artigo 1152.º do Código Civil, incluindo não só o trabalhador vinculado por contrato de trabalho, como também por contrato equiparado, entendendo-se, como tal, aquele a que falta a subordinação jurídica, mas em que o trabalhador se encontra na dependência económica do beneficiário da actividade. III – Tendo o trabalhador/sinistrado executado o trabalho para os réus, no máximo, num período, não ininterrupto, de 45 dias (início de Março a 15 de Abril de 2005), não se verifica um dos requisitos indispensáveis ao funcionamento da presunção da existência de trabalho subordinado prevista no artigo 12.º do Código do Trabalho. IV – Não pode concluir-se pela existência de um contrato de trabalho, ou contrato legalmente equiparado, se da matéria de facto apenas resulta ter o réu contratado o sinistrado para, em dias de folga disponíveis (já que trabalhava com carácter permanente para uma empresa, e mesmo nos dias de folga de que dispunha nessa empresa podia trabalhar para outras pessoas/entidades, que não aquele réu), mediante o pagamento de € 20,00, por cada meio-dia, colaborar no corte, limpeza, desbaste e arrumação de árvores num determinado prédio rústico – sendo essa actividade que desenvolvia à data do acidente –, tendo o réu definido o trabalho a realizar. V – Para que se verifique a dependência económica do trabalhador em relação ao beneficiário da actividade é necessário que a remuneração auferida pelo trabalhador (ou pelo prestador de serviços) constitua a totalidade ou a parte principal dos seus meios de subsistência. VI – No circunstancialismo referido em IV, não se verifica a referida dependência económica do trabalhador/sinistrado em relação ao réu, se os rendimentos do trabalho que desenvolvia para o réu, ou para outras pessoas que lhe solicitassem, constituíam meros suplementos extraordinários do orçamento familiar. VII – O princípio constitucional da igualdade, na vertente de reparação de acidentes de trabalho, visa que, em caso de acidente qualificado como de trabalho, o trabalhador não seja discriminado em relação a outros trabalhadores (em função do sexo, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas) quanto à justa reparação. VIII – Todavia, do referido princípio constitucional não decorre o que deve entender-se por acidente de trabalho, ou que todo e qualquer acidente sofrido por um trabalhador deva ser qualificado como de trabalho e ser objecto de reparação nos termos previstos na LAT: cabe a esta definir o que deve entender-se por acidente de trabalho e as situações em que deve haver lugar à reparação do mesmo, sendo, então, nessa situação, que de acordo com aquele princípio constitucional deve ser respeitado o princípio da igualdade quanto a uma justa reparação do acidente. IX – Assim, definindo a lei, de modo objectivo, as situações em que o acidente é de qualificar como de trabalho, não pode concluir-se pela violação do princípio da igualdade quanto à não reparação como acidente como de trabalho, do sinistro sofrido em virtude de o sinistrado não poder ser considerado trabalhador por conta de outrem. X - Por um lado, não pode comparar-se, em termos de igualdade, a actividade desenvolvida pelo sinistrado – incluindo o modo como era exercida –, com a(s) actividade(s) desenvolvida(s) – incluindo, também, a forma como é (são) exercida(s) –, por outro(s) trabalhador(es)/sinistrado(s), e que a LAT qualifica como actividade exercida por conta de outrem nos termos do seu art. 2.º, n.º 2; por outro, não se verifica discriminação do sinistrado (ao exercer a actividade referida em IV) em relação a qualquer outro trabalhador/sinistrado que exercesse idêntica actividade nos mesmos moldes, uma vez que também nesta situação o acidente não seria de qualificar como de trabalho.
Recurso n.º 2268/08 -4.ª Secção Vasques Dinis (Relator) Bravo Serra Mário Pereira * Sumário do Relator
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