ACSTJ de 03-12-2008
Acidente de trabalho Violação das regras de segurança Culpa do empregador Queda de laje de betão Impugnação da matéria de facto Ónus de alegação Auto de declarações Força probatória
I -Alegando os autores e a ré seguradora que a queda da laje tinha ocorrido pelo facto de o empregador ter ordenado a remoção das escoras que a sustentavam, antes do betão estar devidamente seco, a eles competia provar que essa tinha sido a razão da queda. II - Não tendo eles logrado fazer essa prova, o acidente não pode ser imputado a culpa do empregador. III - A Lei n.º 100/97, de 13/9, não contém disposição idêntica à do art.º 54.° do Decreto n.º 360/71, o mesmo acontecendo com o Decreto-Lei n.º 143/99, de 30/4, que a veio regulamentar. IV - Todavia, isso não significa que o regime da actual LAT seja mais restritivo do que o regime anterior, no que toca à culpa do empregador na produção do acidente quando este tenha resultado da violação das normas sobre segurança, higiene e saúde no trabalho, por parte do empregador ou seu representante. V - Com efeito, como decorre do confronto do art.º 18.° da Lei n.º 100/97 com o disposto na Base XVII, n.ºs 1 e 2, da Lei n.º 2127, aquela Lei deixou de distinguir o dolo da negligência, passando a responsabilidade agravada do empregador a existir em qualquer hipótese de culpa (a palavra provocado abrange o dolo e a mera culpa) e a falta de observância das regras sobre segurança, higiene e saúde no trabalho passou a constituir um fundamento autónomo do agravamento das prestações, o que não acontecia na Lei n.º 2127, pois aí não passava de uma mera presunção de culpa na produção do acidente. VI - Por outras palavras, na Lei n.º 100/97 a violação por parte do empregador ou do seu representante das mencionadas regras passou a constituir um caso de culpa efectiva e não um caso de culpa meramente presumida, como sucedia no regime anterior. VII - E compreende-se que assim seja, uma vez que a culpa, na sua forma de mera culpa ou negligência, se traduz na omissão da diligência, dos deveres de cuidado que um bom pai de família teria observado, em face das circunstâncias do caso, a fim de evitar o facto antijurídico que provocou o dano (art. 487.º, n.° 2, do CC). VIII - O disposto no art.º 690.º-A do CPC não impede que o recorrente impugne todos os pontos da matéria de facto. IX - O não cumprimento cabal do ónus previsto naquele artigo, relativamente a alguns dos pontos de facto objecto de impugnação, só implica a rejeição do recurso quanto a esses factos. X - O auto de declarações prestadas a um inspector do trabalho, no âmbito do inquérito levado a cabo pela Inspecção-Geral do Trabalho, relativamente a determinado acidente de trabalho, constitui um documento autêntico, mas a sua força probatória só abrange a emissão das declarações nele inseridas e não a veracidade dos factos que nelas são relatados.
Recurso n.º 2271/08 -4.ª Secção Sousa Peixoto (Relator)* Sousa Grandão Pinto Hespanhol
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