Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Sumários do STJ (Boletim) - Criminal
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ACSTJ de 07-05-2009
 Homicídio Assistente Legitimidade Interesse em agir
I -O princípio da oficialidade, que domina o nosso processo penal, faz do MP o detentor da acção penal, assumindo a queixa, ou a constituição de assistente e a dedução de acusação particular, a natureza de condições de procedibilidade, nos casos em que são exigidas para que haja procedimento criminal.
II - Por outro lado, a realização dos fins das penas é de interesse público, e está ao serviço, mesmo no caso dos crimes semi-públicos e particulares, de toda a comunidade. Não é uma pretensão que se identifique só ou prevalentemente com o interesse da vítima, do ofendido, ou de quem os represente. Daí que, desse carácter público do ius puniendi, se tenha que fazer eco o próprio processo penal.
III - O que dito fica não obsta a que o nosso sistema tenha integrado uma componente acusatória particular, através do assistente, mas que surge necessariamente numa posição subordinada em relação ao MP, e é apresentado como colaborador deste. Ou seja, como auxiliar do MP, na prossecução das finalidades que compete a este levar por diante, sob pena de se postergar o princípio da oficialidade acima invocado.
IV - É o que consagra o art. 69.º do CPP, no seu n.º 1, certo que se previnem situações pontuais, em que o assistente pode actuar com autonomia em relação ao MP. É o caso da hipótese da al. c) do n.º 2 do preceito, em que se permite a interposição de recurso por parte do assistente, desacompanhado do MP, das decisões que o afectem.
V - O art. 401.º do CPP refere-se, no seu n.º 1, à legitimidade dos vários sujeitos processuais para recorrer e, no seu n.º 2, distingue esta legitimidade do interesse em agir. Afirma então que “Não pode recorrer quem não tiver interesse em agir”. A propósito deste normativo, o Acórdão n.º 9/99 do Pleno deste STJ, de 30-10-97 (DR II Série -A, de 10-08-99), considerou que “O assistente não tem legitimidade para recorrer, desacompanhado do Ministério Público, relativamente à espécie e medida da pena aplicada, salvo quando demonstrar um concreto e próprio interesse em agir”.
VI - Não pode evidentemente extrair-se desse assento, a contrario, que haveria sempre interesse em agir, não estando em causa a espécie e medida da pena.
VII - Enquanto que a legitimidade do assistente se avalia para efeito de recurso, à partida, face ao seu posicionamento no processo perante a decisão proferida, assumindo pois um carácter mais subjectivo e formal, o interesse em agir resultará da análise da pretensão do recorrente, em concreto, quando confrontada com a respectiva necessidade ou indispensabilidade para fazer vingar um direito ou interesse seu. Em matéria de legitimidade averiguamos quem pode recorrer, e no domínio do interesse em agir apreciamos que interesse tem a pessoa que quer recorrer, em interpor aquele concreto recurso. É dizer, averiguamos se o direito ou interesse prosseguido pelo assistente é atendível para o efeito, tendo em conta o respectivo estatuto processual e, no limite, aquilo que se pretende com a punição.
VIII - A jurisprudência não tem, a este respeito, sido uniforme, e pode na verdade exigir-se, numa posição mais restritiva, que o assistente tem que demonstrar que só através do recurso assegura a tutela de um direito subjectivo seu. No extremo oposto estarão todos quantos entendem que a simples discordância do assistente em relação à justiça da decisão lhe atribui a possibilidade de recorrer confundindo-se legitimidade com interesse em agir. A nosso ver, a solução deverá situar-se, partindo da análise do caso concreto, num campo em que se evite a transposição pura e simples, para o domínio penal, da doutrina civilística dos pressupostos processuais, mas obviando também à subversão do princípio da oficialidade do processo penal bem como do papel do MP.
IX - O sancionamento penal dos delinquentes satisfaz um interesse colectivo que compete ao MP prosseguir. Não existe um direito pessoal público do assistente a um certa punição, como única forma de reparação moral sua, de tal modo que lhe fosse permitido exigir determinada prestação do tribunal na satisfação desse desiderato. Prestação que se cifraria numa decisão, em que se considerassem provados certos factos, que implicassem certa qualificação, e a aplicação de certa pena, pretendida pelo assistente.
X - Se a punição do arguido está dominada por um interesse público, não pode competir ao assistente ser ele o intérprete do interesse colectivo, designadamente se conflituar com a posição assumida a esse respeito pelo MP. No que contende com o cerne do ius puniendi do Estado, o assistente não pode pois deixar de estar subordinado ao MP.
XI - Daí que, sempre que o assistente pretenda recorrer desacompanhado do MP, não interesse tanto discriminar as situações em que terá um interesse em agir relevante (na linha do assento, concreto e pessoal), mas tão só excluir da possibilidade de recurso aquelas situações em que o assistente se confina ao interesse geral da justiça da punição do delinquente, porque esse é um interesse colectivo, e não pessoal, seu. Assistente que nestes autos, sublinhe-se, nem sequer foi vítima do crime.
Proc. n.º 579/09 -5.ª Secção Souto Moura (relator) ** Soares Ramos (“Vencido quanto ao não reconhecimento do interesse em recorrer, por parte da assistente, a quem julgo não dever impedir-se o propósito individual de pugnar pe