Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Sumários do STJ (Boletim) - Criminal
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ACSTJ de 19-03-2009
 Roubo agravado Caçadeira Confissão Arrependimento Atenuação especial da pena Medida da pena Prevenção geral Prevenção especial Culpa Medida concreta da pena
I -A confissão, ainda que relevante para a descoberta da verdade, não é no presente caso uma circunstância que tenha natureza excepcional. Na verdade, o arguido praticou 26 crimes de roubo em agências bancárias, portanto, em locais onde muita gente teve a oportunidade de o ver e identificar, tanto mais que, ao que parece, só actuou com a cara tapada num dos casos e, inclusivamente, repetiu assaltos nas mesmas agências bancárias. De resto, há no processo alguns autos positivos de reconhecimento pessoal. Para além de que se procedeu a diversas apreensões, nomeadamente, de dinheiro (com uma certa numeração) e de uma arma.
II - A confissão, portanto, terá sido relevante para se determinar com maior segurança a autoria de todos os 26 crimes, mas não se mostrou decisiva nem o principal meio de prova. Talvez tenha facilitado o decurso da audiência de julgamento, mas não foi pela confissão que a investigação criminal determinou a autoria dos crimes.
III - Do mesmo modo, o arrependimento não passou de uma mera “afirmação verbal” do arguido, pois é fácil dizê-lo ao tribunal e fazê-lo com ar contricto. Mais difícil teria sido o arguido ter-se entregue à polícia antes de ter sido capturado ou então fornecer à investigação criminal a identificação do seu comparsa nos dois casos em que não actuou sozinho, mas isso, que demonstraria um arrependimento sincero e activo, o arguido não fez.
IV - A colaboração com a investigação policial, portanto, não foi muito relevante. Onde estão as diversas armas que o arguido usou nos assaltos? O que fez o arguido aos mais de € 65 000 de que se apoderou? V -Cai pela base, assim, a atribuição de uma superior relevância à confissão, arrependimento, vergonha e colaboração com a autoridade policial, pois não passam de circunstâncias atendíveis na graduação da pena, mas que não são, ainda que sopesadas em conjunto, a tal “cláusula geral de atenuação especial” como válvula de segurança, destinada a acudir a situações extraordinárias ou excepcionais.
VI - O tribunal recorrido, com o devido respeito, fracassou rotundamente na fixação das penas, pois, mesmo que fossem de atenuar especialmente, não poderia perder de vista que o limite mínimo da pena concreta é o da prevenção geral, que existe para “tutela de bens jurídicos que se exprime no caso concreto...alcançando-se mediante a estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma jurídica violada...”.
VII - Nunca as expectativas comunitárias por um assalto à mão armada a agências bancárias, em horário de expediente, com uso de armas de fogo, algumas com um grande poder mortífero (como as caçadeiras de cano serrado), ficariam estabilizadas com uma punição em concreto na ordem dos sete meses de prisão (aliás, abaixo do limite mínimo abstracto da pena, mesmo da especialmente atenuada), pois essa é uma pena própria da pequeníssima criminalidade, do pequeno furto, das ofensas à integridade física simples, das injúrias, não a que a sociedade reclama para a alta criminalidade, potencialmente violenta ou mesmo muito violenta, ainda que não chegue a haver disparos.
VIII - Quanto ao máximo da pena concreta, há-de corresponder ao limite da culpa. Ora, o arguido agiu com elevadíssimo grau de culpa, pois praticou crimes como os indicados por 26 vezes no decurso de 1 ano e 8 meses, o que demonstra um modo de vida e, mesmo, uma tendência acentuada para a criminalidade violenta. Note-se que o facto do arguido nunca ter chegado a usar da força física ou das armas que levava não retira violência ao facto criminoso, pois as pessoas visadas são seriamente ameaçadas, de morte, e nunca se sabe se, numa situação de grande stress quer para o arguido quer para as vítimas, se passa das palavras aos actos. E nada indica na matéria de facto provada que as armas não estivesse municiadas e prontas a disparar.
IX - Assim há que revogar a decisão da 1.ª instância que o condenou pela prática de 26 crimes de roubo qualificado, com atenuação especial, na pena de 7 meses de prisão por cada um e na pena conjunta de 3 anos de prisão, suspensa na sua execução por 3 anos, substituindo-a por outra que o condene a 1 ano de prisão pelo crime de roubo simples, 1 ano de prisão pelo crime de detenção de arma proibida, 3 anos de prisão por cada um de onze crimes de roubo qualificado, 3 anos e 6 meses de prisão por cada um de outros onze crimes de roubo qualificado, 4 anos de prisão por cada um de outros três crimes de roubo qualificado e na pena conjunta e única de 9 (nove) anos de prisão.
Proc. n.º 387/09 -5.ª Secção Santos Carvalho (relator) * Rodrigues da Costa