Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Sumários do STJ (Boletim) - Criminal
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ACSTJ de 12-03-2009
 Infracção de regras de construção Agravação pelo resultado Morte Pedido de indemnização civil Indemnização Direito à vida Danos não patrimoniais Recurso da matéria de facto Competência do Supremo Tribunal de Justiça Competência da Relação Duplo
I -O conhecimento de recurso em matéria de facto, interposto de decisão final do tribunal colectivo, é só da competência do Tribunal da Relação, mesmo tratando-se da mera invocação dos vícios do art. 410.° do CPP. Ainda que se apele para a garantia de incidência constitucional, de um duplo grau de jurisdição também em matéria de facto, ela fica preservada, devendo apenas, se for o caso, optar o recorrente pela interposição do recurso para a Relação quando invocar os vícios do art. 410.º do CPP.
II - Acontece porém que, ao pronunciar-se de direito, nos recursos que para si se interponham, o STJ tem que dispor de uma base factual escorreita, no sentido de se apresentar expurgada de eventuais insuficiências, erros de apreciação ou contradições que se revelem ostensivos. Por isso conhece dos vícios aludidos por sua iniciativa. Aliás, tem mesmo de os conhecer, nos termos do acórdão para fixação de jurisprudência de 19-01-1995, do Pleno das Secções Criminais deste STJ (Proc. n.º 46580 -3.ª, in DR, 1.ª Série -A, de 28-12-1995).
III - A insuficiência da matéria de facto para a decisão implica a falta de factos provados que autorizem a ilação jurídica tirada. É uma lacuna de factos, que se revela internamente, só a expensas da própria sentença, sempre no cotejo com a decisão. Mas não se confunde com a eventual falta de provas para que se pudessem dar por provados os factos que se consideraram provados.
IV - O erro notório na apreciação da prova, como tem sido repetido à saciedade, na jurisprudência deste STJ, tem que decorrer da decisão recorrida ela mesma. Por si só, ou conjugada com as regras da experiência comum. Tem também que ser um erro patente, evidente, perceptível por um qualquer cidadão médio. E não configura um erro claro e patente o entendimento que possa traduzir-se numa leitura possível, aceitável, razoável, da prova produzida.
V - A contradição insanável da fundamentação pode ser perceptível, antes do mais, na motivação da convicção do julgador que levou a que se desse por provado certo facto. Mas também pode decorrer dos próprios factos dados por provados e por não provados. Quanto à contradição entre a fundamentação e a decisão, resultará ela, em princípio, da fundamentação apontar num sentido e a decisão ir noutro sentido. A contradição tem que ser inultrapassável, apesar de se recorrer à apreciação da decisão no seu todo, ou a regras da experiência, para que possa relevar, em termos de nulidade.
VI - Em matéria de quantum indemnizatório, o recorrente vem referir que a demandante pediu pela perda do direito à vida do marido € 16 626,596 e a decisão condenatória da 1.ª instância, confirmada pela Relação, quanto à indemnização pela violação desse direito, foi de € 45 000. Teria havido, pois, violação do n.º 1 do art. 661.º do CPC.
VII - Vem-se entendendo pacificamente que “O tribunal não está impedido de, na quantificação parcelar, chegar a parcela ou parcelas de valor superior ao indicado pelo autor, desde que o valor final global não ultrapasse o valor peticionado” (cf. Ac. deste STJ de 03-05-2007, Proc. n.º 4493/06 -7.ª). Ou então que “O limite da condenação situa-se na soma global e não nas várias parcelas do pedido, isoladamente consideradas” (idem, de 04-10-2007, Proc. n.º 2666/07 -2.ª). Considerando que o total do pedido da demandante foi de € 209 505,55 e o total da condenação foi em € 50 000, o recurso, nesta parte, não pode deixar de ser improcedente.
VIII - O recorrente vem dizer que foi condenado em indemnização por danos morais, relativamente ao desgosto sofrido pela demandante, em € 5000, e, no entanto, não foi feita prova de que esta tenha sentido dor pela morte do marido. Deu-se por provado que a vítima faleceu no estado de casado com a demandante, com a qual vivia na data da sua morte. E que esta sentiu dor e desgosto com a morte do marido. Na decisão recorrida refere-se: 'No que respeita ao facto provado n.º …, referente ao pedido de indemnização civil, o mesmo resulta das regras da experiência e senso comuns, pois mostrando-se apurado que a vítima faleceu no estado de casado com a demandante, com quem vivia na data da sua morte, é notório e lógico que esta tenha sentido dor e desgosto com a morte do marido e companheiro'. Não é difícil retirar de toda a prova produzida a ilação, conforme à mais elementar das experiências da vida, de que a demandante teve um sofrimento, com a perda do seu marido, de 49 anos, e com quem vivia quando ele faleceu, pelo que ainda aqui improcede o recurso.
Proc. n.º 3173/08 -5.ª Secção Souto Moura (relator) ** Soares Ramos