ACSTJ de 26-02-2009
Recurso da matéria de facto Ónus da impugnação especificada Competência da Relação Princípio da investigação Princípio da verdade material Princípio do contraditório Princípio da igualdade de armas
I -As regras legais que impõem um ónus de impugnação especificada ao recorrente, no recurso da matéria de facto que visa uma modificação da decisão por haver desconformidade entre os factos provados ou não provados e a prova efectivamente produzida na audiência, não existem apenas para facilitar a tarefa do tribunal de recurso. II - É que o recurso não é um novo julgamento, em que a 2.ª instância aprecia toda a prova produzida e documentada em 1.ª instância, como se o julgamento ali realizado não existisse; antes é um remédio jurídico destinado a colmatar erros que devem ser identificados e individualizados, com menção das provas que os evidenciam e indicação concreta, por referência à acta, das passagens em que se funda a impugnação. III - Por isso, a impugnação especificada que o recorrente está obrigado a observar é uma imposição legal cujo cumprimento ou não cumprimento afecta os direitos dos recorridos. Estes, para defesa dos seus direitos, têm de saber quais os pontos da matéria de facto de que o recorrente discorda, que provas exigem a pretendida modificação e onde elas estão documentadas, pois só assim pode, eficazmente, indicar que outras provas foram produzidas quanto a esses pontos controvertidos e onde estão, por sua vez, documentadas. IV - Pela mesma razão, o tribunal de recurso não pode realizar, por sua conta e risco, uma reponderação da matéria de facto, sem uma prévia definição pelo recorrente de quais os factos que quer ver reapreciados. É certo que, no nosso sistema judicial, são muito importantes os princípios da investigação oficiosa e da descoberta da verdade material. Mas não o são menos os do exercício do contraditório e da igualdade de armas, para que o processo se desenrole de acordo com o due process of law, tão caro aos sistemas judiciais não totalitários: a ideia de que os processos judiciais devem ser justos.
Proc. n.º 3270/08 -5.ª Secção
Rodrigues da Costa (relator)
Arménio Sottomayor
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