Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
Actualidade | Jurisprudência | Legislação pesquisa:


    Sumários do STJ (Boletim) - Criminal
Procurar: Assunto    Área   Frase
Processo   Sec.                     Ver todos
ACSTJ de 05-02-2009
 Legitimidade Ónus da prova Responsabilidade civil emergente de crime Acidente de viação Transporte de passageiro Condução de veículo em estado de embriaguez Nexo de causalidade Negligência Concorrência de culpas Danos não patrimoniais
I -Conforme é jurisprudência pacífica a expressão «em conjunto» do n.º 2 do art. 496.º do CC significa que os herdeiros participam simultaneamente na titularidade do direito, pelo que devem propor a acção em litisconsórcio necessário activo.
II - Se a recorrente parte civil entende que há ilegitimidade da demandante por preterição de outros herdeiros na linha sucessória ou por desrespeito do litisconsórcio necessário activo, terá de alegar e de provar que a vítima, apesar de solteiro, tem algum filho ou que o pai ainda é vivo e que concorre juntamente com a mãe, não lhe bastando alegar que pode a vítima ter um filho ou que pode o pai ainda estar vivo, pois o ónus de provar a excepção dilatória cabe a quem a invocou (art. 516.º do CPC).
III - Mostram-se provados, entre outros, os seguintes factos: -“o arguido MM conduzia o veículo ligeiro de mercadorias …, transportando … na caixa aberta, MS, a aqui vítima; -o arguido insistiu com esta para que se acomodasse na cabine do veículo, o que aquela não quis; -… o arguido conduzia com uma TAS de 1,01 g/l; -ao entrar na … canada, o arguido fê-lo a uma velocidade inapropriada à inclinação da via o que fez com que o veículo ganhasse ainda mais velocidade (…) perdeu, então, o controlo do veículo que, a cerca de 100 m a 200 m do início da canada embateu num muro de pedra à direita da via, atento o sentido de marcha do veículo, e 30 m depois num muro de uma residência situada à esquerda da via, … provocando o capotamento do veículo sobre o lado direito; -por força deste embate MS foi projectado para o solo, tendo sofrido (…) lesões que foram a causa directa da sua morte”.
IV - O arguido é o principal responsável pela ocorrência do acidente, pois não só conduzia em estado de embriaguez, como imprimiu ao veículo uma velocidade tal que não lhe permitiu controlá-lo sem entrar em despiste, como ainda transportava um passageiro (a vítima) sem ser nos assentos apropriados e sem a colocação do cinto de segurança, infringindo o disposto nos arts. 81.º, n.ºs 1, 2, 3, e 5, al. b), 24.º, 25.º, als. c) e e), e 54.º, n.º 4, todos do CEst, sendo certo que a primeira infracção é considerada uma contra-ordenação muito grave [art. 146.º, al. j)].
V - A lei estradal considera responsável pela contra-ordenação (no caso, o transporte de passageiros fora dos assentos do veículo), o respectivo condutor e não o passageiro – art. 135.º, n.º 3, al. a), do CEst.
VI - O passageiro que aceita ser transportado na caixa de carga de um veículo de mercadorias sabe que está a colocar-se numa situação de enorme risco para a sua própria integridade física, mesmo que não haja qualquer acidente, pois um ressalto do veículo na estrada pode propiciar, em pleno andamento, a sua projecção ao solo.
VII - A vítima também actuou com negligência, pois não agiu com a prudência de um homem médio, colocado na mesma situação e com o mesmo grau de conhecimentos – art. 487.º, n.º 2, do CC.
VIII - A culpa da vítima, assim estabelecida, foi causal, não quanto à produção do acidente, este da inteira responsabilidade do condutor do veículo, mas em relação à produção dos danos indemnizáveis, pois se fosse sentado no assento próprio do veículo, com o cinto de segurança colocado, como era seu dever e como era dever também do condutor do veículo, poderia, apesar do acidente, nada ter sofrido ou muito menos teria sofrido.
IX - Na produção dos danos indemnizáveis é, pois, a vítima parcialmente responsável conjuntamente com o condutor do veículo, embora em menor grau do que este, pelo que, para o efeito de repartição de culpas (art. 570.º, n.º 1, do CC), atribui-se 80% de responsabilidade ao condutor e 20% à vítima.
Proc. n.º 3181/08 -5.ª Secção Arménio Sottomayor (relator) Souto Moura