Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Sumários do STJ (Boletim) - Criminal
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ACSTJ de 11-02-2009
 Indemnização Danos não patrimoniais Equidade Homicídio Tentativa
I -Dispõe o art. 496.º, n.º 1, do CC que na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito e, segundo o n.º 3 do mesmo preceito, o montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no art. 494.º, designadamente o grau de culpabilidade do agente e a situação económica deste e do lesado.
II - Na indemnização pelo dano não patrimonial o pretium doloris deve ser fixado por recurso a critérios de equidade, de modo a proporcionar ao lesado momentos de prazer que, de algum modo, contribuam para atenuar a dor sofrida – Ac. deste STJ de 07-11-2006, Proc. n.º 3349/06 -1.ª.
III - A expressão «em qualquer caso» abrange tanto o dolo como a mera culpa – cf. CJ 1986, tomo 2, pág. 233, e Vaz Serra, RLJ 113.º/96.
IV - «Demais circunstâncias do caso» é uma expressão genérica que pretende referir-se a todos os elementos concretos caracterizadores da gravidade do dano, incluindo a desvalorização da moeda.
V - Equidade não é sinónimo de arbitrariedade, mas sim um critério para a correcção do direito, em ordem a que se tenham em consideração, fundamentalmente, as circunstâncias do caso concreto.
VI - A indemnização por danos não patrimoniais, para responder, actualizadamente, ao comando do art. 496.º do CC e, porque visa oferecer ao lesado uma compensação que contrabalance o mal sofrido, deve ser significativa e não meramente simbólica, devendo o juiz, ao fixá-la segundo critérios de equidade, procurar um justo grau de “compensação” – cf., por ex., o Ac. do STJ de 11-09-1994 (CJSTJ 1994, tomo 3, pág. 92).
VII - Para que o dano não patrimonial mereça a tutela do direito tem de ser grave, devendo essa gravidade avaliar-se por critérios objectivos, e não de harmonia com percepções subjectivas, ou da sensibilidade danosa particularmente sentida pelo lesado – cf. Ac. do STJ de 18-12-2007, in www.dgsi.pt.
VIII - Estando em causa a fixação do valor da indemnização por danos não patrimoniais, necessariamente com apelo a um julgamento segundo a equidade, o tribunal de recurso deve limitar a sua intervenção às hipóteses em que o tribunal recorrido afronte, manifestamente, «as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas e de criteriosa ponderação das realidades da vida» – cf. Acs. do STJ de 17-06-2004, Proc. n.º 2364/04 -5.ª, e de 03-07-2008, Proc. n.º 1226/08 -5.ª.
IX - Vindo provado, para além do mais, que: -os factos ocorreram em 20-08-2007; -a ofendida não quis corresponder aos desejos do arguido de se aproximar de si e refazerem a vida em comum; -o arguido efectuou dois disparos, tendo a ofendida sido atingida pelo menos com um tiro no antebraço esquerdo, mão direita, mama esquerda e região abdominal; -o arguido agiu de forma livre, consciente e voluntária, com o propósito de tirar a vida à ofendida, o que não conseguiu por não ter atingido nenhum órgão vital e por a ofendida ter sido prontamente socorrida, tudo circunstâncias alheias à vontade daquele, sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei; -como consequência directa e necessária dos disparos efectuados pelo arguido, resultaram para a ofendida múltiplas feridas dermoabrasivas nas regiões abdominal, mamária esquerda e da mão direita, e esfacelo do terço inferior do antebraço esquerdo, com perda cutânea e óssea, fractura cominutiva do rádio e cúbito; -na sequência das lesões referidas, a ofendida foi assistida no Centro Hospitalar de Lisboa, E.P.E., onde ficou internada de 21-08-2007 a 11-09-2007, «a que correspondeu desbridamento de feridas e enxerto de pele, diagnóstico principal de ferida aberta, por transtorno do sistema osteomuscular e do tecido conjuntivo, excepto na mão», internamento em 20-09-2007 «para outros procedimentos na pele/tecido celular subcutânea e mama, sem Cc e um episódio de consulta em 25 de Setembro do mesmo ano» (ponto 14 dos factos provados); -em Janeiro de 2008, a ofendida não se encontrava curada, apresentando deformação acentuada da extremidade distal do antebraço esquerdo, tendo levado até essa data um período de 150 dias de doença, com incapacidade para o trabalho; -a ofendida teve de ser submetida a intervenções cirúrgicas; -em 21-08-2007 a ofendida encontrava-se a trabalhar; -no período mencionado no ponto 14 dos factos provados, a ofendida ficou dependente de terceiros, tendo o seu filho metido baixa para a assistir durante um mês e meio; -em 21-08-2007, a ofendida era uma pessoa capaz, válida e sem defeito físico; -a ofendida sofreu e sofre dores físicas; tem-se por significativa e adequadamente compensatória a indemnização de € 30 000 por danos não patrimoniais.
Proc. n.º 313/09 -3.ª Secção Pires da Graça (relator) Raul Borges