Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Sumários do STJ (Boletim) - Criminal
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ACSTJ de 04-02-2009
 Tráfico de estupefacientes Admissibilidade de recurso Aplicação da lei no tempo Direito ao recurso Duplo grau de jurisdição Acórdão da Relação Notificação Competência do Supremo Tribunal de Justiça Vícios do art. 410.º do Código de Processo Penal
I -Numa situação em que o crime pelo qual a arguida foi condenada é o de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art. 21.º, n.º 1, do 15/93, de 22-01, sendo de 8 anos a pena concreta em que foi condenada, por decisão da 1.ª instância de 28-09-2007, confirmada na Relação por acórdão de 17-07-2008, podemos concluir que: -face à anterior redacção do art. 400.º, n.º 1, al. f), do CPP era admissível recurso até ao STJ, uma vez que, de acordo com a moldura penal abstracta respectiva, tal crime é punível com pena de prisão superior a 8 anos (pena de 4 a 12 anos de prisão) e o acórdão é condenatório; -à luz da actual redacção do preceito, introduzida pela Lei 48/2007, de 29-08, já não é permitido o recurso para o STJ, pois o acórdão da Relação (de que se pretende recorrer) é condenatório e confirmou, em recurso, a pena de 8 anos de prisão – logo, não superior a tal limite – aplicada por decisão da 1.ª instância.
II - Com efeito, à data em que foi proferido o acórdão da 1.ª instância – 28-09-2007 – estava já em vigor a nova redacção dada ao referido preceito, que não permite o recurso de acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas Relações que confirmem decisão de 1.ª instância e apliquem pena de prisão não superior a 8 anos.
III - Sendo assim, da aplicação imediata deste preceito legal não resulta agravamento sensível da posição da arguida. Na verdade, até ao momento em que foi proferido o acórdão da 1.ª instância, a arguida ainda não tinha o direito de recorrer, pois tal direito só se concretiza quando é proferida a decisão recorrida e se esta lhe for desfavorável.
IV - Deste modo, quer à data da decisão da 1.ª instância, quer à data do acórdão da Relação, a arguida não tinha o direito de interpor recurso para o STJ, pelo que não se pode afirmar que, agora, se esteja a retirar-lhe o direito a tal recurso: até ser proferido o acórdão da Relação, a arguida apenas tinha uma expectativa de poder recorrer para o Supremo Tribunal se a decisão da Relação fosse contrária às suas pretensões e não fosse subsumível à previsão da citada al. f) do n.º 1 do art. 400.º do CPP. Porém, essa expectativa não tem protecção jurídica (neste sentido, cf. os Acs. deste STJ proferidos nos Procs. n.ºs 4562/07 e 4828/07, ambos da 5.ª Secção, e Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário ao CPP, pág. 997, anotação 12).
V - Por outro lado, o direito da arguida ao recurso – o direito que esta tem de ver reexaminada a causa por um tribunal superior – já lhe foi assegurado e até já o exerceu (ao interpor recurso para o Tribunal da Relação). Acresce que o direito de defesa da arguida, consagrado constitucionalmente no art. 32.º, n.º 2, da CRP, não exige um duplo grau de recurso mas apenas um duplo grau de jurisdição.
VI - Não ficando limitado o direito de defesa da arguida nem se verificando um agravamento sensível da sua posição com a aplicação imediata do art. 400.º, n.º 1, al. f), do CPP, é de rejeitar o recurso, por legalmente inadmissível (arts. 420.º, n.º 1, e 414.º, n.º 2, ambos do CPP).
VII - Nos termos do art. 113.º do CPP, as decisões relativas à sentença devem ser notificadas aos sujeitos processuais por ela visados e aos respectivos advogados, valendo a data da última notificação como termo inicial de qualquer prazo para a prática de acto processual subsequente.
VIII - Já a notificação de acórdão dos tribunais de recurso, que não se mostra incluído no elenco da lei, deve ser feita apenas aos defensores e advogados. E tal entendimento já foi considerado conforme aos preceitos constitucionais pelos Acs. do TC n.ºs 59/99 e 476/2004, de 02-07-2004.
IX - Anteriormente a 01-01-1999 encontrava-se estabelecido um sistema de “revista ampliada” que, em caso de recurso, permitia a intromissão do STJ em aspectos fácticos, mesmo nos casos em que o conhecimento se restringia a matéria de direito, embora de forma mitigada, pois o reexame da matéria de facto apenas poderia ter lugar através da análise do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, e podendo o recorrente invocar como fundamento do recurso os vícios do art. 410.º, n.º 2, do CPP.
X - Após a reforma do processo penal introduzida pela Lei 59/98, de 25-08, deixou de ser possível recorrer para este Supremo Tribunal com fundamento na existência de qualquer dos vícios referidos nas várias alíneas do art. 410.º, n.º 2, do CPP. Não obstante, este Tribunal pode ainda deles conhecer, mas por iniciativa própria, para evitar que a decisão de direito se apoie em matéria de facto claramente insuficiente, fundada em erro de apreciação ou assente em premissas contraditórias, detectadas por sua iniciativa, ou seja, se concluir que, por força da existência de qualquer daqueles vícios, não pode chegar a uma correcta solução de direito, e devendo sempre o conhecimento oficioso ser encarado como excepcional, surgindo como último remédio contra tais vícios.
XI - Por outro lado, continua em vigor o acórdão do plenário das Secções Criminais do STJ, de 19-09-1995, in DR I Série-A, de 28-12-1995, que, no âmbito do sistema de revista alargada, decidiu ser oficioso, pelo tribunal de recurso, o conhecimento dos vícios indicados no art. 410.º, n.º 2, do CPP, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito.
Proc. n.º 3461/08 -3.ª Secção Fernando Fróis (relator) Henriques Gaspar