Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Sumários do STJ (Boletim) - Criminal
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ACSTJ de 04-02-2009
 Excepcional complexidade Audição do arguido Irregularidade Notificação Habeas corpus Âmbito da providência Prazo da prisão preventiva
I -Numa situação em que à data em que o requerente foi constituído arguido já o processo tinha sido declarado de excepcional complexidade é óbvio que não podia ser ouvido sobre o objecto de tal despacho.
II - Mesmo a não audição prévia de arguidos sobre a declaração de excepcional complexidade do processo é susceptível de consubstanciar uma irregularidade (art. 118.º, n.ºs 1 e 2, do CPP), já que tal omissão não consta das nulidades insanáveis, nem das dependentes de arguição (arts. 119.º e 120.º do CPP), nem se encontra configurada como tal, quer no âmbito do art. 61.º do CPP, quer nos termos do art. 215.º do CPP; aliás, nem sequer estes normativos identificam e estabelecem qualquer cominação para o caso de violação da injunção contida nos preceitos.
III - A situação omissiva de audição prévia de arguido, perante um despacho subsequente declarando o processo de especial complexidade, é constitutiva de objecto de recurso ordinário, não se afigurando enquadrável no objecto do habeas corpus, que, como providência excepcional, se destina a reagir contra situações clamorosas e abusivas de prisão grosseiramente ilegal.
IV - O facto de o arguido não poder ter sido ouvido sobre tal despacho não invalida a sua eficácia sobre a elevação do prazo de duração máxima da prisão preventiva em que o arguido se encontra, uma vez que esse despacho se destinou a ampliar aquele limite temporal para qualquer arguido em prisão preventiva naquele processo, quer os nessa situação à data da decisão, quer os posteriormente constituídos no mesmo processo.
V - Nem consta da lei a obrigatoriedade de notificação desse despacho a arguido constituído como tal posteriormente ao mesmo, o que bem se compreende face à natureza e funcionalidade desse despacho, que, tendo sido produzido de forma legalmente válida, e não sendo infirmado, transita.
VI - Transitando o despacho de declaração de excepcional complexidade, a audição de arguido constituído posteriormente a essa decisão, sobre o objecto da mesma, revela-se processualmente como um acto inútil.
VII - O habeas corpus não se destina a formular juízos de mérito sobre as decisões judiciais determinantes da privação de liberdade, ou a sindicar nulidades ou irregularidades nessas decisões – para isso servem os recursos ordinários –, mas tão-só a verificar, de forma expedita, se os pressupostos de qualquer prisão constituem patologia desviante (abuso de poder ou erro grosseiro) enquadrável no disposto nas três alíneas do n.º 2 do art. 222.º do CPP.
VIII - O habeas corpus é assim, e apenas, um meio excepcional de controlo da legalidade da prisão, estritamente vinculado aos pressupostos e limites determinados pela lei.
IX - Nesta providência excepcional há apenas que determinar, quando o fundamento da petição se refira a uma dada situação processual do requerente, se os actos de um determinado processo, valendo os efeitos que em cada momento nele produzam – e independentemente da discussão que aí possam suscitar, segundo o regime normal dos recursos –, se revestem de alguma consequência que se possa acolher aos fundamentos da petição referidos no art. 222.º, n.º 2, do CPP. X-In casu, a providência de habeas corpus não se destina a ajuizar sobre a bondade do despacho que declarou a especial complexidade dos autos, nem a ajuizar e decidir sobre a escolha e aplicação da medida de coacção, nem se tal declaração de especial complexidade devia ou não ser notificada ao arguido ora recorrente, mas sim se tal despacho produziu algum efeito que se possa integrar no n.º 2 do art. 222.º do CPP.
XI - Tendo em consideração que: -o crime por que se encontra indiciado o requerente é punível com pena de prisão superior a 8 anos; -o processo foi declarado de excepcional complexidade na 1.ª instância, por despacho do juiz de instrução criminal, entidade competente para o proferir, em inquérito; -por força de tal despacho, o prazo da al. a) do n.º 1 do art. 215.º do CPP é elevado para 1 ano, nos termos do seu n.º 3; -o peticionante encontra-se em prisão preventiva desde 06-06-2008; ainda não decorreu o prazo máximo de duração da prisão preventiva no âmbito do art. 215.º, n.º 3, do CPP, que só terminará – se não tiver sido deduzida acusação – em 06-062009.
XII - Não se prefigurando situação de abuso de poder, consubstanciador de atentado ilegítimo à liberdade individual – grave, grosseiro e rapidamente verificável –, que integre qualquer das hipóteses previstas no art. 222.º, n.º 2, do CPP, é de indeferir a providência de habeas corpus.
Proc. n.º 325/09 -3.ª Secção Pires da Graça (relator) Raul Borges Pereira Madeira