ACSTJ de 27-01-2009
Concurso de infracções Conhecimento superveniente Cúmulo jurídico Pena cumprida Pena única Cúmulo por arrastamento
I -Ocasode concurso por conhecimento superveniente tem lugar quando, posteriormente à condenação, se vem a verificar que o agente, anteriormente àquela condenação, praticou outro ou outros crimes. Nestas situações são aplicáveis as regras dos arts. 77.º, n.º 2, e 78.º, n.º 1, do CP, não dispensando o legislador a interacção entre as duas normas. II - A nova redacção do art. 78.º, n.º 1, do CP (introduzida pela Lei 59/2007, de 04-09, com a supressão do trecho «mas antes de a respectiva pena estar cumprida, prescrita ou extinta», veio, diversamente do que ocorria antes, prescrever que o conhecimento superveniente de novo crime que se integre no concurso não exclui, antes passou a abranger, as penas já cumpridas, prescritas ou extintas, procedendo-se ao desconto da pena já cumprida (neste sentido se pronunciava alguma jurisprudência, como, por exemplo, os Acs. do STJ de 2405-2000, CJSTJ 2000, tomo 2, pág. 204, e de 30-05-2001, CJSTJ 2001, tomo 2, pág. 211; em sentido oposto, os Acs. de 09-02-2005, CJSTJ 2005, tomo 1, pág.194, de 08-06-2006, Proc. n.º 1558/06 -5.ª, de 22-06-2006, Proc. n.º 1570/06 -5.ª – este com um voto de vencido –, e de 15-11-2006, Proc. n.º 1795/06 -3.ª). III - Como é dominantemente entendido, o momento temporal decisivo para o estabelecimento de relação de concurso (ou a sua exclusão) é o trânsito em julgado de qualquer das decisões, sendo esse o momento em que surge, de modo definitivo e seguro, a solene advertência ao arguido. IV - O trânsito em julgado obstará a que com essa infracção, ou outras cometidas até esse momento, se cumulem infracções que venham a ser praticadas posteriormente a esse mesmo trânsito, que funcionará assim como barreira excludente, não permitindo o ingresso no círculo dos crimes em concurso dos cometidos após aquele limite. V - A consideração numa pena única de penas aplicadas pela prática de crimes cometidos após o trânsito em julgado de uma das condenações em confronto parece contender com o próprio fundamento da figura do cúmulo jurídico, para cuja avaliação se faz uma análise conjunta dos factos praticados pelo agente antes de sofrer uma solene advertência. VI - Concretizada a admonição na condenação transitada, encerrado um ciclo de vida, impõe-se que o arguido a interiorize, repense e analise de forma crítica o seu comportamento anterior, e projecte o futuro em moldes mais conformes com o direito, de tal modo que, a sucumbir, iniciando um ciclo novo, reincidirá. VII - Como o STJ tem vindo a entender, não são de admitir os cúmulos por arrastamento, podendo ver-se nesse sentido, na doutrina, Germano Marques da Silva (Direito Penal Português, Parte Geral, vol. II, pág. 313), Paulo Dá Mesquita (Concurso de Penas, pág. 45) e Vera Lúcia Raposo (in RPCC, Ano 13.º, n.º 4, Outubro/Dezembro de 2003, pág. 592).
Proc. n.º 4032/08 -3.ª Secção
Raul Borges (relator)
Fernando Fróis
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