ACSTJ de 21-01-2009
Recurso de revisão Novos factos Novos meios de prova Conhecimento superveniente Graves dúvidas sobre a justiça da condenação Estrangeiro Pena de expulsão
I -Na al. d) do n.º 1 do art. 449.º o legislador admite a revisão se se verificarem, cumulativamente, dois requisitos: a descoberta de factos ou meios de prova novos, ou seja, que não tivessem sido levados em conta pela decisão condenatória; e a emergência, face à descoberta de tais factos ou meios de prova, de graves dúvidas sobre a justiça da condenação. II - A justiça da condenação reporta-se exclusivamente à imputação do crime, das sanções principais e acessórias, bem como à atribuição da indemnização civil. Será injusta a sentença que, mercê do desconhecimento de determinados factos ou meios de prova relevantes para a condenação ou a absolvição do arguido e/ou demandado, condene em pena principal ou acessória, ou no pedido civil, quando decidiria em sentido oposto (absolvição) no caso de conhecer esses factos. III - A questão de saber se poderá haver revisão com base em factos supervenientes à sentença condenatória não está isenta de dúvidas: -pode argumentar-se, por um lado, que é inequívoco que a decisão é justa no momento em que é proferida, pois considerou todos os factos que lhe foram apresentados e todos os factos relevantes, conhecidos ou não do tribunal – sendo justa, não pode ser submetida a correcção; -em contrapartida, poderá defender-se que a superveniência de certos factos pode pôr em causa a justiça da condenação nas penas acessórias, nomeadamente a de expulsão, que é executada após o cumprimento da pena (principal) de prisão, durante o qual podem suceder ocorrências que alterem sensivelmente o quadro circunstancial que determinou (justamente, ao tempo) a condenação na pena de expulsão, e que tornem injusta essa condenação no momento em que vai ser executada. IV - Se os pressupostos fácticos da condenação na pena acessória de expulsão se modificaram de tal forma que, ao tempo da sua execução, já não subsistem, não podendo então os factos servir de fundamento à condenação nessa pena, parece inevitável aceitar que a sentença se tornou, devido à superveniência de certos factos, injusta, supervenientemente injusta, em termos de poder ser submetida a revisão, com base na al. d) do n.º 1 do art. 449.º do CPP. V - Não é tolerável que se execute uma pena sobre a qual recaem graves suspeitas de ser injusta. Tendo o recurso de revisão como fundamento e teleologia precisamente a reparação de decisões injustas, ainda que o procedimento se encontre extinto ou a pena prescrita ou cumprida, como refere o n.º 4 do art. 449.º do CPP, por maioria de razão ele deve ser admitido a reparar decisões que ainda não se executaram, quando, portanto, é ainda possível evitar que se efective e execute uma decisão (presumivelmente) injusta, ainda que correcta ao tempo da sua prolação. VI - Consequentemente, considera-se, em princípio, admissível o recurso de revisão com base em factos supervenientes à sentença condenatória. VII - Tendo em consideração que: -o recorrente apresenta como facto novo o seu casamento [documentado nos autos], já em fase de cumprimento da pena, com uma portuguesa, tendo esta duas filhas, uma nascida em 06-11-1991 e a outra em 24-02-1993; -o recorrente não adquiriu, como efeito directo do casamento, a nacionalidade portuguesa (art. 3.º da Lei da Nacionalidade), nem está comprovado nos autos que a tenha adquirido por outra forma; -o recorrente não tem filhos a residir em Portugal, pois não é o pai biológico das duas filhas da sua mulher, nem o casamento estabelece vínculos de filiação entre um dos cônjuges e os filhos do outro [aliás, o recorrente nunca viveu nem conviveu com as filhas da sua mulher, nem está comprovado que alguma vez tenha contribuído para o seu sustento e educação], pelo que a situação de facto não é abrangida nem pelo art. 101.º do DL 244/98, de 08-08, na redacção do DL 4/2001, de 10-01, vigente à data da condenação, nem pelo art. 135.º da Lei 23/2007, de 04-07, actualmente em vigor, não tendo fundamento a invocação dos arts. 33.º, n.º 1, e 36.º, n.º 6, da CRP; -o recorrente não tem quaisquer ligações efectivas com Portugal [veio para cá viver em 1704-2001, mas desde Abril de 2003 deixou de trabalhar; desde Setembro/Outubro de 2002 até 17-05-2003, dia em que foi detido, dedicou-se à venda de estupefacientes, tendo estado desde então recluso] e não é um residente de longa duração, pelo que não beneficia do estatuído no art. 136.º da Lei 23/2007, de 04-07; o recurso de revisão é manifestamente infundado.
Proc. n.º 3922/08 -3.ª Secção
Maia Costa (relator) **
Pires da Graça
Pereira Madeira
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