Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Sumários do STJ (Boletim) - Criminal
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ACSTJ de 14-01-2009
 Recurso de revisão Motivação do recurso Inconciliabilidade de decisões Graves dúvidas sobre a justiça da condenação
I -Sendo o recurso de revisão um recurso extraordinário – Título II do Livro IX do CPP –, o seu regime encontra-se previsto no Capítulo II do referido Título II, não lhe sendo aplicável, ainda que subsidiariamente, o regime geral dos recursos ordinários previstos no Título I do mesmo livro do referido compêndio adjectivo, pelo que a motivação do requerimento não se encontra necessariamente vinculada ao cumprimento do disposto no art. 412.º, n.º 1, do CPP, que vale para os recursos ordinários.
II - Acresce que, contrariamente aos demais recursos extraordinários (previstos no Capítulo I do Título II ), em que há uma norma – o art. 448.º – que dispõe: «Aos recursos previstos no presente capítulo aplicam-se subsidiariamente as disposições que regulam os recursos ordinários»”, inexiste regra idêntica no regime do recurso de revisão.
III - No requerimento de revisão o que se exige é que o requerente explicite os fundamentos por que pede a revisão. Como salienta Maia Gonçalves (in Código de Processo Penal, 16.ª edição, 2007, pág. 993, nota 4, com referência ao n.º 2 do art. 451.º do CPP), «O que se preceitua no n.º 2 quanto a motivação é novo, mas corresponde a uma exigência que já se vinha fazendo no domínio do CPP de 1929, de que o requerimento formulando o pedido de revisão deve conter uma exposição circunstanciada, demonstrativa de que o pedido tinha fundamento e se enquadrava em alguns dos números do art. 673.º. É neste sentido que o preceito deve ser entendido mutatis mutandis.» IV -O fundamento de revisão de sentença previsto na al. c) do n.º 1 do art. 449.º do CPP contém dois pressupostos, de verificação cumulativa: por um lado, a inconciliabilidade entre os factos que serviram de fundamento à condenação e os dados como provados noutra sentença e, por outro lado, que dessa oposição resultem dúvidas graves sobre a justiça da condenação – cf. Ac. deste Supremo e desta Secção de 02-04-2008, Proc. n.º 3182/07.
V - A inconciliabilidade de decisões que pode fundar a revisão tem de referir-se aos factos que fundamentam a condenação e aos factos dados como provados em outra decisão, de forma a suscitar dúvidas graves sobre a justiça da condenação, o que significa que é necessário que entre esses factos exista uma relação de exclusão, no sentido de que, se se tiverem por provados determinados factos numa outra sentença, não podem ser, ao mesmo tempo, verdadeiros os tidos por provados na sentença revidenda – cf. Ac. deste Supremo de 08-052008, Proc. n.º 1122/08 -5.ª.
VI - Por outro lado, graves dúvidas sobre a justiça da condenação são todas aquelas que são «de molde a pôr em causa, de forma séria, a condenação de determinada pessoa, que não a simples medida da pena imposta. As dúvidas têm de incidir sobre a condenação enquanto tal, a ponto de se colocar fundadamente o problema de o arguido dever ter sido absolvido» – Ac. do STJ de 25-01-2007, Proc. n.º 2042/06 -5.ª.
VII - Tendo em consideração que: -o requerente apresenta como fundamento de inconciliabilidade a decisão do STJ, proferida em via de recurso ordinário, com as decisões proferidas nos mesmos autos, que antecederam e motivaram a decisão do Supremo, e vem discutir a pena aplicada, que pretende não seja superior a 5 anos de prisão e suspensa na sua execução, atendendo ao princípio da igualdade e à comparação com a pena aplicada a outro co-arguido, face à qualificação jurídica operada; -nem o recurso extraordinário de revisão se destina a sindicar, como sucedâneo de recurso ordinário, a qualificação jurídica e a medida da pena, enfim, a correcção da decisão condenatória transitada em julgado, nem o requerente apresenta decisão factual alheia à decisão questionada, que justifique a invocada inconciliabilidade; -as decisões inconciliáveis têm de ser decisões diferentes, com eficácia executiva autónoma, advinda de caso julgado, o que não sucede, obviamente, com as decisões recorridas, no mesmo processo, sobre o mesmo objecto, pois que, enquanto recorridas, se encontram submetidas ao recurso ordinário, e somente a decisão que julgou definitivamente o caso é que valida o caso julgado – a última decisão proferida que julgou o pleito, em via de recurso, é a única eficaz ao estabelecimento definitivo do decidido na instância, e do consequente exequatur, quer quando confirme a decisão recorrida, dando assim credibilidade definitiva a esta, na medida da confirmação, quer quando a altere ou revogue, e sem prejuízo do disposto no art. 403.º, n.º 3, do CPP; -para os efeitos da al. c) do n.º 1 do art. 449.º, a inconciliabilidade dos factos que fundamentaram a condenação pressupõe necessariamente a existência de outra decisão sentenciadora externa e alheia à instância processual onde foi proferida a decisão revidenda, processualmente autónoma, mas que colida factualmente, sem que seja possível conciliação, com a decisão revidenda; -o que o recorrente verdadeiramente pretende é obter uma alteração da decisão, em termos próprios de um recurso ordinário; não se mostram verificados pressupostos fáctico-legais viáveis à revisão, que é, pois, de denegar.
Proc. n.º 3929/08 -3.ª Secção Pires da Graça (relator) Raul Borges Pereira Madeira