Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Sumários do STJ (Boletim) - Criminal
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ACSTJ de 04-12-2008
 Suspensão da execução da pena Prevenção geral Prevenção especial Roubo Sujeição a regras de conduta Regime de prova
I -A aplicação da pena de substituição de suspensão da execução da pena só pode e deve ter lugar quando a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizarem de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, como decorre do art. 50.º do CP.
II - Circunscrevendo-se estas, a partir de 01-10-1995, de acordo com o art. 40.º do CP (intocado na revisão da Lei 59/2007), à protecção dos bens jurídicos e à reintegração do agente na sociedade, é em função de considerações de natureza exclusivamente preventiva – prevenção geral e especial – que o julgador tem de se orientar na opção em causa.
III - Como refere Figueiredo Dias (Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, 1993, § 518), pressuposto material de aplicação do instituto é que o tribunal, atendendo à personalidade do agente e às circunstâncias do facto, conclua por um prognóstico favorável relativamente ao comportamento do delinquente: que a simples censura do facto e a ameaça da pena – acompanhadas ou não da imposição de deveres e (ou) regras de conduta – “bastarão para afastar o delinquente da criminalidade”, acrescentando que, para a formulação de um tal juízo – ao qual não pode bastar nunca a consideração ou só da personalidade, ou só das circunstâncias do facto –, o tribunal atenderá especialmente às condições de vida do agente e à sua conduta anterior e posterior ao facto.
IV - Por outro lado, há que ter em conta que a lei torna claro que, na formulação do prognóstico, o tribunal reporta-se ao momento da decisão, não ao momento da prática do facto.
V - Adverte ainda aquele Professor (§ 520) que, apesar da conclusão do tribunal por um prognóstico favorável – à luz, consequentemente, de considerações exclusivas de prevenção especial de socialização –, a suspensão da execução da prisão não deverá ser decretada se a ela se opuserem «as necessidades de reprovação e prevenção do crime», reafirmando que «estão aqui em questão não quaisquer considerações de culpa, mas exclusivamente considerações de prevenção geral sob a forma de exigências mínimas e irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico. Só por estas exigências se limita – mas por elas se limita sempre – o valor da socialização em liberdade que ilumina o instituto em causa».
VI - Tendo em consideração que: -estão em causa, para além da detenção da arma, 6 roubos, um deles tentado, cometidos quase sempre da mesma forma e num espaço temporal de apenas dez dias, atingindo os valores subtraídos o montante global de € 687, e não tendo sido empregue violência física nem provocadas lesões; -o arguido é um jovem que à data dos factos tinha 17 anos e 10 meses de idade, e que não beneficiou da atenuação especial decorrente da aplicação do DL 401/82, de 23-09; -o seu percurso de vida foi problemático desde a infância, de modo tal que aos 7 anos foi institucionalizado, por falta de apoio afectivo e material, tendo frequentado outros estabelecimentos de apoio; -aos 11 anos iniciou acompanhamento psiquiátrico, continuando a receber medicação com injectável quinzenal; -tem o apoio da família, nomeadamente da avó e de um irmão mais velho; -está a fazer o ensino recorrente e mostra capacidade para se situar normativamente de modo adequado; -a ameaça da pena como medida de reflexos sobre o comportamento futuro evitará a repetição de condutas delituosa por parte do arguido; -a pena de suspensão não colocará em causa de forma irremediável a necessária tutela dos bens jurídicos e a estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias; -a imposição de cumprimento de pena de prisão, volvidos mais de 2 anos sobre a data da prática dos factos, apresenta-se no quadro actual como factor perturbador, estando o arguido sujeito à medida de obrigação de permanência na habitação desde 23-09-2006, e sujeito a vigilância electrónica desde 30-10-2006, apenas violada em 15-03-2007 num período de 14 minutos e em outro de 10 minutos; conclui-se que a carência de prisão efectiva não se apresenta manifesta, sendo de conceder uma oportunidade ao arguido, constituindo a substituição da pena um sério aviso e uma solene advertência de que aquele terá de pautar a sua vida de acordo com a lei e o respeito pelos direitos dos outros, pelo que se substitui a pena de 4 anos e 10 meses de prisão pela suspensão da sua execução por igual período.
VII - O risco que todo o juízo de prognose favorável sobre o futuro comportamento do arguido comporta será mitigado com a imposição de sujeição a regras de conduta e a regime de prova – que, atenta a idade do arguido e mesmo a medida da pena, terá obrigatoriamente de ser decretado, de acordo com o art. 53.º, n.º 3, do CP: nos termos do art. 52.º, n.º 1, al. a), do CP, impor-se-á, como regra de conduta, a obrigação de o arguido residir com sua mãe ou avó materna e de continuar o tratamento que vem fazendo, ou outros que venham a mostrar-se necessários, bem como continuar integrado no ensino recorrente, ficando ainda sujeito a regime de prova de acordo com plano elaborado pela entidade competente.
Proc. n.º 3279/08 -3.ª Secção Raul Borges (relator) Fernando Fróis