Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Sumários do STJ (Boletim) - Criminal
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ACSTJ de 29-10-2008
 Habeas corpus Âmbito da providência Prisão ilegal Excepcional complexidade Tráfico de estupefacientes Prazo da prisão preventiva Aplicação da lei no tempo Regime concretamente mais favorável
I -O processo de habeas corpus assume-se como de natureza residual, excepcional e de via reduzida: o seu âmbito restringe-se à apreciação da ilegalidade da prisão, por constatação, e só, dos fundamentos taxativamente enunciados no art. 222.º, n.º 2, do CPP.
II - Reserva-se-lhe a teleologia de reacção contra a prisão ilegal, ordenada ou mantida de forma grosseira, abusiva, por chocante erro de declaração enunciativa dos seus pressupostos, estando fora do seu propósito assumir-se como um recurso dos recursos ou contra os recursos.
III - É pacífico o entendimento por parte do STJ de que este Tribunal não pode substituir-se ao juiz que ordenou a prisão em termos de sindicar os seus motivos, com o que estaria a criar um novo grau de jurisdição (cf. Ac. do STJ de 10-10-1990, Proc. n.º 29/90 -3.ª).
IV - E a afirmação da inexistência de relação de litispendência ou de caso julgado entre o recurso sobre medidas de coacção e a providência de habeas corpus, independentemente dos seus fundamentos, em face do estipulado no art. 219.º, n.º 2, do CPP, na alteração trazida pela Lei 48/2007, de 29-08, reforça aquela proibição de sindicância, reservando-a às instâncias em processo ordinário de impugnação das decisões judiciais.
V - A declaração de excepcional complexidade do processo produzia, endoprocessualmente, antes da reforma processual introduzida pela Lei 48/2007, de 29-08 – visto o procedimento ser, no caso concreto, pelo crime de tráfico de estupefacientes –, nos termos do art. 54.º, n.º 3, do DL 15/93, de 22-01, o efeito da aplicabilidade do art. 215.º, n.º 3, do CPP, elevando os prazos de prisão preventiva até 4 anos, elevação ope legis, que podia ter lugar em qualquer fase processual.
VI - O acórdão de fixação de jurisprudência deste STJ com o n.º 2/2004, de 11-02-2004, firmou esse sentido interpretativo da lei, mas aquele preceito do DL 15/93 foi expressamente revogado pelo art. 5.º, al. b), da Lei 48/2007, de 29-08, que alterou o CPP a partir de 1509-2007, e com essa revogação adveio a caducidade daquele acórdão.
VII - Aquela declaração, continuando a ser prevista pela lei nova enquanto pressuposto de elevação, embora em moldes mais reduzidos comparativamente com a antecedente, tem como traço inovador só poder ser declarada durante a 1.ª instância, por despacho fundamentado, oficiosamente ou a requerimento do MP, ouvidos o arguido e o assistente – art. 215.º, n.º 6, do CPP (ritual que se mostra cumprido, no caso concreto).
VIII - As leis sobre a prisão preventiva apresentam uma natureza mista, a um tempo de índole processual e substantiva, verdadeiro direito constitucional aplicado, processual penal formal e material, repercutindo-se a alteração dos prazos de duração daquela medida cautelar na liberdade individual, postulando a sucessão de leis estabelecida – pois que a medida coactiva de prisão preventiva foi imposta ao abrigo da lei antiga – a determinação da lei de tratamento mais favorável, nos termos dos arts. 2.º, n.º 4, do CP e 5.º, n.º 2, al. a), do CPP.
IX - Tendo em consideração que: -a prisão preventiva a impor ao arguido, já submetido a julgamento e condenado, por acórdão não transitado em julgado de 04-01-2008, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art. 21.º, n.º 1, do DL 15/93, de 22-01, em 6 anos e 6 meses de prisão, à face da lei antiga tinha a duração de 4 anos (art. 215.º, n.ºs 1, al. d), 2 e 3, do CPP), que a alteração introduzida pela Lei 48/2007, de 29-08, encurtou para 3 anos e 4 meses, tratando mais benignamente o requerente da providência; -proferida sentença condenatória·em 1.ª instância, o prazo a observar é o prescrito para a fase seguinte, ou seja, até ao trânsito em julgado, nos termos dos art. 5.º, n.º 3, do CPP, e não o regime global imposto para a fase que decorre até à prolação da sentença, já ultrapassada; -o arguido encontra-se em prisão preventiva desde 19-04-2006; está longe de se mostrar exaurido o prazo máximo de prisão preventiva – o qual só terá lugar em 19-08-2009 – e de se encontrar fundamento legal de habeas corpus.
Proc. n.º 3540/08 -3.ª Secção Armindo Monteiro (relator) Santos Cabral Pereira Madeira