ACSTJ de 29-10-2008
Admissibilidade de recurso Acórdão da Relação Aplicação da lei processual penal no tempo Direito ao recurso
I -Numa situação em que o recorrente foi condenado, por acórdão de 25-09-2007, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão, condenação confirmada pelo acórdão da Relação ora recorrido, datado de 05-05-2008, sendo ambas as decisões proferidas na vigência da nova redacção da al. f) do n.º 1 do art. 400.º do CPP (introduzida pela Lei 48/2007, de 29-08), à face desse preceito, atenta a pena aplicada, é indubitável não ser admissível o recurso para o STJ. II - Todavia, o recurso era admissível à luz da redacção anterior do preceito, por estar em causa crime punível com pena de prisão superior a 8 anos – crime de abuso sexual de menor, p. e p. pelo art. 172.º, n.º 1, do CP, com a moldura legal abstracta de 3 a 10 anos de prisão. III - Estando-se perante situação de direito intertemporal, há que eleger o regime mais favorável, uma vez que está em causa o exercício do direito ao recurso, no âmbito das garantias de defesa do arguido. IV - O art. 5.º do CPP estabelece a regra tempus regit actum: a lei processual penal é aplicada a todos os actos praticados a partir da sua entrada em vigor, salvaguardando-se os até então realizados, os quais mantêm plena validade (só assim não acontecendo em relação às normas processuais penais de natureza substantiva). V - A nova lei processual penal será, em regra, de aplicação imediata, nos termos do referido preceito, sendo certo que, nos termos do seu n.º 2, «a lei processual não se aplica aos processos iniciados anteriormente à sua vigência quando da sua aplicabilidade possa resultar (…) uma limitação do direito de defesa». VI - Tanto a jurisprudência como a doutrina sustentam que a lei reguladora da admissibilidade do recurso é a que vigore na data em que a decisão é proferida (lex temporis regit actum) – cf., a título exemplificativo, os Acs. deste STJ de 22-11-2007, Proc. n.º 3876/07 -3.ª, de 10-01-2008, Proc. n.º 4376/07 -5.ª, de 23-01-2008, Proc. n.º 4641/07 -3.ª, de 06-02-2008, Proc. n.º 117/08 -3.ª, de 27-02-2008, Proc. n.º 3309/07 -3.ª, de 05-03-2008, Proc. n.º 100/08 -3.ª, de 12-03-2008, Proc. n.º 112/08 -3.ª, de 09-04-2008, Procs. n.ºs 307/08 -3.ª e 698/08 -3.ª, e de 30-04-2008, Proc. n.º 110/08 -5.ª. VII - As Secções Criminais deste Supremo convergiram para uma solução de compromisso, expressa no Ac. de 29-05-2008, Proc. n.º 1313/08 -5.ª, do modo seguinte: «Para o efeito do disposto no art. 5.º, n.º 2, al. a), do CPP, os direitos de defesa, para além dos que têm eficácia em todo o processo (art. 61.º, n.º 1), são apenas os que se encontram consignados para a fase processual em curso no momento da mudança da lei. VIII - Ao se iniciar a fase dos recursos, o arguido inscreve nas suas prerrogativas de defesa o direito a todos os graus de recurso que a lei processual lhe faculta nesse momento. IX - É aplicável a nova lei processual à recorribilidade de decisão que na 1.ª instância já tenha sido proferida depois da entrada em vigor dessa lei, independentemente do momento em que se iniciou o respectivo processo. X - A lei que regula a recorribilidade de uma decisão, ainda que esta tenha sido proferida em recurso pela Relação, é a que se encontrava em vigor no momento em que a 1.ª instância decidiu, salvo se lei posterior for mais favorável para o arguido» – cf., em sentido idêntico, os Acs. de 05-06-2008, Proc. n.º 1151/08 -5.ª, de 10-07-2008, Proc. n.º 2146/08 -3.ª, e de 03-09-2008, Proc. n.º 2192/08 -3.ª.
Proc. n.º 2827/08 -3.ª Secção
Raul Borges (relator)
Fernando Fróis
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