ACSTJ de 29-10-2008
Acidente de viação Culpa Competência do Supremo Tribunal de Justiça Matéria de facto Responsabilidade civil emergente de crime Indemnização Danos patrimoniais Incapacidade para o trabalho Despesas de deslocação Danos futuros Danos não patrimonia
I -Não se tendo provado as circunstâncias em que o veículo conduzido pelo demandante FC e a viatura tripulada pelo (ex) arguido AM colidiram, não é possível formular um juízo sobre a eventual culpa dos condutores intervenientes. II - Os poderes de cognição deste Supremo Tribunal encontram-se limitados ao reexame da matéria de direito, como tribunal de revista que é – art. 434.º do CPP –, razão pela qual não se pode intrometer na decisão proferida sobre a matéria de facto, tendo de aceitar o factualismo dado como provado pelas instâncias. III - Deste modo, tendo estas considerado provado que o demandante, à data do acidente, era dono de uma oficina de bate-chapas e pintura e que dessa actividade auferia mensalmente a importância de € 334,19, terá de ser essa e não qualquer outra, designadamente a correspondente ao salário mínimo nacional, a atendível para efeitos de cálculo da indemnização devida pelos danos resultantes da incapacidade para o trabalho padecida por aquele e da incapacidade permanente parcial. IV - O montante estabelecido no art. 36.º, n.º 1, do CCJ, que corresponde a 1/400 de 1 UC, sendo o aplicável para indemnização devida a todos os intervenientes acidentais por virtude de despesas com transportes que hajam realizado nas diligências judiciais para que sejam convocados, mostra-se adequado para ser utilizado como referencial para fixar a parcela indemnizatória para ressarcimento das despesas de deslocação que o demandante teve de suportar. V - Vindo provado que: -o demandante, tendo sido transportado ao hospital depois do acidente, após imobilização do braço esquerdo por suspensão ao pescoço, teve alta hospitalar nesse mesmo dia, passando a ser acompanhado no Centro de Saúde de M… e na clínica de S…; -em Abril de 2002, por revelar ainda entorse a nível acrómio-clavicular, foi submetido a uma infiltração com corticóides, tendo feito fisioterapia até Dezembro de 2002; -em consequência das lesões sofridas, o demandante esteve parcialmente incapacitado para o trabalho 384 dias; -durante o período em que fez fisioterapia não trabalhava a metade do dia em que tinha a respectiva sessão; uma vez que as instâncias apenas consideraram relevante para ressarcimento dos danos resultantes da incapacidade para o trabalho um período de 60 dias de incapacidade absoluta, é de alterar a importância de € 668,40 atribuída ao demandante, elevando-a para € 1500. VI - Vem este Supremo Tribunal entendendo que a indemnização por danos futuros decorrente de incapacidade permanente deve corresponder a um capital produtor do rendimento que o lesado não irá auferir e que se extinga no final do período provável de vida activa, que seja susceptível de garantir, durante essa vida, as prestações periódicas correspondentes ao rendimento perdido, para o que se deverá atender à idade e tempo provável de vida do lesado, à actividade profissional desenvolvida, tempo provável da sua duração e eventual expectativa de aumento de rendimento, condições de saúde e previsível evolução da vida económica, capital este que, sendo entregue imediatamente, deve ser objecto de uma dedução, sob pena de se verificar um enriquecimento sem causa do lesado à custa alheia, dedução que é usual situar-se em 1/4. VII - Uma vez que, na fixação da importância para ressarcimento dos danos decorrentes da incapacidade permanente parcial de que o demandante ficou portador, qual seja a de 8%, com previsível agravamento para 13%, as instâncias utilizaram o referido critério, tendo considerado como fim da vida laboral activa os 65 anos, e tido em conta o rendimento mensal do demandante e a sua idade, bem como a previsível evolução da vida económica, nomeadamente a subida dos salários motivada pela inflação e promoção profissional, importa apenas proceder a um ajustamento no que concerne à idade considerada como termo da actividade profissional, que o STJ tem entendido como sendo a de 70 anos, elevando, por isso, o montante da indemnização fixada pelas instâncias (de € 12 320) para € 15 000. VIII - A lei substantiva civil manda fixar o montante da indemnização devida por danos não patrimoniais equitativamente, tendo em atenção a culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso – arts. 496.º, n.º 3, e 494.º, ambos do CC. IX - A indemnização por danos não patrimoniais tem por fim facultar ao lesado meios económicos que, de algum modo, o compensem da lesão sofrida, por serem susceptíveis de lhe proporcionar um lenitivo mitigador do sofrimento causado. Por isso, deverá constituir uma efectiva e adequada compensação, tendo em vista o quantum doloris causado, oferecendo ao lesado uma justa contrapartida que contrabalance o mal sofrido, razão pela qual não pode assumir feição meramente simbólica. X - Por outro lado, na determinação da indemnização há que ter em atenção que a equidade é a justiça do caso concreto, humano, pelo que o julgador deverá ter presente as regras de boa prudência, do bom senso, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida. XI - Atenta a dimensão dos danos físicos e psíquicos causados, com destaque para o longo período de incapacidade parcial para o trabalho que o demandante teve de suportar, 384 dias, bem como para a incapacidade permanente parcial de que ficou portador, entende-se elevar a compensação devida pelos danos não patrimoniais para a quantia, pedida, de € 5000.
Proc. n.º 3373/08 -3.ª Secção
Oliveira Mendes (relator)
Maia Costa
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