ACSTJ de 15-10-2008
Recurso de revisão Novos factos Novos meios de prova Conhecimento superveniente Indispensabilidade do meio de prova Graves dúvidas sobre a justiça da condenação
I -Ao instituto da revisão de sentença penal, com consagração constitucional (art. 29.º, n.º 6, da CRP), subjaz o propósito da reposição da verdade e da realização da justiça, verdadeiros fins do processo penal. II - O princípio res judicata pro veritate habetur não pode obstar a um novo julgamento, quando posteriores elementos de apreciação põem seriamente em causa a justiça do anterior. O direito não pode querer, e não quer, a manutenção de uma condenação, em homenagem à estabilidade de decisões judiciais, à custa da postergação de direitos fundamentais dos cidadãos. III - Por isso, a lei admite, em situações expressamente previstas – art. 449.º, n.º 1, als. a) a g), do CPP, com a redacção dada pela Lei 48/2007, de 29-08 –, a revisão de decisão transitada em julgado, mediante a realização de novo julgamento (art. 460.º do CPP). IV - Em matéria de prova a produzir no recurso extraordinário de revisão de sentença, a lei adjectiva penal estabelece que, quando o fundamento do pedido de revisão consiste na descoberta de novos factos ou meios de prova, o juiz procede às diligências que considerar indispensáveis para a descoberta da verdade – n.º 1 do art. 453.º –, mais estatuindo que o requerente da revisão não pode indicar testemunhas que não tiverem sido ouvidas no processo, a não ser justificando que ignorava a sua existência ao tempo da decisão ou que estiveram impossibilitadas de depor – n.º 2 do art. 453.º do CPP. V - O juízo a formular sobre a indispensabilidade dos meios de prova para a descoberta da verdade, ou seja, sobre a realização das diligências de prova, cabe, evidentemente, ao juiz de 1.ª instância, o qual assume a posição de juiz “delegado” do STJ (cf. Pinto de Albuquerque, Comentário do Código de Processo Penal, pág. 1225). Por outro lado, atenta a natureza urgente do recurso de revisão, a decisão que defere ou indefere a produção de prova é irrecorrível, sendo posteriormente sindicada aquando da prolação da decisão sobre a autorização ou denegação da revisão. VI - O juízo sobre a indispensabilidade do meio de prova deve ser formulado não só a partir do próprio meio de prova, ou seja, da prova concretamente indicada pelo recorrente, mas também da prova já produzida, isto é, da prova que fundamentou a decisão que se pretende seja revista. VII - Com efeito, porque a prova relevante em ordem a justificar a revisão de sentença é só aquela que suscite graves dúvidas sobre a justiça da condenação – al. d) do n.º 1 do art. 449.º –, o juízo de indispensabilidade dos meios de prova indicados pelo recorrente não pode prescindir, em princípio, de uma análise da prova que fundamentou a decisão revidenda. Para que se suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação é necessário que a prova ou provas na base das quais aquela decisão se sustenta sejam susceptíveis de ser abaladas pela nova ou novas provas. VIII - Numa situação em que: -a prova em causa se circunscreve ao depoimento de uma testemunha que foi arrolada sem qualquer indicação do facto ou factos de que é conhecedora; -notificado o recorrente, por duas vezes, para indicar os factos concretos eventualmente conhecidos da testemunha, a segunda com cominação de indeferimento da sua audição, limitou-se a dizer que a mesma tem conhecimento de factos relacionados com a sua defesa; não se pode ajuizar, minimamente, da relevância do meio de prova indicado pelo recorrente, isto é, da sua potencial virtualidade para a descoberta da verdade, pelo que bem andou o juiz da 1.ª instância ao indeferir a inquirição da referida testemunha.
Proc. n.º 2962/08 -3.ª Secção
Oliveira Mendes (relator)
Maia Costa
Pereira Madeira
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