ACSTJ de 16-09-2008
Tráfico de estupefacientes Suspensão da execução da pena Prevenção geral Prevenção especial
I -A pena de suspensão da execução da pena de prisão só pode e deve ser aplicada se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, o tribunal concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizem de forma adequada e suficiente as finalidades da punição – art. 50.º, n.º 1, do CP. II - Consabido que as finalidades da punição se circunscrevem à protecção dos bens jurídicos e à reintegração do agente na sociedade – art. 40.º, n.º 1, do CP –, é em função de considerações exclusivamente preventivas, prevenção geral e especial, que o julgador tem de se orientar na opção pela pena de suspensão de execução da prisão. Assim, para aplicação desta pena de substituição, é necessário, em primeiro lugar, que a pena de suspensão da execução da prisão não coloque irremediavelmente em causa a necessária tutela dos bens jurídicos e a estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias, ou seja, o sentimento de reprovação social do crime ou sentimento jurídico da comunidade; em segundo lugar, é necessário que o tribunal se convença, face à personalidade do arguido, comportamento global, natureza do crime e sua adequação a essa personalidade, que o facto cometido não está de acordo com essa personalidade e foi simples acidente de percurso, esporádico, e que a ameaça da pena, como medida de reflexos sobre o seu comportamento futuro, evitará a repetição de comportamentos delituosos. III - Por outro lado, o juízo de prognose sobre o comportamento futuro do condenado deve ter em consideração, como a letra da lei impõe, a personalidade do agente, as suas condições de vida, a sua conduta anterior e posterior ao crime e as circunstâncias deste. IV - No caso concreto, tendo em consideração que: -está em causa um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art. 21.º, n.º 1, do DL 15/93, de 22-01, com um grau de ilicitude muito elevado, quer pela qualidade/quantidade de estupefaciente traficado (793,293 g de cocaína), quer pela forma de realização do respectivo tráfico; -na concretização da pena nos crimes de tráfico de estupefacientes deve atender-se a fortes razões de prevenção geral impostas pela frequência desse fenómeno e das suas nefastas consequências para a comunidade, como vem sendo enfaticamente salientado por este Supremo Tribunal, impondo-se, pois, uma resposta punitiva firme, como forma de combater eficazmente o tráfico; -só em casos ou situações especiais, em que a ilicitude do facto se mostre diminuída e o sentimento de reprovação social se apresente esbatido, será admissível o uso da suspensão da execução da pena de prisão; -o recurso a este instituto nos casos de tráfico comum e de tráfico agravado de estupefacientes em que não se verifiquem razões ponderosas seria atentatória da necessidade estratégica nacional e internacional de combate a esse tipo de crime, faria desacreditar as expectativas comunitárias na validade da norma jurídica violada e não serviria os imperativos de prevenção geral; há que concluir pela não aplicação do instituto da suspensão da execução da pena, independentemente de quaisquer considerações de prevenção especial.
Proc. n.º 750/05 -3.ª Secção
Soreto de Barros (relator)
Armindo Monteiro
Santos Cabral
Oliveira Mendes
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