Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Sumários do STJ (Boletim) - Criminal
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ACSTJ de 16-09-2008
 Recurso penal Conclusões da motivação Repetição Manifesta improcedência Repetição da motivação Tráfico de estupefacientes Correio de droga Atenuação especial da pena Medida concreta da pena
I -De acordo com posição sedimentada neste STJ, o recurso, enquanto remédio jurídico, se intentado de uma decisão da Relação, há-de dirigir-se aos seus fundamentos, em ordem a abalá-los e a conseguir remédio para o erro decisório, seja de decisão de mérito ou procedimental.
II - A repetição das conclusões ante as instâncias de recurso, particularmente as da Relação perante o STJ, ignorando o teor da decisão proferida na Relação, a qual subsiste inimpugnada e não contrariada em ordem à reparação do erro, conduz à manifesta improcedência do recurso, tudo se passando como se, por falta de conclusões, a motivação estivesse ausente.
III - Tal conclusão não implica um juízo valorativo sobre a questão de repetição junto deste STJ de linha argumentativa explanada junto do tribunal de 2.ª instância.
IV - Na verdade, as questões podem ser legitimamente de novo suscitadas e repetidas, ainda que com os mesmos fundamentos aduzidos no anterior recurso, de cuja improcedência a Relação não convenceu o recorrente. Porém, em tais situações entende-se que a motivação de qualquer recurso deverá incidir o seu esforço argumentativo sobre pontos concretos da fundamentação da decisão recorrida que, no entender do recorrente, sejam criticáveis, sendo certo que a decisão recorrida é o acórdão do Tribunal da Relação.
V - Como refere Figueiredo Dias, em relação ao instituto da atenuação especial da pena «passa-se aqui algo de análogo ao que sucede com os exemplos-padrão: por um lado, outras situações que não as descritas naquelas alíneas podem (e devem) ser tomadas em consideração, desde que possuam o efeito requerido de diminuir, de forma acentuada, a culpa do agente ou as exigências de prevenção; por outro lado, as próprias situações descritas nas alíneas do art. 73º-2 não têm o efeito «automático» de atenuar especialmente a pena, mas só o possuirão se e na medida em que desencadeiem o efeito requerido. Deste ponto de vista, pode afirmar-se, com razoável exactidão, que a acentuada diminuição da culpa ou das exigências de prevenção constitui o autêntico pressuposto material da atenuação especial da pena.
VI - A diminuição da culpa ou das exigências da prevenção só poderá, por seu lado, considerar-se acentuada quando a imagem global do facto, resultante da actuação da(s) circunstância(s) atenuante(s), se apresente com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura cabida ao tipo de facto respectivo. Por isso, têm plena razão a jurisprudência e a doutrina quando insistem em que a atenuação especial só em casos excepcionais pode ter lugar».
VII - As necessidades de prevenção geral expressas no perigo que representa o tráfico de estupefacientes, em que os denominados «correios de droga» assumem um papel essencial, não podem obscurecer a policromia de actuações que cabem no âmbito do mesmo tipo legal – art. 21.º do DL 15/93, de 22-01 – e, consequentemente, em sede de culpa, a diferença que existe entre quem detém o domínio do tráfico e se propõe auferir o correspondente lucro ilícito, e aquele cuja intervenção é meramente instrumental, quando não acidental, assumindo os riscos principais da parte logística, inclusive ao nível da integridade física, a troco de uma compensação monetária.
VIII - Em abstracto, tal diferença é patente no perfil socio-económico dos denominados «correios de droga» (debilidade sócio-económica; estruturas sociais mais frágeis), que se conjuga com um aumento substancial do número de detenções deste tipo de agente do crime, essencialmente na Europa e na América do Sul. E a percepção de tal fenomenologia evidencia-se nas plúrimas decisões deste STJ que, perante situações com um perfil comum, aplicam penas idênticas e em que o traço distintivo da medida da pena tem a sua génese nas particulares características de cada caso.
IX - Porém, a consideração da particular situação de fragilidade social e económica que assumem os «correios de droga» não pode fazer esquecer que subjacente a este crime se encontra, predominantemente, a procura do lucro ilícito ou do benefício, surgindo como obstáculo à prática do crime a ponderação da possibilidade de ser preso e cumprir uma pena de prisão.
X - Como último critério coadjuvante na determinação da medida da pena não pode deixar de se ponderar a orientação da jurisprudência do STJ que, em situações análogas, tem condenado em penas que se situam, com uma maior intensidade, cerca dos 5 anos de prisão, com as alterações atenuativas ou agravativas impostas pelo caso concreto.
XI - Tem-se por adequada a aplicação de uma pena de 5 anos de prisão [aplicada pela Relação], pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21.º do DL 15/93, de 22-01, se o arguido, de nacionalidade venezuelana, sem qualquer ligação a Portugal e sem antecedentes criminais, no âmbito de um transporte como correio de droga, desembarcou no Aeroporto de Lisboa, proveniente de Caracas, Venezuela, e com destino a Amesterdão, transportando no interior do organismo cento e catorze invólucros, em forma de bolota, contendo cocaína, com o peso líquido total de 1705,634 g.
Proc. n.º 2382/08 -3.ª Secção Santos Cabral (relator) Oliveira Mendes