Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Sumários do STJ (Boletim) - Criminal
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ACSTJ de 10-07-2008
 Burla qualificada Falsificação Documento Abuso de confiança Concurso de infracções Cúmulo jurídico Pluriocasionalidade Pena única
I -Num situação em que: -o arguido, que se vinha dedicando, desde há vários anos, à actividade de mediador de seguros, conquistou, no meio social onde sempre viveu, ‘um bom conceito, nada constando em desabono da sua seriedade profissional’; -sabedor da confiança que as pessoas mais próximas depositavam em si e das falsas expectativas que lhes fez criar acerca dos investimentos em que actuava como mediador, cometeu os crimes de que os autos dão conta [sete crimes de burla qualificada, p. e p. pelo art. 218.º, n.º 1, do CP, quarenta e quatro crimes de burla qualificada, p. e p. pelo art. 218.º, n.º 2, al. c), do CP, dois crimes de falsificação, p. e p. pelo art. 256.º, n.º 1, al. a), do CP; seis crimes de falsificação de documento, p. e p. pelo art. 256.º, n.º 1, al. b), do CP, e três crimes de abuso de confiança, p. e p. pelo art. 205.º, n.º 4, al. b), do CP], quando tinha cerca de 37 anos de idade; -tais factos desenrolaram-se durante ‘largo período de tempo’, mas concentrados, essencialmente, nos anos de 1996 a 1998; -mesmo depois do conhecimento dos factos, o arguido manteve ‘a consideração de bom cidadão’, não havendo notícia da prática de novos crimes; é de concluir que a conduta delituosa do arguido [delimitada no tempo, num quadro de execução homogéneo – pois conquanto não sejam idênticos os bens jurídicos protegidos pelas normas correspondentes, é ‘evidente um quadro de execução homogéneo relativamente a todas as situações que enquadram os crimes de burla, falsificação de documentos e abuso de confiança’, sempre com a mesma finalidade de ‘conseguir para si um enriquecimento à custa do património das pessoas ofendidas’ –, sendo o arguido delinquente primário e sem incidentes criminais posteriores] melhor se enquadra numa caracterização de ‘pluriocasionalidade que não radica na personalidade’.
II - Considerando que no caso concreto: -o limite mínimo da pena do concurso é de 2 anos e 11 meses de prisão e o máximo é de 25 anos, dado o limite determinado pelo n.º 2 do art. 77.º do CP; -na determinação da pena única, a decisão sob recurso, a par da consideração da personalidade do arguido [‘de que destaca a primariedade criminal e a confissão parcial e a integração social de quebeneficia, para além das respectivas condições pessoais’], não deixa de caracterizar, bem, a ilicitude global da conduta, assinalando ‘a gravidade objectiva dos factos’ [‘o arguido agiu sempre de forma livre e consciente, sabedor da ilicitude da sua conduta, com a intenção de conseguir para si um enriquecimento à custa do património das pessoas ofendidas, conhecedor também da situação económica difícil em que as colocou’]; -a aplicação de uma pena conjunta muito próxima do limite mínimo da moldura penal não se mostra ‘adequada à estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma violada’ (sendo que tais expectativas não se podem medir pelo padrão de exigência aparentado pela posição dos ofendidos, ambivalente face a tais valores: ‘o arguido era considerado bom profissional e bom cidadão, consideração que se mantém mesmo após a prática dos factos, mesmo por uma grande parte dos ofendidos’); é de concluir que uma pena única inferior a 4 anos de prisão efectiva não satisfaz as exigências de prevenção geral, que é uma das finalidades da aplicação das penas (A aplicação de penas (…) visa a protecção de bens jurídicos – art. 40.º, n.º 1, do CP), sendo certo que tal medida da pena não ultrapassa a da culpa do agente.
Proc. n.º 772/06 -3.ª Secção Soreto de Barros (relator) Armindo Monteiro Santos Cabral Oliveira Mendes