Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Sumários do STJ (Boletim) - Criminal
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ACSTJ de 10-07-2008
 Admissibilidade de recurso Acórdão da Relação Concurso de infracções Aplicação da lei processual penal no tempo Direitos de defesa Decisão interlocutória
I -Por efeito da entrada em vigor da Lei 48/2007, de 29-08, foi alterada a competência do STJ em matéria de recursos de decisões proferidas, em recurso, pelos Tribunais da Relação, tendo-se limitado a impugnação daquelas decisões para este tribunal, no caso de dupla conforme, às situações em que seja aplicável pena de prisão superior a 8 anos – redacção dada à al. f) do n.º 1 do art. 400.º do CPP –, quando no domínio da versão pré-vigente daquele diploma a limitação incidia relativamente a decisões proferidas em processo por crime punível com pena de prisão não superior a 8 anos.
II - Da hermenêutica do corpo do art. 5.º do CPP, o qual estabelece a regra tempus regit actum, decorre que a lei processual penal é de aplicação imediata, ou seja, é aplicada a todos os actos praticados a partir da sua entrada em vigor, salvaguardando-se, obviamente, os actos já processados, os quais são plenamente válidos.
III - A lei (nova) não será imediatamente aplicável, porém (als. a) e b) do n.º 2), sempre que daí resulte sacrifício da posição processual do arguido, em particular do seu direito de defesa, bem como quando tal ocasione conflitualidade entre os diversos actos processuais.
IV - Como refere Cavaleiro de Ferreira (in Curso de Processo Penal, I, págs. 62-63), do princípio geral segundo o qual a lei aplicável é a vigente no momento em que o acto processual foi ou é cometido resulta que, se um processo terminou no domínio de uma lei revogada o processo mantém pleno valor; se o processo se não iniciou ainda, embora o facto que constitua o seu objecto tenha sido cometido no domínio da anterior legislação, é-lhe inteiramente aplicável a nova legislação. Se a lei nova surge durante a marcha do processo, são válidos todos os actos processuais realizados de harmonia com a lei anterior, e serão submetidos à nova lei todos os ulteriormente praticados.
V - Em matéria de recursos tal significa, em conjugação com o princípio jurídico-constitucional da legalidade, que a lei nova será de aplicar imediatamente, sem embargo da validade dos actos já praticados, a menos que por efeito da aplicação da lei nova se verifique um agravamento da situação do arguido ou se coloque em causa a harmonia e unidade do processo. Assim, a lei nova é aplicável a todos os actos processuais futuros, com a ressalva imposta pelas als. a) e b) do n.º 2 do art. 5.º do CPP.
VI - Numa situação em que: -conquanto um dos crimes perpetrados pelo arguido seja punível com pena de prisão superior a 8 anos, a verdade é que estamos perante condenação na pena (conjunta) de 5 anos e 6 meses de prisão, ou seja, face a situação em que, de acordo com a lei adjectiva vigente, a competência para o conhecimento do recurso interposto já não cabe ao STJ, o que significa que a aplicação imediata da lei nova iria limitar os direitos de defesa do arguido, retirando-lhe um grau de jurisdição; uma vez que se trata de processo iniciado antes da entrada em vigor da Lei 48/2007, de 29-08, e tendo em vista o disposto na al. a) do n.º 2 do art. 5.º do CPP, é de considerar ser recorrível a decisão impugnada, mantendo este Supremo Tribunal a competência para o seu conhecimento.
VII - Como este STJ vinha afirmando em diversas decisões proferidas antes da entrada em vigor da Lei 48/2007, de 29-08, e afirma face à redacção dada por aquele diploma à al. c) do n.º 1 do art. 400.º do CPP, a inadmissibilidade de recurso relativamente a acórdãos proferidos, em recurso, pelas Relações, que não conheçam, a final, do objecto do processo, abrange todas estas decisões (processualmente denominadas de interlocutórias), independentemente da forma como o respectivo recurso é processado e julgado pela Relação, isto é, quer o recurso seja autónomo quer seja inserido em impugnação da decisão final.
VIII - Com efeito, a circunstância de certa e determinada decisão, que não conheça, a final, do objecto do processo, não haver sido impugnada autonomamente, antes em conjunto com a sentença, acórdão ou decisão final, não tem a virtualidade de alterar o regime previsto na al. c) do n.º 1 do art. 400.º do CPP, visto que a lei não estabelece ali qualquer distinção, determinando a irrecorribilidade, tout court, de todas as decisões proferidas, em recurso, pela Relação, que não conheçam, a final, do objecto do processo.
IX - A decisão proferida pelo Tribunal da Relação que declarou válida e legal a prova por reconhecimento efectuada na audiência não conheceu, a final, do objecto do processo, pelo que é irrecorrível, devendo o recurso, na parte em que a impugna, ser rejeitado – arts. 420.º, n.º 1, e 414.º, n.º 2, do CPP.
Proc. n.º 2142/08 -3.ª Secção Oliveira Mendes (relator) Maia Costa