ACSTJ de 18-06-2008
Mandado de Detenção Europeu Audição do arguido Admissibilidade de recurso Princípio do reconhecimento mútuo Prestação de garantias pelo Estado requerente Sentença Notificação
I -Numa situação em que o juiz relator, em diligência de audição de detido, requerido em MDE, decidiu da validade e da manutenção da detenção, ordenando a restituição daquele à liberdade, sem proferir decisão sobre a execução do mandado de detenção (art. 22.º, n.º 1, da Lei 65/2003, de 23-08), não é admissível recurso dessa decisão, oral e proferida em acta, pois a mesma não sujeitou o detido a qualquer medida restritiva de liberdade, não obstante tal ter sido expressamente requerido pelo MP logo na própria acta, o que foi indeferido. II - Com efeito, só é admissível recurso da decisão que mantiver a detenção, ou a substituir por medida de coacção, ou da decisão final sobre a execução do mandado de detenção europeu (art. 24.º, n.º 1, als. a) e b) da Lei 65/2003), sendo o prazo de interposição de 5 dias contados a partir da notificação da decisão ou, tratando-se de decisão oral reproduzida em acta, a partir da data em que tiver sido proferida (art. 24.º, n.º 2, do mesmo diploma legal). III - E no caso em apreço, a decisão objecto do recurso não manteve a detenção nem a substituiu por medida de coacção. IV - No âmbito do MDE, se uma decisão for tomada por uma autoridade judiciária competente à luz do direito interno do Estado membro de onde procede e em conformidade com o direito desse Estado, a mesma produz efeitos e tem plena eficácia no conjunto do território da União, não podendo o Estado membro de execução do MDE dificultar o cumprimento daquela decisão, que se deve considerar como sua, por força do princípio do reconhecimento mútuo no âmbito do direito penal, em conformidade com a Lei 65/2003, de 23-08 e com a Decisão-Quadro 2002/584/JAI, de 13-06, do Conselho. V - Por isso, o Estado Português, ante o MDE em causa nos autos, e muito embora o requerido seja cidadão português, apenas pode fazer o controle dos direitos fundamentais do arguido, já que a decisão – polaca – produz efeitos equivalentes a uma decisão tomada no nosso País. VI - A garantia prevista no art. 13.º, al. a), da Lei 65/2003, de 23-08 [A execução do mandado de detenção europeu só terá lugar se o Estado membro de emissão prestar uma das seguintes garantias: a) Quando o mandado de detenção europeu tiver sido emitido para efeitos de cumprimento de uma pena ou medida de segurança imposta por uma decisão proferida na ausência do arguido e se a pessoa em causa não tiver sido notificada pessoalmente ou de outro modo informada da data e local da audiência que determinou a decisão proferida na sua ausência, só será proferida decisão de entrega se a autoridade judiciária de emissão fornecer garantias consideradas suficientes de que é assegurada à pessoa procurada a possibilidade de interpor recurso ou de requerer novo julgamento no Estado membro de emissão e de estar presente no julgamento], só é de exigir se a decisão, que impôs a pena cujo cumprimento se pretende através da execução do MDE, tiver sido proferida na ausência do arguido e este não tiver sido notificado pessoalmente ou de outro modo informado da data e local da audiência que aquela determinou. VII - Ora, na situação dos autos, o arguido teve conhecimento da data e do local de realização da audiência de julgamento que determinou a decisão condenatória; esteve presente, pelo menos, na primeira sessão desse julgamento; esteve representado por advogado ao longo de todo o julgamento; e se não esteve noutra ou noutras sessões foi porque não quis, ou seja, ao arguido foi dada a possibilidade efectiva de exercer os seus direitos de defesa, não lhe sendo aplicável o disposto no art. 13.º, al. a), da Lei 65/2003, de 23-08. VIII - Mas entendendo-se – como parece que entendeu o acórdão recorrido – que era necessária a comprovação da notificação pessoal da sentença ao arguido, então deveria o Tribunal da Relação ter solicitado tal comprovação e só depois proferir decisão.
Proc. n.º 2158/08 -3.ª Secção
Fernando Fróis (relator)
Henriques Gaspar
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