ACSTJ de 22-02-2007
Concurso de infracções Cúmulo jurídico Medida da pena
I - A pena aplicável ao concurso de crimes «tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes [...] e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes» (art. 77.º, n.º 2, do CP). Donde que o somatório das penas «menores» (no caso, 15,75 anos de prisão, correspondente a 5 anos de prisão, por roubo agravado, + 3 anos e 9 meses + 3 anos e 6 meses de prisão + 3 anos e 6 meses de prisão, todos estas por crime de furto qualificado) deva, por regra, sofrer, na sua adição à «maior» (no caso, 5 anos de prisão), determinada «compressão». II - Tudo estará, pois, em apurar qual a compressão a imprimir, em cada caso, ao somatório das penas menores (já que a pena «maior», constituindo o limite mínimo da pena única, é, naturalmente, intangível). III - Neste âmbito, a consideração conjunta dos factos, da idade (28 anos ao tempo e quase 30 anos agora) e da personalidade do agente («O arguido trabalhava como artesão e vivia, antes de preso, com o pai; era toxicodependente de heroína; já fora condenado, em 01Jul04, por cheque sem provisão, em pena de multa, cuja prisão alternativa vem cumprindo, desde 14Nov06»), aponta, dentro daqueles limites, para uma pena conjunta de 8 anos de prisão, como que se adicionando, à mais elevada das penas parcelares, cerca de 30% das demais. IV - Sem que, porém, se veja nesta «operação valorativa» um mero «processo de fracções e somas», porventura «incompatível com a natureza própria da segunda fase do processo», na medida em que «fazer contas indica[ria] voltar às penas já medidas, ao passo que o sistema parece exigir um regresso aos próprios factos» (ibidem). Todavia, o juiz – na prática – não poderá dispensar-se de «fazer contas» como forma de, numa primeira abordagem, obter um terceiro termo ou espaço de referência (dentro da enorme latitude conferida pelos outros dois termos: o limite mínimo e o limite máximo da pena única), isto é, para se alcançar, entre os extremos, um ponto que fixe, geometricamente, o «encontro» entre essas duas variáveis. Pois que, se «a pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos, tratando-se de pena de prisão (…), e tem como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes» (art. 77.º, n.º 2, do CP), tudo se passará, em termos práticos, como se o somatório das penas «menores» sofresse, na sua adição à «maior», uma maior ou menor «compressão», sendo que esse «factor [dito de] de compressão» será tanto maior quanto maior o somatório das penas «menores», pois que, de outro modo, o terceiro termo ou espaço de referência tenderia a aproximar-se excessivamente do máximo da moldura do concurso, conduzindo à fixação no máximo (ou muito próximo dele) de penas conjuntas decorrentes de penas parcelares de valor consideravelmente diverso (cf. Ac. do STJ de 09-05-2002, Proc. n.º 1259/02). V - Por um lado, é sabido que, em sede de pena conjunta/unitária, «tudo deve passar-se como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique» (Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, § 421), sendo certo que no caso os furtos e o roubo – cometidos num curto período de pouco mais de um mês – tiveram em comum a circunstância de haverem sido cometidos para «alimentar» a toxicodependência do arguido e dos seus comparsas. VI - Por outro, é geralmente entendido que, na «avaliação da personalidade – unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (…) criminosa, ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade, só no primeiro caso [que não será o dos autos, em que terá sido a toxicodependência do arguido a mobilizar todos os seus crimes] sendo cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta» (a. e ob. cit., § 421). VII - «De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização)» (ibidem), ante a circunstância de o arguido – com uma só condenação anterior, em pena de multa, apesar de contar quase 30 anos de idade – estar preso desde 07Nov05 e, à data da condenação (28JUL06), não consumir heroína «há sete meses».
Proc. n.º 337/07 - 5.ª Secção
Carmona da Mota (relator) **
Pereira Madeira
Simas Santos
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