Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Sumários do STJ (Boletim) - Criminal
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ACSTJ de 28-02-2007
 Reincidência Pressupostos Pluriocasionalidade
I - A agravação da pena do delinquente que cometeu crimes depois de condenado anteriormente por outros da mesma espécie (reincidência específica, própria ou homótropa) ou de espécie diferente (reincidência genérica, imprópria ou polítropa) assenta, essencialmente, num maior grau de culpa, decorrente da circunstância de, apesar de já ter sido condenado, insistir em praticar o mal, em desrespeitar a ordem jurídica, conquanto não lhe seja alheia, também, a perigosidade, ou seja, o perigo revelado, face à persistência em delinquir, de voltar a cometer outros crimes.
II - Certo que, estabelecendo o art. 75.°, n.º 1, do CP, que é punido como reincidente quem, por si ou sob qualquer forma de participação, cometer crime doloso que venha a ser punido com prisão efectiva superior a 6 meses, depois de ter sido condenado por sentença transitada em julgado em pena de prisão efectiva superior a 6 meses por outro crime doloso, se, de acordo com as circunstâncias do caso, o agente for de censurar por a condenação ou as condenações anteriores não lhe terem servido de suficiente advertência contra o crime, o fundamento da agravação da pena, a culpa agravada do delinquente, resulta do facto de dever ser censurado por a condenação ou condenações anteriores não terem constituído suficiente advertência contra o crime.
III - É que a recidiva criminosa pode resultar de causas meramente fortuitas ou exclusivamente exógenas, caso em que, obviamente, inexiste fundamento para a agravação da pena, visto não poder afirmar-se uma maior culpa referida ao facto. Nesse caso não se está perante um reincidente, antes face a um simples multiocasional.
IV - Ora, a censura do delinquente por não ter atendido a admonição contra o crime resultante da condenação ou condenações anteriores pressupõe e implica uma íntima conexão entre os crimes reiterados, conexão que poderá, em princípio, afirmar-se relativamente a factos de natureza análoga, segundo os bens jurídicos violados, os motivos, a espécie e a forma de execução [cf. Figueiredo Dias, Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, pág. 269, com a advertência de que a conexão poderá ser excluída, face a certas circunstâncias, entre elas, o afecto, a degradação social e económica, a experiência especialmente criminógena da prisão, por impedirem de actuar a advertência resultante da condenação ou condenações anteriores], a significar que o juízo necessário quanto à verificação deste pressuposto material da reincidência é distinto, consoante estejamos perante reincidência homótropa ou própria ou reincidência polítropa ou imprópria.
V - Com efeito e como se consignou no acórdão deste STJ de 09-06-2004, Proc. n.º 1128/04 - 3, na reincidência específica ou homótropa, a verificação da ausência de efeitos positivos de anterior condenação surge, em regra, deduzida in re ipsa, sem necessidade de integração através de verificações adjacentes ou complementares: in re, porém, não como uma qualquer decorrência automática, apenas no sentido em que a relação entre a condenação anterior e a prática posterior de um mesmo crime, em condições semelhantes (como é o tráfico de estupefacientes), e logo durante o período de liberdade condicional, revela suficientemente, em tal relação, que a condenação anterior não teve o efeito de advertência contra a prática de novo crime, isto é, que prevenisse a reincidência.
VI - É o que inequivocamente se verifica no caso vertente, já que o arguido BM sofreu inúmeras condenações anteriores em penas de prisão, algumas já cumpridas, pela perpetração de crimes de furto e de furto qualificado, entre Janeiro de 1998 e Março de 2003, sendo que após o trânsito em julgado das respectivas sentenças condenatórias cometeu os crimes de roubo, de roubo qualificado e de extorsão objecto dos presentes autos, crimes estes de natureza análoga aos crimes de furto e de furto qualificado pelos quais foi anteriormente condenado. Por outro lado, à data dos factos objecto dos presentes autos o arguido BM, como expressamente consta da decisão proferida sobre a matéria de facto, encontrava-se em liberdade condicional.
VII - Por isso, bem andou o tribunal a quo ao considerar o arguido BM reincidente e ao condená-lo como tal, tanto mais que o mesmo foi acusado em tal qualidade, achando-se verificados os demais pressupostos do respectivo instituto, sendo certo que dos autos nada consta susceptível de excluir a conexão existente entre os crimes objecto das anteriores condenações e os crimes objecto dos autos.
Proc. n.º 9/07 - 3.ª Secção Oliveira Mendes (relator) Henriques Gaspar Soreto de Barros Maia Costa