ACSTJ de 24-10-2006
Juiz natural Direitos de defesa Recusa Juiz Imparcialidade Recurso penal Prova
I - A consagração do princípio do juiz natural ou legal (intervirá na causa o juiz determinado de acordo com as regras da competência legal e anteriormente estabelecidas) surge como uma salvaguarda dos direitos dos arguidos e encontra-se inscrito na Constituição (art. 32.º, n.º 9: “nenhuma causa pode ser subtraída ao tribunal cuja competência esteja fixada em lei anterior”). II - Mas a possibilidade de ocorrência, em concreto, de efeitos perversos desse princípio, levou à necessidade de os acautelar através de mecanismos que garantam a imparcialidade e isenção do juiz, também garantidos constitucionalmente (arts. 203.º e 216.º), quer como pressuposto subjectivo necessário a uma decisão justa, quer como pressuposto objectivo na sua percepção externa pela comunidade, e que compreendem os impedimentos, suspeições, recusas e escusas. III - Só é licito recorrer a tais mecanismos em situação limite, quando exista motivo sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade. IV - Nos termos do art. 43.º, n.º 1, do CPP, a recusa de juiz pressupõe que:- a sua intervenção no processo corra risco de ser considerada suspeita;- por se verificar motivo sério e grave;- adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade. V - É, pois, imprescindível a ocorrência de um motivo sério e grave, do qual ou no qual resulte inequivocamente um estado de forte verosimilhança (desconfiança) sobre a imparcialidade do juiz (propósito de favorecimento de certo sujeito processual em detrimento de outro), a avaliar objectivamente. VI - Na verdade, não basta a simples discordância jurídica em relação aos actos processuais praticados por um juiz que podem conduzir à impugnação processual; não basta um puro convencimento subjectivo por parte de um dos sujeitos processuais para que se verifique a suspeição, tendo de haver uma especial exigência quanto à objectiva gravidade da invocada causa de suspeição, pois do uso indevido da recusa resulta, como se viu, a lesão do princípio constitucional do juiz natural, ao afastar o juiz por qualquer motivo fútil, posições que então igualmente em consonância com a Convenção Europeia dos Direitos do Homem e a jurisprudência sobre ela tirada. VII - No incidente de recusa é preciso demonstrar e provar que o Magistrado recusado pecou, objectivamente, por falhas graves e sérias, que são determinadas por este não ter sido imparcial ao beneficiar injustamente uma das partes em detrimento da outra, isto é, não decidiu em função dos factos apurados e do direito aplicável. VIII - É preciso demonstrar a existência de motivo, sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade, tudo isto de um ponto de vista puramente objectivo, à luz de um cidadão médio da comunidade em causa.
Proc. n.º 361/06 - 5.ª Secção
Oliveira Rocha (relator)
Santos Carvalho
Costa Mortágua
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