Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
Actualidade | Jurisprudência | Legislação pesquisa:


    Sumários do STJ (Boletim) - Criminal
Procurar: Assunto    Área   Frase
Processo   Sec.                     Ver todos
ACSTJ de 25-10-2006
 Escolha da pena Culpa Prevenção geral Prevenção especial Pena de substituição Suspensão da execução da pena Medida concreta da pena
I - As considerações de culpa não devem ser levadas em conta na escolha da pena. Na verdade, o juízo de culpa já foi feito: antes de se colocar a questão da escolha da pena importou já decidir sobre a aplicação da pena de prisão e sobre a sua medida concreta, para o que foi decisivo um juízo (concreto) sobre a culpa do agente.
II - As exigências de prevenção geral e especial são os factores determinantes na escolha da pena, embora, neste contexto, prevaleça a ponderação da prevenção especial de socialização, primeiro, porque o tribunal só deve negar a aplicação de uma pena alternativa ou de uma pena de substituição quando a execução da prisão se revele, do ponto de vista da prevenção especial de socialização, necessária ou, em todo o caso, provavelmente mais conveniente do que aquelas penas; coisa que só raramente acontecerá se não se perder de vista o já tantas vezes referido carácter criminógeno da prisão, em especial da de curta duração, e, em segundo lugar, porque, uma vez recusada pelo tribunal a aplicação efectiva da prisão, resta ao dispor do julgador mais do que uma espécie de pena de substituição, sendo ainda considerações de prevenção especial de socialização que devem decidir qual das espécies de penas de substituição abstractamente aplicáveis deve ser a eleita.
III - A prevenção geral surge aqui sob a forma do conteúdo mínimo de prevenção de integração indispensável à defesa do ordenamento jurídico, como limite à actuação das exigências de prevenção especial de socialização. Ou seja, desde que impostas ou aconselhadas à luz de exigências de socialização, a pena alternativa ou a pena de substituição só não serão aplicadas se a execução da pena de prisão se mostrar indispensável para que não sejam postas irremediavelmente em causa a necessária tutela dos bens jurídicos e a estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias.
IV - Por outro lado, a prevenção geral é encontrada nos dias de hoje, não através de uma pura intimidação negativa, mas mediante a afirmação positiva do Direito Penal.
V - Pressuposto básico da aplicação de pena de substituição ao arguido recorrente é a existência de factos que permitam um juízo de prognose favorável em relação ao seu comportamento futuro. É necessário que o tribunal esteja convicto de que a censura expressa na condenação e a ameaça de execução da pena de prisão aplicada sejam suficientes para afastar o arguido de uma opção desvaliosa em termos criminais e para o futuro.
VI - Tal juízo tem de se fundamentar em factos concretos que apontem de forma clara uma forte probabilidade de uma inflexão em temos de vida, reformulando os critérios de vontade de teor negativo e renegando a prática de actos ilícitos.
VII - Se no contexto da decisão proferida se verifica que o arguido já foi objecto de condenação por infracções menores (não podendo, todavia, invocar-se um bom comportamento anterior), não demonstra “ressonância afectiva” pelos factos praticados [crime de maus tratos p. e p. pelo art. 152.º, n.º 2, do CP] e não deu cumprimento a acordo celebrado para pagamento de indemnização, não está evidenciado qualquer elemento a nível comportamental que permita inferir uma inflexão de vida e um repúdio da sua atitude de desrespeito pela vítima.
VIII - O pressuposto material de afirmação do juízo de prognose subjacente à suspensão da execução da pena prisão deve emergir de uma dupla génese, ou seja, das circunstâncias do facto e da personalidade do agente.
IX - No caso concreto, os factos indicados não apontam qualquer alteração da personalidade do arguido, ou seja, qualquer alteração positiva do seu perfil comportamental em relação ao momento da prática dos factos. Assim sendo o impulso imediato será o da negação da existência daquele juízo de prognose. Todavia, importa recuperar a posição inicialmente sufragada de que o tribunal só deve negar a aplicação de uma pena alternativa ou de uma pena de substituição quando a execução da prisão se revele, do ponto de vista da prevenção especial de socialização, necessária ou, em todo o caso, provavelmente mais conveniente do que aquelas penas.
X - É nessa perspectiva que importa considerar, para além da circunstância de o arguido ter uma profissão definida, auferindo um vencimento determinado, que os crimes pelos quais o arguido foi condenado constituem infracções de uma menor intensidade em termos de ilicitude e que, de acordo com o que consta dos autos, o arguido e a vítima terminaram a sua vida conjunta, pelo que desapareceram as condições mais importantes para a violência praticada pelo arguido.
XI - Neste quadro justifica-se a suspensão da pena de 3 anos de prisão aplicação ao arguido pela 1.ª instância, por igual período, sob condição de pagamento, no prazo de 60 dias, improrrogáveis, da totalidade da quantia relativa ao acordo que incidiu sobre o pedido de indemnização civil, a que acresce a obrigação de evitar quaisquer contactos com a vítima salvo aqueles que tiverem a aquiescência desta.
Proc. n.º 2938/06 - 3.ª Secção Santos Cabral (relator) Oliveira Mendes Henriques Gaspar Pires Salpico