Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Sumários do STJ (Boletim) - Criminal
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ACSTJ de 27-09-2006
 Expulsão Fundamentos Perda de bens a favor do Estado Veículo
I - A pena acessória de expulsão de estrangeiro residente no país, prevista no art. 101.°, n.º 2, do DL 244/98, de 08-08, depende da verificação de determinados pressupostos positivos, e da não ocorrência de alguma das situações previstas no n.° 4 da mesma disposição.
II - Nos termos do n.º 2 do art. 101.° do referido diploma, a pena de expulsão pode ser imposta a um estrangeiro residente no país, condenado por crime doloso em pena superior a um ano de prisão, devendo, porém, ter-se em conta, na respectiva aplicação, a gravidade dos factos praticados, a personalidade do agente, a eventual reincidência, o grau de inserção na vida social, a prevenção especial e o tempo de residência em Portugal.
III - A decisão de expulsão, que constitui uma ingerência na vida da pessoa expulsa, pressupõe sempre uma avaliação de justo equilíbrio, de razoabilidade, de proporcionalidade, de fair balance entre o interesse público, a necessidade da ingerência e a prossecução das finalidades referidas no art. 8.°, n.º 2 da Convenção Europeia, e os direitos do indivíduo contra ingerências das autoridades públicas na sua vida e na relações familiares, que podem sofrer uma séria afectação com a expulsão, especialmente quando a intensidade da permanência no país de residência corta as raízes ou enfraquece os laços com o país de origem.
IV - Tendo o tribunal recorrido aplicado ao arguido uma pena de acessória de expulsão, pela prática de um crime de tráfico de estupefaciente p. e p. pelo art. 21.º, n.º 1, do DL 15/93, de 22-01, justificando-a com a circunstância de o crime praticado atentar inevitavelmente contra a ordem pública, e por «tal tipo de criminalidade» constituir «um real perigo social, tanto mais reforçado pela considerável quantidade e tipo de produto estupefaciente a que o arguido acedeu», após ponderar também o facto de o recorrente (à data da prática dos factos e nos cerca de seis meses que a precederam) ter visitado a sua filha, que vive com a mãe, «duas ou três vezes, não cuidando dela, nem lhe garantindo o sustento e educação», proferiu decisão cuja fundamentação é isenta de reparos, e justifica de modo evidente a aplicação da pena acessória.
V - A perda de bens a favor do Estado, a que aludem os arts. 35.º, n.º 1, e 36.º, n.º 2, ambos do DL 15/93, de 22-01, é um instrumento de natureza substantiva; abrange os instrumentos e os produtos do crime, incluindo os objectos que serviram para a prática do crime. Não constitui uma medida cautelar de processo, já que as finalidades cautelares são realizadas com a apreensão, mas é também, de certo modo, uma medida preventiva.
VI - Os fundamentos para a declaração de perda previstos em uma e outra disposição são essencialmente diversos. A perda dos «objectos que tiverem servido» «para a prática de uma infracção» relacionada com estupefacientes tem como fundamento a existência ou a preexistência de uma ligação funcional e instrumental entre o objecto e a infracção, de sorte que a prática da infracção tenha sido especificamente conformada pela utilização do objecto; este há-de ter sido elemento integrante da concepção material externa e da execução do facto, de modo que a execução não teria sido possível, ou teria sido essencialmente diferente, na modalidade executiva que esteja em causa, sem a utilização ou a intervenção do objecto.
VII - Nesta perspectiva, a decisão de perda de objectos deve ter como pressuposto a individualidade executiva e a relevância instrumental, determinante ou essencialmente conformadora do objecto no processo de execução e de cometimento do crime.
VIII - Não estado provado o uso determinante do veículo em qualquer acto executivo concretamente descrito, em que a utilização do veículo se revelasse instrumentalmente necessária ou essencialmente modeladora do modo de cometimento da infracção, não é possível concluir que aquele objecto (o veículo) «tivesse servido para a prática da infracção» (tráfico de estupefacientes).
Proc. n.º 2802/06 - 3.ª Secção Henriques Gaspar (relator) Silva Flor Soreto de Barros Armindo Monteiro