Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Sumários do STJ (Boletim) - Criminal
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ACSTJ de 27-09-2006
 Tráfico de estupefacientes Tráfico de estupefacientes agravado Avultada compensação remuneratória Medida concreta da pena Perda de bens a favor do Estado Ónus da prova Restituição
I - A circunstância agravativa prevista na al. c) do art. 24.º do DL 15/93, de 22-01, só se verifica em casos de excepcional gravidade, ligados ao tráfico de grande escala, em que estejam em causa valores de patamar situado muito além das quantias que se auferem nos negócios correntes, representando aos olhos do cidadão de condição económica média uma expressão monetária de impressionante dimensão.
II - Aquém desse nível, ainda que a compensação assuma expressão significativa, a conduta é punível nos termos do art. 21.º, cuja ampla moldura penal permite relevar graus elevados de ilicitude relativa ao ganho obtido ou que se procurava obter.
III - A compensação que o recorrente iria auferir pelo mero transporte da canabis para Espanha (€ 2500) não atinge aquele nível que impressione pela sua magnitude, embora a quantidade de produto estupefaciente em causa - cerca de 500 kg de canabis - na venda a pequenos traficantes e consumidores pudesse proporcionar ganhos muito superiores na fase seguinte do tráfico, dado que o que releva no caso é o ganho do recorrente.
IV - Dentro da moldura penal abstracta correspondente ao crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art. 21.º, n.º 1, do DL 15/93, de 22-01, ou seja, a de 4 a 12 anos de prisão, e tendo em consideração que:- não obstante terem sido encontrados cerca de 500 kg de canabis, o tribunal deu como provado que o arguido tinha a posse apenas de 20 250 g (quantidade existente dentro do veículo), pelo que é com referência a esta quantidade que a responsabilidade penal há-de ser aferida;- o arguido não tem antecedentes criminais conhecidos e mostra-se arrependido, é pessoa bem comportada e trabalhadora, sendo estimado por todos quantos o conhecem;- confessou parcialmente os factos;- embora se tratasse de uma quantidade significativa de produto estupefaciente, há que atender à circunstância de pertencer ao grupo das chamadas «drogas leves», de menor nocividade para a saúde;- o arguido é cidadão marroquino, em situação irregular em Portugal, com ordem não cumprida para abandonar o país, o que não facilita a sua reinserção social;- as exigências de prevenção especial e geral são prementes neste tipo de criminalidade, já que, face à difusão do tráfico que alimenta o consumo das drogas, há que prevenir de forma eficaz a prática de futuros crimes pelo arguido e assegurar a confiança da comunidade na validade da norma;não se verificando uma diminuição significativa da culpa, e sendo o grau de ilicitude elevado, em função da quantidade de produto estupefaciente objecto do tráfico, considera-se adequada a pena de 5 anos de prisão.
V - Desde sempre se entendeu que os objectos apreendidos durante a instrução, na vigência do CPP29, ou o inquérito, a partir do actual CPP, devem ser restituídos, findo o julgamento do processo, a quem os possuía na ocasião da apreensão, desde que não devam ser declarados perdidos a favor do Estado ou não devam ter outro destino legal.
VI - Tendo o tribunal colectivo consignado no elenco dos factos não provados que, para além da quantia de € 2500, não se provou que o restante dinheiro apreendido fosse proveniente de anteriores vendas de produtos estupefacientes, tendo determinado que tal quantia apreendida seja restituída a quem comprovar ser seu legítimo proprietário, tem razão o recorrente ao alegar que devia ter sido ordenado que a mesma lhe fosse restituída.
VII - Não impendia sobre o arguido o ónus de provar que o dinheiro que lhe foi apreendido lhe pertencia, já que, tendo a posse do mesmo, goza da presunção da titularidade do direito, no caso o direito de propriedade (art. 1268.º, n.º 1, do CC), pelo que aquele lhe deve ser restituído.
Proc. n.º 2806/06 - 3.ª Secção Silva Flor (relator) Soreto de Barros Armindo Monteiro Sousa Fonte