Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Sumários do STJ (Boletim) - Criminal
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ACSTJ de 15-01-2003
 Homicídio Compreensível emoção violenta
I - A 'compreensível emoção violenta' prevista no art. 133.º do CP corresponde a um forte estado de afecto emocional provocado por uma situação pela qual o agente não pode ser censurado e à qual também o homem normalmente 'fiel ao direito' não deixaria de ser sensível. Esse forte estado de afecto, segundo a tipicidade exigida, deve ter dominado o agente, tudo conduzindo a uma exigibilidade diminuída de comportamento diferente e, portanto, à comprovação, numa avaliação conjunta e global da situação, de uma diminuição sensível da culpa.
II - Estando provado que:- No dia 5-11-1998, num mercado municipal, a arguida e M..., ambas vendedoras de peixe, travaram-se de razões entre si, por motivos não apurados;- Havendo entre elas, nos últimos anos, relacionamento inamistoso, que deu origem a alguns desentendimentos, no decurso dos quais M...chegou a 'crismar de puta' a arguida, o que de novo sucedeu no mencionado dia;- Em face disto, a arguida, sentindo-se magoada e ofendida por tal apodo, exaltou-se e, num movimento súbito, pegou numa faca de cozinha, que utilizava para cortar e amanhar o peixe, a qual cravou no pescoço de M..., provocando nesta diversas lesões que lhe determinaram a morte,os factos descritos não fundamentam uma 'emoção violenta', mas apenas 'mágoa' com subsequente exaltação, estados não configuráveis como integrantes daquele conceito e, por consequência, não sendo suporte para afirmar o elemento do 'domínio' do agente vocacionado para uma exigibilidade diminuída de outro comportamento e, por aí, a uma diminuição sensível da culpa.
III - Aliás, a existência de uma 'emoção violenta' na sua relação com a causa que lhe teria dado origem não seria compreensível no âmbito da reacção do homem normalmente fiel ao direito, por não ser entendível como razoável que a situação criada pela vítima tivesse em si a potencialidade para produzir uma alteração emocional tão intensa que conduzisse ao descontrolo da consciência e da vontade, subjugando a arguida ao ponto de a dominar e arrastar para uma agressão de tal violência como aquela que no caso ocorreu.
Proc. n.º 2092/02 - 3.ª Secção Virgílio Oliveira (relator) Flores Ribeiro Lourenço Martins Borge