Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Sumários do STJ (Boletim) - Criminal
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ACSTJ de 08-01-2003
 Abuso de confiança Infidelidade
I - Constando da matéria de facto que:- Ao actuar pela forma descrita, apoderou-se o arguido da quantia de Esc. 9.991.000$00, fazendo-a sua, sabendo que a mesma não lhe pertencia e que lhe fora entregue na qualidade em que interveio no negócio por si conduzido, perfeitamente ciente de que essa quantia pertencia por inteiro aos ofendidos, donos da fracção autónoma vendida, aos quais deveria ter sido entregue;- Ao entregar a letra de seu aceite pessoal, no valor de 9.700.000$00, à ofendida, no próprio dia da escritura de compra e venda, letra essa que ele sabia não poder ser descontada no Banco por não ter crédito na praça, o arguido jamais teve a intenção de proceder ao seu pagamento, pois que já se apoderara da quantia de 9.991.000$00, que integrou no seu património, utilizando tal expediente para mais facilmente fugir às suas responsabilidades e evitar a eventual participação criminal que acabou por ser apresentada pelos arguidos,claramente aponta a mesma para uma intenção de lucro, para um dolo de apropriação, e não para uma intenção de causar prejuízo. Como também aponta para o termo do encargo de dispor de interesses patrimoniais alheios ou de os administrar ou fiscalizar. Realizado o negócio, terminado o encargo do arguido, restava-lhe apenas entregar o dinheiro aos seus donos. E foi isso que ele não fez, passando a comportar-se como dono, invertendo o título por que possuía ou detinha.
II - Por isso, em face da matéria de facto provada, estão reunidos todos os requisitos objectivos típicos do crime de abuso de confiança: a entrega válida de uma coisa móvel (importância em dinheiro), por título não translativo de propriedade, para um fim determinado; a dissipação (gasto ilícito daquilo a que devia ser dado aquele fim determinado), que traduz a inversão do título de posse - passando o agente a dispor da coisa como se fosse sua, o mesmo não se podendo dizer quanto ao tipo de crime do art. 224.º do CP (infidelidade) que reclama um agir intencional para causar prejuízo patrimonial.
III - A apropriação e o respectivo dolo não são afastados, antes pelo contrário são confirmados pelo segmento factual provado de que 'perante a participação criminal e contra a apresentação pelos ofendidos de um requerimento de desistência de queixa, só em meados de Abril de 2002 o arguido entregou àqueles a quantia correspondente a Esc. 9.000.000$00, titulada por cheques, que eles já receberam, e ainda um outro cheque, no valor correspondente a Esc. 1.500.000$00, que os mesmos ofendidos têm em seu poder'.
IV - Trata-se de elemento de facto que denuncia e objectiva, não um simples uso indevido com intenção de restituir, mas uma apropriação ilegítima e dolo que a abarca.
Proc. n.º 3319/02 - 3.ª Secção Virgílio Oliveira (relator) Flores Ribeiro Borges de Pinho Louren