Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Sumários do STJ (Boletim) - Cível
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ACSTJ de 21-04-2009
 Contrato-promessa de compra e venda Vinculação de pessoa colectiva Culpa in contrahendo Princípio da confiança Presunção de culpa Interesse contratual negativo Obrigação de indemnizar Restituição do sinal
I -Nos termos do art. 227.º, n.º 1, do CC, a responsabilidade pré-contratual pressupõe uma conduta eticamente censurável, e de forma acentuada, em termos idênticos aos do abuso de direito, assentando num conceito que o lei não determina com precisão -a boa fé -, exigindo um processo que a concretize, em cada situação da vida real em que se possa verificar.
II - A culpa in contrahendo, consagrada nesse dispositivo, existe, assim, quando a violação dos deveres essenciais de protecção, informação e lealdade, conduza à frustração da confiança criada na contraparte pela actividade anterior do violador ou quando essa mesma violação retire às negociações o seu sentido substancial profundo de busca de um consenso na formação de um contrato válido, apto a prosseguir o escopo que, em termos de normalidade, as partes lhe atribuam, e portanto eficaz, podendo tal violação consistir numa mera omissão ou na prática de um acto positivo.
III - Nos casos de responsabilidade pré-contratual é ressarcível o dano negativo ou de confiança, resultante de lesão do interesse contratual negativo, isto é, o dano que o lesado não teria sofrido se não tivesse entrado em negociações ou se não tivesse celebrado o contrato nulo, anulável ou ineficaz, ou mesmo, em circunstâncias excepcionais, eficaz.
IV - Celebrado validamente um contrato-promessa entre a A. e um sócio-gerente da R., mas vindo a ré sociedade afirmar que afinal não o celebrara, manifesto é que houve falta de probidade e lisura determinante de quebra de confiança negocial da autora na ré, justificando que aquela se convencesse de que esta não o pretendia cumprir nos termos acordados.
V - A responsabilidade pré-contratual é predominantemente qualificada, na doutrina e na jurisprudência, como tendo a natureza de responsabilidade contratual, face à relação análoga à contratual que as negociações desencadeiam entre as partes, sendo portanto sujeita ao regime desta, nomeadamente no que respeita a presunção de culpa (art. 799.°, n.º 1, do CC) na actuação violadora da boa fé, pelo que tem de se considerar verificada culpa da ré na emissão da declaração de não ter havido celebração do contrato-promessa, visto não ter ilidido tal presunção.
VI - A prestação do sinal e seu reforço, em relação ao contrato-promessa integra cumprimento de cláusulas do mesmo, e constitui relativamente ao contrato prometido, resultado de meras negociações preliminares, representando um dano para a A., que esta não teria sofrido se não tivesse celebrado o contrato-promessa cuja celebração a ré negou, e que é indemnizável, pois se tornou qualificável como dano, em atenção ao momento da perda de confiança da autora na ré, em consequência do rompimento das negociações conducentes à celebração do contrato-prometido como resultado da conduta da ré violadora de boa fé negocial e que corresponde a uma manifestação de vontade de não o cumprir nos seus precisos termos, o recurso ao regime próprio da responsabilidade pré-contratual.
VII - Assiste, pois, à autora, o direito a que lhe seja restituída, como indemnização, a quantia global que, como sinal e reforço deste, pagou à ré, acrescida dos juros legais respectivos a contar da citação, e não de data anterior, uma vez que não provou ter interpelado a ré anteriormente para o efeito (art. 805.°, n.º 1, do CC).
Revista n.º 458/09 -6.ª Secção Silva Salazar (Relator) Nuno Cameira Sousa Leite