Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Sumários do STJ (Boletim) - Cível
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ACSTJ de 31-03-2009
 Acidente de viação Indemnização Privação do uso de veículo Condução de motociclo Condução sem habilitação legal Nexo de causalidade Incapacidade permanente parcial Amputação Perda da capacidade de ganho Cálculo da indemnização Danos futuros
I -Ainda que se não mostre provada a utilização efectivamente conferida ao motociclo pelo autor, se como meio de deslocação para o seu local de trabalho, se como meio utilizado para o lazer, a simples privação do seu uso, independentemente da utilização a que em concreto o mesmo se destinava, constitui factor gerador da ressarcibilidade dos danos decorrentes da sua paralização, tendo em linha de conta a daí resultante indisponibilidade do bem em causa, com a consequente perda das utilidades que aquele era susceptível de gerar para o seu utilizador.
II - Porém, dado que na situação em causa vem provado que o autor não se encontrava habilitado com a carta de condução de veículos com a natureza daquele que conduzia no momento do acidente, de tal resulta que a fruição do referido veículo, por parte do mesmo, está directa e imediatamente dependente do recurso à sua condução por terceiros.
III - Perante tal circunstancialismo concreto, impendia sobre o autor, e como facto constitutivo do direito indemnizatório pelo mesmo peticionado a tal título, a alegação, e subsequente prova, da disponibilidade de um terceiro para a condução do referido motociclo, como meio de dar satisfação às eventuais necessidades de deslocação do autor, para trabalho ou lazer, bem como, também, da natureza permanente ou esporádica, e neste caso da frequência da mesma, quanto à referida disponibilização de outrem para a condução do veículo em causa -art. 342.°, n.º 1, do CC.
IV - Dado que tal factualidade não se mostra, inclusive, alegada, não pode merecer acolhimento a indemnização arbitrada ao autor a tal título, por falta do necessário nexo de causalidade, entre a privação da condução do motociclo por parte daquele como directa e imediata consequência da ocorrência do acidente, dada a apontada inadmissibilidade legal do mesmo poder exercer tal condução nas vias públicas destinadas ao trânsito rodoviário -arts. 85.°, n.º 1, al. b), do CEst de 1998 e 563.° do CC.
V - Quando ao montante da indemnização destinada a ressarcir a perda da capacidade de ganho do autor: -considerando a idade do autor à data do acidente -39 anos -, a actividade profissional que desenvolvia como instrutor de artes marciais e de segurança num estabelecimento musical, aos fins de semana, actividades estas que se mostra impedido de exercer, já que, em consequência do acidente, lhe foi amputada a perna direita, pelo terço médio, bem como o vencimento mensal que auferia no exercício das mesmas -€ 977,65 -, e sendo certo, por outro lado, que aquela actividade ligada às artes marciais, dada a sua intrínseca ligação à força física e à destreza de quem a exerce, nunca poderia ser praticada para além dos 55/60 anos, tendo em consideração uma taxa de rentabilidade financeira da ordem dos 2/3%; -entende-se equitativa a fixação da indemnização, respeitante a danos futuros, no montante de € 175 000, uma vez que não pode deixar de ser tido em devida atenção que, aquele, para além de não poder exercer a actividade de instrutor de artes marciais, igualmente se mostra privado do exercício de qualquer outra, dentro da sua área de preparação técnico-profissional, o que necessariamente implica a absoluta necessidade da sua reconversão para o desempenho de uma profissão que não demande exercícios físicos, nem exija a sua permanência em pé por largos períodos de tempo.
Revista n.º 287/09 -6.ª Secção Sousa Leite (Relator) Salreta Pereira João Camilo