Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Sumários do STJ (Boletim) - Cível
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ACSTJ de 03-02-2009
 Sociedade comercial Responsabilidade do gerente Desconsideração da personalidade jurídica
I -Para efectivar a responsabilidade do administrador para com a sociedade existem vários tipos de acções sociais: a acção sub-rogatória dos credores sociais, em que estes se substituem à sociedade para exigirem dos administradores a indemnização que a este compete (art. 78.º, n.º 2, do CSC); a acção social ut universi, proposta pela própria sociedade para obter o ressarcimento dos danos causados à sociedade com fundamento na responsabilidade civil dos administradores (art. 75.º do CSC); a acção social ut singuli, em que os sócios que representem 5% do capital social pedem a condenação dos administradores na indemnização pelos prejuízos causados à sociedade e não directamente a eles próprios (art. 77.º do CSC).
II - A responsabilidade civil dos gerentes para com a sociedade relativamente a danos causados a esta por factos próprios e violadores de deveres legais e/ou contratuais, prevista no art. 72.º, n.ºs 1 e 2, do CSC, constitui uma situação da responsabilidade obrigacional, quer porque se considera que os administradores são mandatários, quer porque negando-lhes essa qualidade, se reconhece como fonte directa das obrigações dos administradores o acto negocial da nomeação.
III - A causa de exclusão da sua responsabilidade prevista no n.º 4 do art. 72.º não exclui a responsabilidade por actuação ilícita nos termos do art. 483.º do CC, verificados os pressupostos da responsabilidade civil dos gerentes.
IV - Estão mais ou menos sistematizadas as condutas societárias reprováveis que, na vertente do abuso da responsabilidade limitada (que não se confunde com a do abuso da personalidade), podem conduzir à aplicação do instituto da desconsideração da personalidade, avultando, de entre elas: a confusão ou promiscuidade entre as esferas jurídicas da sociedade e dos sócios; a subcapitalização, originária ou superveniente, da sociedade, por insuficiência de recursos patrimoniais necessários para concretizar o objecto social e prosseguir a sua actividade; as relações de domínio grupal.
V - Para além destas situações, também se podem perfilar outras em que a sociedade comercial é utilizada pelo sócio para contornar uma obrigação legal ou contratual que ele, individualmente, assumiu, ou para encobrir um negócio contrário à lei, funcionando como interposta pessoa.
VI - A aplicação do instituto da desconsideração da personalidade jurídica tem carácter subsidiário, pois só deverá ser invocada quando inexistir outro fundamento legal que invalide a conduta do sócio ou da sociedade que se pretende atacar.
VII - O instituto não deve ser aplicado caso seja possível concluir que a responsabilidade dos gerentes não se mostra excluída, nos termos do n.º 4 do art. 72.º do CSC.
VIII - Assim acontece quando seja de extrair do facto de a venda do prédio da sociedade de que os Réus eram gerentes ter sido efectuada por 20.000.000$00, quantia muito inferior à do seu real valor, a uma outra sociedade a que um dos gerentes estava ligado, e ainda da circunstância de este ter intervindo na venda sucessiva do mesmo prédio pelo valor de 160.000.000$00, que o negócio teve carácter ilícito e que existiu negligência grosseira ou dolo dos Réus.
Revista n.º 3991/08 -1.ª Secção Paulo Sá (Relator) Mário Cruz Garcia Calejo