ACSTJ de 20-01-2009
Acidente de viação Excesso de velocidade Mudança de direcção Concorrência de culpas Culpa exclusiva Concausalidade Auto-estrada Dever de auxílio Atropelamento Incapacidade permanente parcial Danos futuros Equidade
I -A regra de que o condutor deve adoptar velocidade que lhe permita fazer parar o veículo no espaço livre e visível à sua frente (art. 24.º, n.º l, do CEst), pressupõe, obviamente, na sua observância, que não se verifiquem condições anormais ou factos imprevisíveis que alterem de súbito essa visibilidade ou prosseguimento da marcha. II - Provado que o veículo CV saiu inesperadamente da berma e retomou a sua circulação, no momento em que a viatura OV se ia cruzar com ele, foi o CV que, infringindo o art. 12.º do CEst, alterou, de súbito, a visibilidade da faixa de rodagem e o prosseguimento da marcha do OV, cortando-lhe a respectiva linha de trânsito, circunstância anormal e manobra imprevisível com que a condutora do OV não era obrigada a contar e que fez com que esta não pudesse parar no espaço livre e visível à sua frente. III - Não se tendo provado a velocidade a que a condutora do OV circulava, nem tão pouco que a velocidade de que seguia animada fosse excessiva para as circunstâncias que concretamente se lhe deparavam, não se apurou que tivesse contribuído com qualquer parcela de culpa para a produção do sinistro. IV - Foi a manobra do CV, seguro na recorrente, que foi causal do acidente, tornando o respectivo condutor culpado exclusivo pela sua produção, conforme foi decidido pela Relação. V - Provado que ao avistar o embate da viatura que se despistou e receando pelo estado do seu condutor, a A. Maria Celeste parou o seu veículo, encostando-o na berma direita; em seguida e já depois de ter saído da sua viatura e de terem parado outros veículos, por ter sido acometida de uma tontura, encostou-se aos railes, ali permanecendo apoiada até recuperar daquela súbita indisposição, aí tendo sido atropelada pelo FM, a conduta da A., apesar de objectivamente ser violadora do art. 72.º, n.º l, do CEst, não deve ser considerada ilícita, nem culposa, e antes deve ser considerada justificada, visto que, no fundo, tinha em vista o cumprimento do dever de auxílio a sinistrado que impende sobre a generalidade dos condutores perante um acidente de viação. VI - Acresce que esta autora não se encontrava em local próximo da faixa de rodagem (mas junto aos railes), nem estava a impedir ou a dificultar o trânsito. Assim, a A. é apenas lesada, vítima do acidente provocado, não tendo contribuído para a sua produção, nem para o agravamento dos danos que sofreu. VII - O lesado não tem de alegar perda de rendimentos laborais para o tribunal lhe atribuir indemnização por ter sofrido incapacidade parcial permanente. Apenas tem de alegar e provar que sofreu incapacidade permanente parcial, dano esse cujo valor deve ser apreciado equitativamente. VIII - Provado que à data do acidente, a autora L tinha 27 anos e frequentava um curso universitário, que já concluiu; que em consequência das lesões sofridas apresenta cervicalgias e síndrome pós traumático, traduzido em cefaleias, insónias, fobias, dores de cabeça, perdas de memória, deficiências de concentração, nervosismo e irritabilidade fácil; ao longo de toda a sua vida terá de suportar frequentes dores de cabeça e tonturas; que tais sequelas acarretam-lhe uma incapacidade parcial permanente para o trabalho de 5 %, repercutindo-se na sua vida diária, provocando-lhe sofrimento físico, e na sua capacidade funcional, exigindo-lhe um maior esforço de concentração, no exercício das suas funções, em prudente arbítrio e com esta fundamentação, julga-se equitativo e razoável manter em 12.500 euros, a indemnização por esse dano patrimonial futuro resultante da IPP de 5% de que esta autora ficou a padecer. IX - Provado ainda que a sua irmã tinha 27 anos de idade e a mesma qualificação académica; que em consequência do acidente apresenta lombalgias intensas, agravadas pela bipedestação prolongada e movimentação da coluna lombar, cãimbras musculares dos membros inferiores, síndrome pós traumático, com alterações da personalidade, traduzidas em amnésias, nervosismo, irritabilidade fácil, falta de concentração, tonturas, fobia de condução e estados depressivos, bem como cicatrizes viciosas ao nível da região frontal de cerca de 10 cm e 6 cm; e que tais sequelas acarretam-lhe uma incapacidade parcial permanente para o trabalho de 10%, recor-rendo à equidade, julga-se também criterioso manter em 25.000 euros a indemnização por este dano patrimonial futuro.
Revista n.º 3825/08 -6.ª Secção Azevedo Ramos (Relator) Silva Salazar Nuno Cameira
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