ACSTJ de 18-12-2008
Contrato de mútuo Empréstimo bancário Usufrutuário Doação Obras Acção de reivindicação Abuso do direito
I -Tendo o Autor contraído um empréstimo bancário, conjuntamente com o seu filho e nora, na qualidade de usufrutuário de um imóvel, sendo o filho dono da raiz, por mor da doação que lhe fizeram os pais, e sendo tal empréstimo destinado a fazer obras no prédio doado com reserva de usufruto, consentindo o usufrutuário que a família constituída pelo seu filho vivesse com ele, criou neles a legítima expectativa que todos colheriam vantagens da realização de obras que beneficiariam, imediatamente, os usufrutuários, enquanto vivos, e o dono da raiz, no futuro, enquanto titular dos direitos de uso e fruição inerentes ao estatuto jurídico de dono do imóvel (extinto o usufruto). II - Este procedimento é comum e sociologicamente um dado da nossa convivência social que exprime solidariedade familiar, pelo que, razoavelmente, incute confiança e estabilidade que não podem ser traídas por vicissitudes que, aparentando fundamento nas relações familiares, o filho saiu do lar conjugal -são censuráveis se não encontram aí uma justificação séria, recta e plausível, compaginável com o agir com lealdade, mas antes, motivação espúria. III - Desconsiderando o Autor, [ao intentar a acção de revindicação, insinuando que pretende o imóvel para o arrendar], que, quer o seu filho, quer a Ré, fizeram obras no imóvel que será do filho (quando o usufruto se extinguir) caso não seja revogada a doação, e que, na unidade predial distinta, construída pela Ré e marido, vive a Ré, agora sozinha, com os seus filhos (netos do Autor), não dispondo ela de quaisquer réditos, sendo os filhos estudantes; privá-la do local onde reside, sem fundamento sério, solidamente justificado por actuação consonante com o fim social e económico do direito exercido, exprime abuso do direito, na modalidade de venire contra factum proprium, evidenciando clara violação do princípio da confiança. IV - Neste circunstancialismo a pretensão do Autor deve ser paralisada por exprimir conduta que o Direito e boa-fé reprovam.
Revista n.º 3673/08 -6.ª Secção Fonseca Ramos (Relator) * Cardoso de Albuquerque Azevedo Ramos
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