Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Sumários do STJ (Boletim) - Cível
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ACSTJ de 30-10-2008
 Contrato de prestação de serviços Veículo automóvel Contrato de depósito Silêncio Declaração negocial
I -O silêncio é em si mesmo insignificativo, pois quem cala pode comportar-se desse modo pelas mais diversas causas, pelo que, em princípio, deve considerar-se irrelevante um comportamento omissivo (art. 216.º do CC).
II - Só não será assim quando a lei, uma convenção negocial ou o uso lhe atribuam o valor de declaração negocial; ou seja, não basta ter-se estabelecido um dever de responder, sendo ainda necessário que resulte da lei, convenção ou do uso que a ausência de resposta tem um certo sentido.
III - Revelando os factos provados que: a autora realizou em 27-05-2005 um serviço de limpeza do veículo da ré e que nessa data comunicou-lhe verbalmente a efectivação do mesmo, exigindo-lhe o pagamento do respectivo preço e o levantamento do veículo da sua garagem; a ré nunca mais contactou a autora no sentido de proceder ao levantamento da viatura em causa junto da oficina daquela; em 31-05-2005, a autora renovou tal comunicação por carta, comunicando também que a partir da data da assinatura do aviso de recepção, debitaria à ré o valor diário de 26,72 €, a título de parqueamento da viatura; a ré assinou o aviso de recepção, mas não liqui-dou o montante em dívida nem procedeu ao levantamento da viatura; não se vê como concluir qual o sentido a atribuir ao silêncio da ré.
IV - Com efeito, a factualidade apurada não permite dar como assente um uso geral, prevalente no ramo de actividade económica onde está inserida a autora -prestação de serviços de manutenção, reparação automóvel e fornecimento de peças para automóveis e parqueamento de veículos -ou uma prática estabelecida entre as partes que legitime atribuir ao silêncio o sentido de que a ré aceitava a proposta da autora quanto ao parqueamento do veículo e seu custo.
V - Pode dizer-se que depois de ter conhecimento da proposta da autora, de que o depósito do veículo passava a ser remunerado, a ré podia e devia “falar”, isto é, podia e devia aceitar que o veículo ficasse em depósito remunerado ou ir levantar o mesmo.
VI - Porém, se alguém tem o dever de falar, nem por isso se pode concluir que o seu silêncio tem um certo sentido negocial, mas apenas a verificação de um incumprimento do dever de falar, susceptível de fazer incorrer o silenciante na obrigação de reparar os danos causados a outrem pela frustração da confiança deste em receber uma resposta (interesse contratual negativo ou dano de confiança).
Revista n.º 3094/08 -2.ª Secção Oliveira Vasconcelos (Relator) Serra Baptista Santos Bernardino