Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Sumários do STJ (Boletim) - Cível
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ACSTJ de 16-10-2008
 Herdeiro Composse Nulidade do contrato Aquisição originária Usucapião Direito de propriedade Reconhecimento do direito
I -O sistema jurídico admite que, atendendo a interesses de natureza social e económica, que tem por relevantes, certas situações de facto obtenham tutela jurídica c possam dar lugar ao reconhecimento de direitos. É o que sucede, designadamente, com a tutela da posse que se revista de determinadas características.
II - Invocada a usucapião, como forma de aquisição, justamente porque de aquisição originária se trata, irrelevam quaisquer irregularidades precedentes e eventualmente atinentes à alienação ou transferência da coisa para o novo titular, sejam os vícios de natureza formal ou substancial. O que passa a relevar e a obter tutela jurídica é a realidade substancial sobre a qual incide a situação de posse.
III - Concorrendo, aferidas pelas características desta, os requisitos da usucapião, os vícios anteriores não afectam o novo direito, que decorre apenas dessa posse, em cujo início de exercício corta todos os laços com eventuais direitos e vícios, incluindo de transmissão, anteriormente existentes.
IV - O quadro factual provado retrata uma divisão em oito parcelas, não formalizada, de um prédio misto, em 1972, data a partir da qual cada uma das parcelas, então demarcada, passou a ser ocupada, utilizada e amanhada de forma exclusiva apenas por cada um dos, até então, coherdeiros e, então, formalmente, sendo que, nas parcelas que lhes foram adjudicadas, os vários partilhantes efectuaram construções urbanas que, apenas a seu favor, fizeram inscrever na matriz respectiva.
V - O que ocorreu foi, através do escrito que consubstancia a divisão da propriedade, inválida por vício de forma, um negócio jurídico em que os vários intervenientes transmitiram mútua e reciprocamente a sua composse, por forma a que cada um, perdendo a sua composse na quota ideal de 1/8, passou a ter a posse exclusiva sobre a parcela/fracção que, então, se convencionou materializar essa quota -arts. 1267.°, n.º 1, al. c), e 1263.°, al. b), do CC.
VI - O elemento psicológico da posse ou animus, que a lei exige mas, em caso de dúvida se presume (arl. 1252° C. Civil), corresponde à manifestação de vontade de quem exerce o poder de facto sobre a coisa de se comportar como titular do direito correspondente, no caso como proprietário exclusivo da parcela “dividida” pelo título inválido de 1972.
VII - O prédio cuja autonomia a Relação reconheceu e declarou dispõe de suficientes elementos de identificação nas vertentes atinentes à sua localização, confrontações, limites físicos e área, pelo que, invocada como título de aquisição da propriedade a usucapião e provados os respectivos requisitos integradores, o direito não poderá deixar de ser reconhecido ao requerente.
Revista n.º 2724/08 -1.ª Secção Alves Velho (Relator) Moreira Camilo Urbano Dias